POLÍTICAS PÚBLICAS E INVESTIMENTO ESTRANGEIRO – Com uma pequena economia periférica, baixa produtividade e elevados stocks de dívida pública e privada, Portugal necessita do investimento direto estrangeiro como alavanca decisiva para o seu desenvolvimento económico.
Sem investimento direto estrangeiro (IDE), as taxas de crescimento económico serão insuficientes para alimentar a despesa pública crescente e as necessidades de recapitalização do sistema previdencial. Este cenário crónico agravou-se, naturalmente, com a atual pandemia a ameaçar a destruição de parte do tecido empresarial. Neste contexto, confesso que me custa entender qualquer medida que possa criar entraves à captação de IDE. É o caso das autorizações de residência para investimento (ARI), mais comummente conhecidas por programa Golden Visa. Como moeda de troca de aprovação do OE/2020, o Governo aprovou uma autorização legislativa que visa limitar a concessão de ARI nas zonas metropolitanas de Lisboa e Porto através de investimentos imobiliários, limitando tais investimentos às zonas do interior. A justificação para esta medida é a pressão imobiliária a que estarão sujeitas as duas maiores metrópoles do país. Trata-se de um enorme erro político. Segundo dados estatísticos divulgados pelo SEF, até outubro de 2020 foram concedidas 9254 ARI, das quais 8702 por via da aquisição de bens imóveis, as quais geraram mais de 5,5bi de IDE, sem contar com o montante de impostos (só em IMT com a taxa a 6,5% serão bem mais de 350M, sem contar com eventuais mais-valias e IVA gerado com empreitadas de reabilitação e renovação).
INSTABILIDADE LEGISLATIVA – Num país classificado em 39.º lugar no ranking internacional de competitividade e para realizar negócios, a pior mensagem que se pode passar é a de instabilidade legislativa. E neste ponto o setor imobiliário bem se pode queixar, pois é uma das grandes vítimas da gula devoradora de um Estado predador de setores rentáveis. Desde as sucessivas alterações nos regimes dos fundos de investimento imobiliário, a criação do AIMI, o alargamento da base de incidência do IMT ou o mais recente ataque ao alojamento local, bem se pode dizer que este é um setor vítima do seu próprio sucesso. Os problemas do acesso à habitação e do acesso à nacionalidade – vide a resolução do Parlamento Europeu para pôr fim a estes programas – não se resolvem com derivas ideológicas, o mesmo se diga do regime do residente não habitual ou a tributação das mais-valias imobiliárias. Atualmente, 19 Estados-membros dispõem de programas Golden Visa, sendo que apenas dois estão sob o escrutínio da Comissão. Os problemas de cidadania europeia resolvem-se através das leis nacionais de nacionalidade, tal como o combate à criminalidade financeira se efetiva através da cooperação e da profusa legislação em matéria de prevenção de branqueamento de capitais (com especiais exigências, note-se no setor imobiliário). No que diz respeito ao acesso à habitação, o mesmo deve ser objeto de políticas públicas de investimento em habitação social e de ordenamento do território. E por via de incentivos fiscais para os mais jovens e para o investimento em reabilitação urbana, uma tarefa levada a cabo quase exclusivamente por privados. A política de rendas baixas é como a política de baixos salários, apenas fomenta mais pobreza, falta de investimento e escassez de oferta.
CAPTAÇÃO DE MAIS IDE – Não será restringindo a concessão de ARI em Lisboa e Porto que estes problemas se resolverão. Sendo legítima a imposição de requisitos mais exigentes – desde logo no valor elegível de investimento e na criação de zonas interditas, mas que não correspondam a toda a área metropolitana –, a revisão do programa de ARI seria uma boa oportunidade para repensar e reforçar os mecanismos de investimento elegíveis como instrumento de captação de mais IDE e não o inverso. O mesmo se diga, por exemplo, em relação às mais-valias imobiliárias. A solução não é o seu englobamento e sujeição às taxas progressivas que podem ir até aos 48%, mas sim a redução drástica das taxas incidentes sobre os rendimentos do trabalho. O problema não está na obtenção de riqueza, mas sim nas políticas públicas para a sua captação, tributação e redistribuição. O empobrecimento coletivo não pode ser uma solução.
Em suma, num período de profunda crise económica como a que estamos a viver, a última coisa que podemos fazer é criar entraves ao IDE por motivações ideológicas. Devemos fomentar a inovação tecnológica, os programas greenfield, mas não nos podemos dar ao luxo de adotar políticas públicas que dificultem a vida aos agentes privados e ao investimento. Não podemos ser um país pobre nas políticas sociais e adotar políticas fiscais e de restrição do IDE de um país nórdico.