LUÍS MIRA AMARAL

A DESCARBONIZAÇÃO E A CRISE ENERGÉTICAEstamos na primeira crise energética mundial em contexto de descarbonização. Deixou-se de investir nas energias fósseis, pensando alguns que as renováveis, como a eólica e a solar, substituíam facilmente e sem stress essas energias. Percebe-se agora que essas renováveis são intermitentes – coisa sempre escamoteada em Portugal – e que o mundo ainda precisa das energias fósseis, quer para satisfação dos consumos quer para backup operacional às renováveis nas situações em que não haja vento ou sol. Regressa o mal-amado carvão, pois o gás natural (GN) não chega ou sai mais caro que o carvão, e percebe-se que não se pode dispensar o nuclear. A Alemanha, ao querer suprimi-lo, ficou mais dependente do carvão e do GN, com mais dependência geoestratégica de Putin e mais emissões de CO2. Nos EUA, Biden corta os investimentos em oleodutos, ameaça de procedimento criminal os executivos das petrolíferas, mas pede à OPEP que aumente a produção! Por outro lado, o ritmo da transição energética ocidental dos combustíveis fósseis para um modelo intensivo em recursos minerais e metais raros com renováveis, veículo elétrico e baterias, vai ser travado por escassez na oferta desses materiais. 

A Europa não explorou o gás de xisto, tem já pouca produção de GN, um inverno agreste diminuíra as suas reservas e a retoma económica muito forte pós-Covid veio aumentar drasticamente a procura por GN num contexto em que a escassez de vento em muitas geografias não permitiu à energia eólica responder ao aumento da procura da eletricidade e em que houve restrições do lado da oferta quer da Rússia quer da Noruega, através dos pipelines que abastecem a Europa. E a Europa no gás natural liquefeito também sofreu a concorrência da procura asiática, designadamente da China, num contexto em que o gás de xisto americano não chega para a procura da Europa e da Ásia, tendo até os EUA também começado a restringir a sua oferta para prudente constituição de stocks para o consumo interno. 

O preço nos mercados grossistas da eletricidade depende do mix de produção, com maior ou menor importância do GN para compensar a intermitência das renováveis. Os países nórdicos com nuclear, hidroeletricidade e biomassa florestal, tão esquecida em Portugal, têm tido os preços mais baixos e estáveis. Portugal e Espanha registaram os mais elevados devido ao recurso ao GN e a fraca capacidade de interligação entre Espanha e França leva a desvios de preços entre a Ibéria e a França. Portugal teve até setembro o segundo mais elevado preço da eletricidade nos mercados grossistas europeus. Por outro lado, nos consumidores em Alta e Muito Alta Tensão, como as indústrias muito consumidoras de energia elétrica, os elevados aumentos do preço no mercado grossista não conseguirão ser integralmente compensados com as reduções previstas pela Entidade Reguladora para o Setor Energético nas Tarifas de Acesso às Redes, coisa mais plausível de acontecer na Média e Baixa Tensão. 

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