TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO – O papel estratégico das TIC no combate às pandemias. Estamos a conviver com um inimigo invisível que ainda não sabemos como neutralizar. Enquanto a indústria farmacêutica produz as armas necessárias, as tecnologias de informação e comunicação (TIC) podem ajudar a controlá-lo e a diminuir a sua letalidade. A maior ameaça do SARS-COV-2 (novo coronavírus) é precisamente a sua capacidade de rápida propagação. O confinamento surgiu como primeira reação natural à falta de outros meios. Agora que percebemos que é impossível continuar confinado sem danos colaterais ainda maiores, temos de definir uma estratégia eficaz de controlo e convivência segura com o vírus. Na minha opinião, esta estratégia tem de ser integrada e incluir de raiz as TIC. Há dias, numa das conferências de imprensa diárias sobre a pandemia, ouvi a ministra da Saúde, Marta Temido, dizer, a propósito da reabertura dos lares, que estes teriam a responsabilidade de registar todas as visitas recebidas, para as autoridades de saúde poderem atuar caso no futuro viesse a ser detetado algum surto. Ora, se já sabemos que os lares foram um dos principais focos de infeção na primeira vaga, temos de fazer tudo para que não o sejam em eventuais novas vagas da COVID-19. Claro que é preciso registar as visitas aos lares, mas esses registos não podem ficar em folhas de papel espalhadas pelos mais de 2500 lares do país. O papel será praticamente inútil para qualquer tipo de ação preventiva e atrasará o trabalho das autoridades de saúde se precisarem de consultar a informação para identificar cadeias de transmissão do vírus. Estes registos de visitantes, assim com os registos dos profissionais de saúde que trabalham em lares, deveriam ser eletrónicos sempre que possível e estar integrados com outros sistemas em rede, para classificar o nível de risco das visitas aos lares e emitir alertas automáticos quando os lares ultrapassam um determinado limiar de risco considerado aceitável.
Soluções TIC – Este exemplo dos lares é apenas a ponta do icebergue. Nos últimos tempos têm sido propostas várias soluções TIC para ajudar no combate à pandemia de COVID-19, com destaque para as aplicações de rastreamento de contactos que permitem registar com quem contactámos e emitir alertas caso algum dos nossos contactos seja infetado. Estas aplicações só serão eficazes se a sua implementação e utilização estiver suportada num plano estratégico. Por exemplo, se existirem cinco aplicações no mercado e as pessoas dividirem-se na sua utilização, apenas conseguiremos os resultados pretendidos se as autoridades nacionais criarem um repositório nacional, anonimizado, que faça a ponte e centralize as informações recolhidas pelas várias aplicações. Também na área da sáude temos hoje em dia uma quantidade muito significativa de informação registada que pode ajudar à tomada mais rápida de decisões e à antecipação dos movimentos do vírus. Um exemplo. Entre 2016 e 2019 participei num projeto de Investigação & Desenvolvimento realizado em parceria por academias, indústria e entidades prestadoras de cuidados de saúde. Com um budget inferior a um milhão de euros, foi possível criar o protótipo de um sistema que, entre outras funcionalidades preditivas, teria sido capaz, em 2014, de detetar o surto de legionella de Vila Franca de Xira, quatro dias antes da data em que foi declarado oficialmente pela Direção-Geral da Saúde. A produtização deste protótipo permitirá ajudar na deteção de surtos vindouros, incluindo eventuais novas vagas da COVID-19.
Tecnologia para minimizar efeitos – Em suma, está ao nosso alcance a tecnologia para minimizar os efeitos das pandemias – destas e doutras que surjam no futuro. As autoridades nacionais, ou até a mesmo a OMS, deveriam definir uma estratégia integrada de combate a pandemias que incluísse mecanismos eletrónicos para registo de todos os dados relevantes, emissão de alertas preventivos, ajuda em tempo real na deteção e controlo de surtos, entre muitas outras capacidades. Desta forma, poderíamos aguardar mais pacientemente pela indústria farmacêutica e criar um infraestrutura que aumentasse a confiança de todos na resposta da sociedade a futuras pandemias. O mercado está a trabalhar na disponibilização das tecnologias necessárias, mas compete às autoridades nacionais e internacionais definirem a estratégia e coordenarem a sua implementação. A eficácia de uma estratégia integrada será muito maior do que a estratégia atual que relega o potencial das TIC para segundo plano, fazendo uso esporádico de algumas ferramentas apenas a nível tático.