MARIA DE BELÉM ROSEIRA

A ATIVIDADE FÍSICA E O SEU POTENCIAL – Os relatórios mais recentes das agências internacionais que se pronunciam sobre a Saúde são insistentes na importância da prevenção como fator crítico na sustentabilidade dos sistemas de saúde em vigor no espaço da Europa Social.  

A carga de doença evitável que afeta as populações corre o risco de atingir proporções que possam pôr em causa o acesso universal nos moldes vigentes até agora, apesar das muitas insuficiências diagnosticadas.Não teremos capacidade para gastar no que poderíamos e deveríamos ter prevenido e, simultaneamente, conseguir incorporar os custos da inovação efetiva que o aprofundamento do conhecimento coloca à disposição da comunidade. Devemos, pois, mudar de vida e de atitude e aproveitar todas as oportunidades para o fazer e depressa. Esta é uma responsabilidade, em primeiro lugar da governação pública, que deve definir políticas competentes, mas terá que constituir um esforço coletivo do qual ninguém deve ficar de fora. 

Múltiplos são os alertas no sentido da inversão de caminhos, tendo em vista considerar a prevenção como a abordagem “rainha” das políticas de saúde. Os levantamentos feitos a nível comparado internacional demonstram bem as diferenças de esforços colocados nesse sentido e, no caso específico português, a posição relativa é muito fraca. 

Nem sempre foi assim, porém. Em 2017, Portugal foi mesmo o país escolhido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o lançamento do Programa de Ação Global da Atividade Física 2018-2030, intitulado “Pessoas mais Ativas para um Mundo mais Saudável “, tal o empenho que a então equipa na governação da Saúde colocava nas medidas pioneiras de Saúde Pública que eram vistas com entusiasmo na OMS.  

A justificação para a elaboração deste plano assenta na fundamentação científica dos benefícios para a saúde do abandono do sedentarismo tão promovido pelas sociedades contemporâneas. A sua justificação assenta na eficácia comprovada do exercício físico na prevenção e tratamento das doenças nãotransmissíveis, tais como as cárdio-cerebrovasculares, a diabetes ou os cancros da mama e do cólon. Já depois da sua publicação, contudo, são noticiadas com cada vez maior frequência novas áreas de potenciais ganhos em saúde mercê do exercício físico. Até na prevenção das doenças neurodegenerativas– a ameaça mais pesada nas sociedades em envelhecimento demográfico acelerado nas quais Portugal se inclui – está demonstrada a eficácia dessa abordagem. 

Inatividade física 

De acordo com os dados contidos no documento em análise, os custos da inatividade representam entre 1-3% dos custos de saúde de cada país, excluindo os atribuíveis à saúde mental e às condições músculo-esqueléticas. Para além disso, sociedades mais ativas podem gerar retornos adicionais no alcance dos objetivos do desenvolvimento sustentável, designadamente os ligados ao ambiente, a maior ameaça que pende sobre a humanidade. 

O objetivo do plano é o de atingir 15% de redução relativa na prevalência global da inatividade física em adolescentes e adultos até 2030. Para o conseguir, definem-se quatro ações de política: criar sociedades ativas, criar ambientes ativos, criar pessoas ativas e criar sistemas ativos. 

Daqui se depreende que há toda uma cultura prevalente a transformar e que todos somos poucos para empreender tarefa de tal monta. A isso se faz apelo no mesmo plano, sublinhando a importância de uma atuação concertada a nível de políticas públicas, nacionais e locais, bem como ao papel de todas as entidades dos setores da economia social e privada. Um verdadeiro desígnio nacional que penetre nas nossas vias de forma transversal. Daí a importância central que o plano atribui às parcerias multi-setoriaispara aumentar os níveis de atividade física e reduzir o comportamento sedentário da população. 

Neste contexto, adquire importância acrescida a iniciativa que o presidente da Associação dos Atletas Olímpicos, Luís Alves Monteiro, tem vindo a promover no sentido de que “a sociedade encare o fenómeno desportivo não como um fim em si mesmo, mas como um meio para uma ambição maior que represente uma sociedade mais moderna e solidária e em constante mudança”. Na verdade, afirma, “ganhar é importante, mas é preciso ganhar com ética, com integridade”. 

Logo aqui estão dois aspetos essenciais na formação dos elementos de uma sociedade: a ambição de se ser ganhador, respeitando a ética do comportamento, e transpor estes princípios para a vida individual e coletiva. Ganhar sim, mas trilhando o caminho do esforço imposto por cada um de nós e renegando a batota, nas múltiplas expressões que esta possa ter. 

Pedagogia essencial 

O desporto, assim, e os princípios que o regem ao mais elevado nível de exigência, como o são os jogos olímpicos, constituem uma pedagogia essencial em qualquer sociedade que se pretende competitiva e ganhadora de forma civilizada e que suscita em cada cidadão o valor da autoestima, ao mesmo tempo que faz apelo aos benefícios múltiplos da atividade física, da proteção do ambiente, ao maior aproveitamento escolar, à maior produtividade no trabalho ou a uma melhor saúde física e mental.  

Daqui decorre o título que deu a este programa, “O Desporto Desperta uma Nação”, e que foi inspirado por iniciativas semelhantes que apreendeu em países estrangeiros nos quais viveu e trabalhou. Aí se confrontou com a conclusão de que o sucesso de cada país só é alcançável com os sucessos somados de cada uma das pessoas que o constituem, a que acresce a sensibilidade para cada uma delas perceber que ninguém pode ficar para trás porque isso representa uma perda coletiva. Num contexto destes e com uma cultura desta natureza, a solidariedade ganha outra dinâmica, outra razão de ser e, consequentemente, outra sustentabilidade social.  

Na realidade, o desporto pode desempenhar um papel potenciador no desenvolvimento de comunidades prósperas e íntegras. E é a ambição de despertar o país que move o programa em vias de lançamento público e que assenta em quatro eixos estruturantes: ganhar mais, ganhar com ética e integridade; desenvolver um sistema desportivo próspero e sustentável; inspirar uma mudança positiva na sociedade; fazer participar a sociedade civil para contribuir para os objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030. 

Desenvolvimento humano só consegue rimar com esforço, rigor, disciplina, espírito de sacrifício, vontade de superação, prioridades bem definidas e ambição saudável. É isto que norteia a alta competição. E, se queremos ser um país ganhador num mundo em alta competição, temos que trilhar novos caminhos de entre os quais estes serão parte importante. 

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