LUÍS MIRA AMARAL

O DÉFICE ESTRUTURAL

Tiro o chapéu a Mário Centeno. Tem sido um autêntico mago, fazendo orçamentos para serem aprovados pela esquerda, mas depois, na execução, com as cativações, agrada aos mercados e a Bruxelas! O défice nominal tem descido graças às baixas taxas de juro, à fabulosa conjuntura (na qual está incluída o boom turístico), ao aumento dos impostos indiretos e a essas cativações. Essas medidas discricionárias permitiram grandes aumentos da despesa corrente com pessoal à custa do corte do investimento público e das verbas de funcionamento (sacrificando a qualidade dos serviços públicos, como é evidente na saúde e nos comboios) e teremos agora mais 1320 milhões euros de receita fiscal volátil financiando um acréscimo de 1100 milhões de euros em despesas rígidas. Para 2019 os dividendos da CGD e do Banco de Portugal (o qual executa a política do “Quantitative Easing” do BCE, obtendo mais-valias nos títulos da dívida pública que adquiriu) também contribuem para chegarmos a um défice nominal nulo. Mas já devíamos ter um superavit nesta fase alta e assim contribuir para uma redução da dívida pública. O ajustamento orçamental é assim devido a fatores conjunturais, sem consolidação estrutural. Tal é evidente na evolução do défice estrutural. Como o nome indica, um saldo estrutural revela a verdadeira estrutura das finanças públicas, ajustadas do ciclo económico e expurgadas das receitas e despesas extraordinárias (one shot). É fácil de perceber que na fase alta do ciclo económico a receita fiscal aumenta e diminuem as prestações sociais, enquanto na fase baixa acontece o inverso, pelo que o saldo orçamental será naturalmente maior na fase alta e menor na fase baixa, daí o ajuste do saldo para neutralizar essas variações. Sem a redução dos juros da dívida pública (santo BCE) e sem esses dividendos, entre 2016 e 2019 o défice estrutural cairia apenas 0.5 pontos percentuais do PIB. Além disso, como para o ajuste ao ciclo económico é preciso estimar o PIB potencial, este parece-me empolado, levando a um aumento da receita estrutural, em detrimento da conjuntural, com o consequente efeito positivo na redução do défice estrutural apresentado. Esgotados os fatores conjunturais do nosso crescimento, o OE 2019 deveria apoiar o lado da oferta e a competitividade das empresas, o que não acontece. Na linha da despreocupação sobre a competitividade, registo também as mudanças governamentais na energia, Seguro Sanches aguentou mais do que se esperava, dado que, como sabemos, quem se mete com os rendeiros da eletricidade é odiado e entalado… O champanhe voltou a jorrar. Também não é necessária competência técnica nesta área, pois, como explicou ao Público o ministro em transição do CO2, a política energética é um subproduto da política ambiental e, como temos visto, a eletricidade é apenas um produto financeiro para os promotores e investidores à procura de rendas excessivas. Matos Fernandes também esqueceu o setor dos transportes na descarbonização, onde era imperioso apostar na ferrovia no médio-longo curso, apenas falando nas renováveis para o setor elétrico, setor este que já foi objeto de uma grande descarbonização com a forte componente de renováveis (em que se inclui a hidroeletricidade) aí instalada.