MÃE DE DOIS FILHOS, ENÓLOGA, BOA COZINHEIRA E FÃ DE PRAIA, Martta Reis Simões é a mulher que está à frente da equipa de Enologia da Quinta da Alorna. Desde de muito cedo decidiu o seu futuro, fruto do contacto, ainda em criança, com a vinha e o vinho, tendo sido uma decisão fácil, quase inata, delinear sobre como queria passar os seus dias enquanto profissional.
A enóloga descreve-nos a sua jornada e entrada no mundo dos vinhos como algo natural, o seu contacto com a vinha e a terra, desde muito nova (os seus avós eram agricultores), contribuiu para se deixar fascinar por este mundo. Conta que na sua adolescência o seu pai se interessava especialmente por vinho: abriu uma garrafeira ao público, frequentou formações e foi um dos membros fundadores da Confraria dos Enófilos da Estremadura. Sem dúvida que o seu pai foi o seu grande influenciador sem o querer ser. A sua abordagem ao vinho, a sua necessidade de conhecimento e também a transmissão desse mesmo conhecimento, com certeza que a conduziram até à enologia. Martta Reis Simões assistia diariamente a toda esta dinâmica à volta do vinho, permitindo que essa envolvência despertasse o seu interesse e acabando por entrar, com 18 anos, no curso de Enologia, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Estagiou na Quinta do Noval, no ano seguinte na Quinta da Romeira, onde começou a trabalhar ainda a acabar a licenciatura, e três anos depois entra na Quinta da Alorna, assumindo a direção da equipa de Enologia dessa quinta em 2010, onde se mantém até à data.
Relembrando que se houvesse alguma dúvida quanto à sua escolha por enologia, essa teria sido esclarecida logo no primeiro contacto que teve com a realidade, na Quinta do Noval. Enquanto estagiária e debaixo da alçada de Ausenda Matos, conta que aprendeu muito mais do que apenas enologia, outros valores, condições, venturas e adversidades inerentes à profissão. Ainda hoje tenta transmitir, a quem vem estagiar e experimentar pela primeira vez este mundo da enologia, esses mesmos ensinamentos que lhe passaram quando começou.
Questionada sobre o facto de ser mulher numa profissão ainda muito ligada ao homem, se sentiu alguma dificuldade em encontrar o seu lugar, Martta Reis Simões revela que a figura masculina sempre esteve muito presente na sua vida até entrar nesse mundo, pelo que não estranhou nada, nunca sentiu que a subestimassem pelo seu género. O facto de ser um mundo dominado por homens nunca a fez refletir na tomada de alguma decisão, sempre a respeitaram pelo que é enquanto pessoa e profissional.
QUINTA DA ALORNA
Situada na margem sul do rio Tejo, perto de Santarém, a Quinta da Alorna é a casa profissional da enóloga Martta Reis Simões. A sua jornada começou após estreita colaboração com o enólogo Nuno Cancela de Abreu, que, então no cargo de diretor-geral da Quinta da Alorna, a convida para trabalhar diretamente com ele na área da enologia, dando assim continuidade a um legado de poder feminino que caracteriza a quinta. D. Leonor de Almeida Lorena e Lencastre, a IV Marquesa de Alorna, é a figura feminina mais conhecida da Quinta da Alorna, mulher apaixonada, determinada, rebelde, inteligente e muito à frente no seu tempo. Anos mais tarde, no século XIX, a administração da quinta fica a cargo de D. Emília Monteiro de Sampaio, uma referência nacional e internacional nas ciências agronómicas. Mais recentemente, ganhou destaque D. Fernanda, a avó da quarta geração da família Lopo de Carvalho, uma mulher de garra.
No livro, recentemente lançado, Da Índia ao Tejo, do Tejo para o Mundo, uma edição comemorativa dos 300 anos da Quinta da Alorna, à venda com o Vinho Grande Reserva 1723, também uma edição limitada, Martta Reis Simões já faz parte integrante de um período da história da quinta. Tem disso consciência, mas sem sentir esse peso, andando lado a lado com a história, fazendo o seu caminho de forma natural.
MUNDO DO VINHO
Pedimos à enóloga que, refletindo sobre o mundo do vinho, nos respondesse a duas questões: primeiramente, o que lhe falta para atingir a excelência na busca da perfeição nos vinhos; em segundo, olhando para o futuro da indústria do vinho, que temas antevê a necessitar de intervenção. Ao que a enóloga nos esclarece que a busca por uma suposta perfeição nos vinhos é para ela algo utópico, do ponto de vista em que procura sempre algo mais, nada está nem será perfeito, e quando chega lá perto, ainda considera que é possível fazer sempre mais e melhor. É uma área muito dinâmica e reconhece que, a trabalhar há muitos anos no setor, tem sido feito um trabalho enorme a todos os níveis, mas ainda há muito para fazer. Remata que é por isto que esta área é tão cativante e apaixonante, com tudo o que tem de gratificante, mas muitas vezes frustrante. Respondendo à segunda questão, diz-nos que sobretudo o Marketing, Comunicação e Vendas será um dos grandes temas a abordar, numa altura em que assistimos a um decréscimo, à escala global, do consumo de vinho. Será necessário comunicar de uma forma inteligente e criativa para cada segmento, encontrar uma forma de abordagem diferente e direcionada – por exemplo, a geração Z não consome vinho mas consome outras bebidas alcoólicas. Um packaging alternativo, vinhos com teor alcoólico mais baixo, vinhos mais frescos e menos “pesados”… serão certamente questões a ter em conta para chegar a esse target, mas sempre sem esquecer uma mensagem de consumo moderado e responsável. Outro grande tema que considera imperativo é a sustentabilidade e capacidade de adaptação às alterações climáticas.
Para terminar, pedimos à enóloga Martta Reis Simões que palavras gostaria de deixar para serem recordadas, ao que respondeu: “Encanto, compaixão, dedicação e resiliência.”