HÁ MAIS EUROPA PARA LÁ DA GRÉCIA
Relações com a Rússia, crise no Mediterrâneo, acordo transatlântico EUA-UE ou o terrorismo islâmico não devem ser esquecidos na agenda europeia.
Com a situação na Grécia a dominar todos os debates sobre a Europa. Com o “Não” no referendo a fazer manchetes em todos os jornais. Com o terceiro resgate ou uma eventual saída do euro a marcar cada reunião em Bruxelas ou Estrasburgo, torna-se difícil pensar na União Europeia para lá da crise grega. Mas os desafios políticos, económicos e institucionais abundam nesta união em que os nacionalismos estão cada vez mais exacerbados. E são exatamente esses nacionalismos que se traduzem no principal combate que a Europa terá que travar nos tempos mais próximos. É que este ano de 2015 é marcado por eleições em oito Estados-membros. A maioria delas já ocorreram e os resultados acabaram por não ser os mais positivos para a Europa tal como tem sido construída. Na Grécia, a vitória do Syrisa permitiu antecipar aquilo que tem ocorrido nos últimos tempos: um país que não quer mais austeridade e que está a tentar de tudo para se manter à tona sem se submeter ao poder alemão e às diretrizes que saem do Eurogrupo. No Reino Unido, Cameron ganhou novamente, com maioria, mas com o compromisso de referendar a presença do país na União Europeia. E este pode vir a ser um duro golpe para a construção europeia. A saída de um país foi sempre colocada como um cenário impossível. Se esse país for o Reino Unido, com todo o poder económico e político que representa, o golpe será ainda mais profundo. Para os próximos meses há ainda que contar com as eleições em Portugal e em Espanha, onde o crescimento da esquerda e de partidos radicais como o Podemos colocará novamente a Europa na berlinda. As eleições europeias já tinham mostrado à União que os dias que se avizinhavam em Bruxelas e Estrasburgo com o crescimento dos partidos eurocéticos não eram muito fáceis, mas esse sentimento parece estar a agudizar-se, sobretudo agora com o “Não” tão expressivo da Grécia. Se a isto juntarmos os perigos do terrorismo islâmico, com vários atentados em França e todo o medo instalado que tem provocado, conseguimos também perceber a razão principal para o pavor que outro tema está a gerar: a crise no Mediterrâneo.
Chegada às fronteiras
A chegada às fronteiras, sobretudo de Itália, de milhares de imigrantes do Norte de África, que morrem às portas da Europa ou ficam presos em campos lotados de refugiados, parece ser um problema de difícil solução. É um problema para o qual os vários Estados-membros têm sido resistentes, mas que promete ser um dos grandes desafios dos próximos tempos. Há quem defenda que é preciso uma intervenção no Norte de África para impedir que estas pessoas queiram a todo o custo atingir a Europa. Não foi, por exemplo, fácil impor aos Estados-membros quotas para receber um x número de imigrantes, o que mostra que a Europa não é talvez o projeto de solidariedade que sempre pretendeu ser. Aliás, a resposta inicial das instituições europeias às imagens dramáticas de embarcações apinhadas de gente foi de uma certa intransigência em relação às fronteiras, com objetivos claros de lançar operações militares para destruição dos navios utilizados no negócio do transporte de refugiados.
Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento
A nível económico, a União Europeia tem uma grande oportunidade na Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP), um acordo de comércio livre entre a União e os EUA que promete criar o maior espaço económico integrado do mundo. Dados da Comissão Europeia apontam para que, nos próximos 10 a 15 anos, 90% da procura mundial seja gerada fora das suas fronteiras e é esse potencial que se procura aproveitar com este acordo. Mas há um outro aspeto para focar nestes desafios da União Europeia e que, provavelmente, será o mais importante de todos. Aquele que no fundo vai decidir se a Europa se mantém integrada e coesa, ou se o desmantelamento começa a ser uma ameaça real: Rússia. A crise ucraniana ditou sanções ao país de Putin, mas os russos mantêm firme a ideia de defender as fronteiras. Putin deu recentemente o mote: “Apesar da nossa abertura sem precedentes e da disponibilidade para cooperar nas questões difíceis, e mesmo tendo aceite como amigos os nossos inimigos do passado, não duvidamos que teriam tido o maior prazer em colocar-nos num cenário jugoslavo de desintegração – o que não deixámos, do mesmo modo que também não o permitimos a Hitler”, disse o presidente russo, antes de rematar, que “todos se devem lembrar de como estas coisas terminam”. E há um ponto em que a relação com a Rússia é importantíssima para a Europa: a dependência energética. Com as relações a darem sinais de rutura, outro grande desafio será a união energética. Diversificar o abastecimento e assegurar a sua segurança é prioridade no topo da agenda europeia. Todos os Estados-membros concordam com a necessidade de energia a preços acessíveis em toda a Europa, o que implica uma economia de baixo carbono. A Grécia continuará a dominar a agenda nos próximos tempos. A estabilidade do sistema financeiro e a coesão da zona euro manter-se-á na prioridade das agendas europeias. Mas é bom que os líderes europeus não esqueçam os restantes desafios, sob pena de salvarem a Grécia mas chegarem depois à conclusão de que era a Europa que precisava de ser salva.