REFORMA DA FISCALIDADE VERDE E NEUTRALIDADE FISCAL
O debate em torno da reforma da Fiscalidade Verde tem sido dominado, em parte, pela discussão em torno do conceito de neutralidade fiscal. Mas qual o significado a atribuir a este conceito e em que medida o mesmo condicionou as opções de política fiscal? O princípio da neutralidade fiscal significa que o sistema fiscal deve interferir o menos possível nas decisões dos agentes económicos, satisfazendo, simultaneamente, as necessidades de financiamento e maximizando a eficiência económica do sistema fiscal. Contudo, não poderia ser esse o conceito utilizado pela Comissão, uma vez que o mandato conferido pelo Governo previa que a reforma ambiental fosse um instrumento para estimular a inovação e o desenvolvimento, contribuindo pela via fiscal para penalizar comportamentos ambientais nocivos. Deste modo, a reforma da fiscalidade verde implicaria uma recalibragem do sistema fiscal sem aumentar a carga fiscal na sua globalidade. Em termos práticos, a receita líquida estimada com a reforma – cerca de 150 milhões de euros – deveria ser redistribuída pela economia por via de outros incentivos fiscais. A Comissão propôs uma estratégia de reciclagem fiscal em que 50% da receita adicional seria consignada a créditos fiscais ao investimento, 25% numa redução da TSU e 25% numa redução da sobretaxa de IRS. Esta proposta estava sustentada em diversos modelos económicos e permitiria, em 2030, segundo os estudos da Comissão, uma redução das emissões de CO2 de 9,8% e um aumento do PIB em 0,25%. Trata-se de resultados modestos, mas louve-se o esforço da Comissão em dotar a sua proposta de uma coerência técnica sustentada em modelos económicos. Pessoalmente, tenho defendido que a neutralidade fiscal deveria ser obtida dentro da própria reforma mediante a introdução de incentivos generosos à reconversão tecnológica do nosso tecido empresarial, numa aposta integrada em novas tecnologias e I&D [Investigação & Desenvolvimento]. Deste modo, a penalização dos comportamentos ambientalmente nocivos seria integralmente compensada com medidas fiscais passíveis de incentivar a reconversão tecnológica do nosso tecido empresarial, sem esquecer que qualquer reforma ambiental não pode ignorar os desafios do ordenamento do território e o financiamento das autarquias locais. Infelizmente, não foi esse o caminho seguido pelo Governo, e aquilo a que assistimos, afinal, com alguma perplexidade, é que a reforma ambiental servirá para financiar, em parte, a reforma do IRS, sem que se vislumbre qualquer estudo económico a suportar tal opção legislativa. Não há créditos fiscais para novos investimentos, e mesmo a redução da sobretaxa do IRS fica condicionada ao resultado da execução orçamental de 2015. E a proposta do Orçamento do Estado para 2015 ainda prevê um agravamento da contribuição sobre o setor rodoviário. Foi-se a neutralidade fiscal, ficou a ditadura orçamental, e assim se perde a oportunidade de fazer uma reforma ambiental séria em Portugal.