LUÍS LOPES PEREIRA

001 (26)SOLIDARIEDADE INTERNACIONAL NA SAÚDE

Recentemente este tema veio à discussão pública, tanto interna como externamente, com o caso do medicamento para a cura da Hepatite C. Começo com o que aconteceu em Portugal. Limitado nos seus recursos, o Governo optou por esperar que a Europa conseguisse um bom acordo com o fabricante para preparar o acesso à cura. Insisto neste termo, pois trata-se de acabar com uma doença mortal e não de melhorar a qualidade de vida de doentes crónicos, transformando uma doença mortal em crónica. Infelizmente, como é frequente na Europa, os países foram negociando individualmente com a empresa e fechando acordos, ou seja, andámos a velocidades diferentes. Portugal terá ficado para último, provavelmente porque não é um país estratégico para a empresa em causa e porque também o Governo terá escolhido uma abordagem mais reativa que proativa, justificando-se com a falta de recursos decorrentes da crise económica. A atualidade deste tema tão mediatizado e politizado em Portugal deve-nos contudo conduzir a uma reflexão essencial: qual o valor da inovação em saúde? Constantemente as empresas que atuam neste setor enfrentam o dilema de, por um lado, terem que ser muito eficientes – desenvolvendo produtos muito eficazes, salvadores de vidas, justificando sempre os seus resultados clínicos, treinando os profissionais de saúde nas suas novas tecnologias e noutras paralelas – e, por outro, saberem que no momento da escolha das tecnologias, o financiador da Saúde assume como critério único ou mais relevante o fator preço, sem haver de facto uma avaliação a montante e a jusante do valor real daquela inovação. Acresce ainda que, com as descidas constantes de preço que esta indústria (que desenvolve e cria estas terapias que garantem a qualidade de vida das pessoas com doenças crónicas) tem sofrido ultimamente, é forçada a sobrevalorizar os seus produtos novos para compensar perdas passadas e não planeadas, donde retira lucros que são novamente reinvestidos na investigação e desenvolvimento de inovação. Um outro aspeto importante a ter em conta é a forma como valorizamos os produtos. Uma empresa de saúde, tal como outra, poderá ter margem para baixar preços desde que o mercado ou a economia de escala funcionem. O mercado é que deve determinar o preço, seja na saúde ou em qualquer outro setor. Não vislumbro outra forma de o fazer, se desejamos de facto que haja inovação e desenvolvimento e que seja a economia a encontrar produtos que suportem um bom sistema de saúde. As empresas tentarão maximizar os seus lucros, mas só venderão os seus produtos inovadores se o mercado os conseguir comprar. Podemos alterar as regras para o caso dos produtos de saúde, mas os incentivos à inovação e à qualidade de produção terão que ser mais robustos que a força de uma economia de mercado. Voltando ao tema que nos levou a esta reflexão, chegou-se a um acordo para a Hepatite C em Portugal, mas a impressão que ficou para nós, simples cidadãos, é que neste caso a diplomacia foi substituída por cenas lamentáveis, além de declarações que me pareceram demagógicas em toda a sua extensão. É importante que no futuro não nos esqueçamos que a diplomacia é a forma mais nobre de negociar acordos que, quando bem-sucedidos, resultam sempre em desenvolvimento e paz e que, no caso da saúde, reflete-se num maior acesso ao tratamento, cura e inovação.