JOSÉ CARIA

NOVA ÁFRICA – Portugal e a aposta na “nova lusofonia africana” – Angola poderá marcar definitivamente a necessária mudança na política externa portuguesa e a construção de uma nova lusofonia africana ao fim de 40 anos de incertezas e recuos. E neste contexto abre-se igualmente um novo ciclo de oportunidades para os empresários portugueses, particularmente numa altura em que se acumulam os sinais de abrandamento económico na Europa.                                                Estabilizando a sua relação política com Angola, Portugal abre e passa a protagonizar todo um novo ciclo de influência na África Lusófona. Este é o eixo estratégico que tem estado, ao mais alto nível, na base da condução da política externa portuguesa, envolvendo a Presidência da República e o Governo como pivots centrais no que respeita ao continente africano, e poderá marcar definitivamente a construção de uma nova lusofonia africana ao fim de 40 anos de incertezas e recuos. O sucesso desta convergência terá, a médio prazo, reflexos em três áreas fundamentais, nomeadamente: – A abertura de todo um novo ciclo de oportunidades para a economia e empresários portugueses, não só em Angola, mas em toda a África Lusófona, relevante numa altura em que o abrandamento da economia na Europa é já uma certeza adquirida; – O reconhecimento de Portugal como parceiro fundamental na “porta de entrada” para a África Lusófona, nomeadamente por países como a República Popular da China – intenção que, ainda na recente visita do seu Presidente ao nosso país, ficou bem expressa – com todo o reflexo político e económico dai resultante; – A capacidade de Portugal passar a ser um ator determinante em projetos estruturais noutros países africanos – nomeadamente na Guiné, com a afirmação recente de altos responsáveis que apontam para a necessidade de se iniciar o processo de industrialização do país num quadro político mais estável, como parece ter saído do recente ato eleitoral –, contando com a esfera política de influência regional do Estado angolano. Aliás, esta dinâmica de afirmação de Angola como potência africana tem sido, cada vez mais, notória na ação política, quer interna quer externa, do Presidente João Lourenço. 

Uma intensa ação diplomática – Não foi por mero acaso que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou que se está a iniciar “um novo ciclo histórico” no relacionamento entre Portugal e Angola, na sua recente visita àquele país africano. E ao seu estilo, na hora da despedida foi muito claro nas suas palavras: “aquilo que eu tenho é de agradecer ao povo angolano, ao Governo angolano, muito em especial ao Presidente João Lourenço, aquilo que foi o acolhimento caloroso e como nós gostamos que seja o acolhimento dos nossos irmãos angolanos em Portugal”. 

O que Marcelo fez foi não mais do que dar continuidade ao que o Presidente angolano já tinha feito, em novembro do ano passado, em Lisboa, aquando da sua visita oficial ao nosso país. E recorde-se, de não menos importância, que foi a primeira visita de um Presidente de Angola nos últimos 10 anos. No mesmo sentido foi o Governo português, conforme se pôde ler no comunicado emitido na sequência da visita de Marcelo a Angola: “A visita de Estado de Sua Excelência o Presidente da República Portuguesa insere-se num ciclo excecional de visitas ao mais alto nível entre os dois países e no quadro da parceria estratégica e privilegiada entre Angola e Portugal, marcada pelo respeito recíproco e construída numa lógica de interesses comuns e benefícios mútuos.” E importa referir que estas duas visitas foram, talvez, a parte mais visível, da intensa “ofensiva” de Portugal, principalmente neste último ano e meio. Não só neste entretanto o Presidente português esteve em S. Tomé e Príncipe e Cabo Verde – onde terá lugar parte das comemorações do Dia de Portugal –, como a área da Cooperação assumiu grande relevo e levou a secretária de Estado Teresa Ribeiro a um intenso périplo pela África Lusófona, nomeadamente Angola, Moçambique, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe, com uma agenda muito focada nas questões económicas e do desenvolvimento.  A este quadro acresce ainda o papel de duas organizações cuja ação é muitas vezes secundarizada, mas cujo contributo tem sido fulcral para o cimentar do tecido económico, social e cultural do espaço da lusofonia, nomeadamente a UCCLA – União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa e a CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). 

Novo ciclo de oportunidade empresarial – Com o foco português em Angola e o empenho político do atual Presidente angolano em resolver um dos dossiers mais complexos entre os dois países – o da dívida do Estado angolano às empresas portuguesas –, para além dos claros sinais de estabilidade e abertura económica do país num quadro não protecionista, parece evidente que se abre todo um novo ciclo de oportunidades para o investimento e para os empresários portugueses, mais ainda numa altura em que são claros os sinais de estagnação no velho continente europeu. Passe a advertência feita pelo presidente do AICEP, Luis Castro Henriques, quando afirmou que a estratégia que se pretende fomentar para o mercado angolano deve assentar na diversificação geográfica e setorial, para que o investimento não se fique por Luanda ou pelo setor da construção, a leitura deve ser feita no sentido de não cometer os erros passados e que a nova política deve passar por uma ação concertada entre empresários dos dois países e não em lógicas unidirecionais.  

Portugal parece finalmente ter conseguido afinar o diapasão sobre o caminho político que pretende seguir daqui para o futuro na sua relação com a África Lusófona, encerrando um capítulo de política externa e de cooperação com mais de 40 anos marcados por recuos e incertezas e mesmo com alguns momentos “negros” em todo este trajeto, como foi, por exemplo, a passagem, na década de 1990, de Durão Barroso pela pasta dos Negócios Estrangeiros, entre tantos outros.