RUI CALAFATE

O MUNDO ESTÁ CANSADO DOS POLÍTICOS, MAS QUE FALTA FAZ A POLÍTICA

Em qualquer parte do mundo, todas as sondagens apontam uma crescente desconfiança, um crescente descrédito, dos políticos. Dos políticos que só fizeram disso a sua vida, não têm currículo e que, cada vez mais, parecem todos iguais. A abstenção cresce, os sintomas de corrupção adensam-se e uma das atividades mais nobres para as sociedades, que é a política, degrada-se. É neste caldeirão de cansaço e desconfiança que, no passado, surgiram as lideranças providenciais que levaram ao fascismo e à ditadura. São tempos perigosos, portanto. Na Europa, todas as lideranças são ultra-impopulares. Mariano Rajoy, François Hollande, David Cameron, de Itália nem preciso de falar pois tornou-se um manicómio, têm todos em comum esse facto. E mesmo Angela Merkel que é a verdadeira líder do Velho Continente está impopular na sua terra e nos territórios onde manda, isto é, nos outros países. Por isso, em todo o mundo se fala da falta de grandes líderes. A comparação da gesta atual com os do passado é sinistra. Basta lembrar Ronald Reagan, Bill Clinton, Margaret Thatcher, Helmut Schmidt, Helmut Kohl, François Mitterrand, e facilmente se vê como os sucedâneos nunca superam os produtos originais. Sou de um tempo em que havia grandes líderes políticos, sou de um tempo em que se discutia política, sou de um tempo em que se tomavam opções, sou de um tempo em que havia esquerda e direita, sou de um tempo em que havia valores. Hoje, quase nada disto existe. Não há ideias, a esquerda e direita, a não ser os polos mais radicais, transformou-se em centro e tudo se resume ao primado dos amanuenses que se tornaram ministros das Finanças. São estas pessoas fixadas em números, que na sua vida toda nunca olharam para mais do que uma página de Excel, que ocupam a agenda mediática a falar de números, orçamentos, dívidas, crises. Esses grandes líderes de que falo sabiam que o primado é da política, porque a política serve para as pessoas, para melhorar a vida das pessoas, tomando decisões e não subvertendo e submetendo a sua ação às vontades e trejeitos dos senhores das Finanças. Para lá da falta de ideias, tem de haver o regresso da política. Sem ela estaremos sujeitos a todos os caprichos de indivíduos que não conhecem o país real e não têm a mínima ideia sobre a vida das pessoas. Em Portugal vivemos sob o espetro desta “ditadura” das Finanças. Pedro Passos Coelho, por muito boas intenções que tem, ainda não se conseguiu impor como um líder decisivo, e a sua equipa, com constantes mudanças, aparece como fraca aos olhos dos cidadãos. As suas opções são marcadas pelo eixo troika-Gaspar e tudo o resto eucaliptizou-se. A economia não existe, empresas continuam a fechar e o desemprego não para de crescer. As medidas impostas falharam, as previsões falharam, os objetivos falharam e ninguém compreende muito bem se os sacrifícios que todos estamos a fazer servem de alguma forma para aliviar o nosso futuro. Temo pelas gerações que virão. Não sei se terão esperança. Não sei se irão apenas ser uma geração de sobreviventes  sem capacidade de viver a vida como mereceriam. Portugal é hoje um pântano em que qualquer Cassandra não terá capacidade para enxergar os dias que virão. É uma incerteza constante, quase como a meteorologia que agora também torna o nosso país quase bipolar. Uns dias bonitos, poucos, e outros dias desagradáveis, a maior parte do ano. É assim também o ciclo de notícias: as boas, muito raras, as deprimentes abundam. E o mais grave é que ainda não confiamos nas alternativas. Estamos atolados, vítimas daqueles discursos narcotizantes de Vítor Gaspar. Falta Política, falta combate de ideias, falta ideologia, está tudo encravado num centro sem alma. Não sei como estará Portugal amanhã.