2,1% DO PIB O MELHOR DÉFICE
Felicito o ministro das Finanças pelo “milagre” de um défice público entre 2,1 e 2,5% do PIB em 2016 num contexto de crescimento anémico (apenas 1,4%, bem abaixo do previsto 2,4% pelo PS no Excel eleitoral…) e das pressões sobre a despesa pública! Tal deve-se às receitas extraordinárias do perdão fiscal, ao aumento das receitas dos impostos indiretos, às cativações de verbas nos serviços públicos, ao adiamento de despesas para o ano seguinte, à travagem do investimento público e à redução do desemprego (com aumento de receitas e diminuição de subsídios de desemprego) na sequência do “boom” turístico. Quanto a ser o melhor défice da nossa democracia, embora seja útil para “vender” em Bruxelas, tal não é verdade por duas razões: (1) em 1989 Miguel Cadilhe conseguiu um défice de 2,1% após uma gestão de quatro anos com melhoria consecutiva dos indicadores das finanças públicas; (2) não podemos comparar os anos antes do euro com o pós-euro, pois antes pagávamos em juros da dívida pública valores entre 6 e 8% do PIB e no euro gastamos nesta rubrica só 3 a 4,5%, o que leva a que seja o saldo primário (expurgado desses juros) o melhor indicador para medir a “qualidade” do saldo orçamental (o défice é um saldo negativo). Em 2016 pagámos 4,3% do PIB em juros da dívida pública, sendo ela 130% do PIB, enquanto que em 1989 se tinha pago 6,2%, sendo ela só 53% do PIB. Então o saldo primário de 2016 é de 2,2% do PIB, inferior aos 4,1% de 1989. Mas com a travagem do investimento público devemos também comparar os saldos primários correntes (expurgados desta rubrica). Em 2016 a despesa pública em FBCF foi apenas de 1,9% do PIB contra 3,5% em 1989, pelo que os saldos primários correntes foram em 2016 e em 1989, respetivamente, de 4,1% e 7,6% do PIB. Embora nem todo o investimento público seja “boa” despesa pública, esta travagem, a manter-se em nome do controlo do défice, compromete o PIB potencial e logo o crescimento económico futuro. Esta deterioração das finanças públicas acontece porque, apesar da poupança nos juros com a entrada no euro (que chegou a ser de 5 p.p. do PIB), se aumentou dramaticamente a despesa corrente primária (sem juros e sem investimento público), a qual passou de 25% do PIB em 1989 para 40% atualmente, ou seja + 15 p.p. do PIB! Numa lógica de libertação de recursos para financiar a economia, não se pode falar só da reestruturação da dívida, para reduzir os 4,3% do PIB gastos em juros, esquecendo os 40% do PIB gastos em despesa corrente primária. Temos que tratar também da reestruturação do Estado e do corte estrutural da despesa pública! De notar que agora com uma dívida pública de 130% do PIB pagamos apenas 4,3% do PIB em juros da dívida pública, enquanto em 1989 só tínhamos um stock de dívida de 53% do PIB e pagávamos 6,2% do PIB em juros! Santo euro e abençoado BCE! Felicito vivamente a revista FRONTLINE pelo seu aniversário, espaço de excelência que me habituei a ler e onde escrevo com muito gosto.