JOSÉ CARIA

20 anos depois da expo 98. A afirmação de um Portugal maior.

Portugal é um país inviável e aí, pelo menos, já temos nós, os portugueses, uma característica intrínseca de sucesso que nos distingue de todos os outros: somos o único povo capaz de tornar viável um país inviável e já o fazemos há 900 anos.

All Abord! O mote foi para o Festival da Eurovisão, mas poderia ser para um “embarquem neste país icónico” numa expe- riência sem precedentes. A verdade é que, 20 anos depois de uma também icónica montra portuguesa para o mundo – como foi, na Expo 98, a consagração dos Oceanos –, só no festival da canção 200 milhões de olhos reviram-se no pequeno retângulo à beira-mar plantado.

E os portugueses souberam estar à altura do desafio o, não fosse este á considerado o melhor espetáculo da longa carreira da Eurovisão, com o fado a dar o mote e a diáspora a enaltecer a cultura e a língua portuguesa, fechando-se esse momento alto com Salvador e Caetano Veloso em palco.Portugal e os portugueses vivem hoje e um ciclo de expansão como há muito não havia memória. Há pouco mais de dois anos, as caravelas zarparam novamente e bolinam hoje em todas as direções numa renovada afirmação deste Portugal Maior. Em 2016 fomos campeões europeus de futebol –vergando uma soberba França para gáudio dos nossos emigrantes e lusodescendentes que vivem no país e continuámos a senda de sucesso em muitas outras modalidades.Fátima, ícone do culto Mariano, renovou a Fé dos milhões de católicos de todo o mundo quando, no ano passado, o Papa canonizou os pastorinhos por ocasião do centenário das Aparições.E Portugal de novo no centro do mundo.

RESPOSTA NACIONAL

Politicamente, foi também este pequeno país europeu, embora pejorativamente rotulado de periférico, que, saído de uma profunda crise que atingiu igualmente toda essa sua Europa, bateu o pé às políticas institucionalizadas de Bruxelas e impôs o seu modelo de recuperação económica ( já assumido como um case study) numa cátedra de poderes políticos,até então, muito conservadora e avessa à mudança.A tal ponto que hoje  o presi- dente do Eurogrupo é, tão-só, o ministro das finanças português. Mas o impacto não ficou aquém-fronteiras e, noutras terras, os próprios responsáveis do Fundo Monetário Internacional tiveram de se render às evidências portuguesas. Essas mesmas terras onde também um por- tuguês, de seu nome António Guterres, passou a gerir os destinos da mais alta instância política internacional: a ONU. Nações Unidas onde também, em breve, predominará oficialmente a língua de Camões que já por terras do Tio Sam é bem significativa. Tanto mais que este ano, na senda do que já vem fazendo, o Presidente escolheu precisamente a Costa Leste dos Estados Unidos para assinalaras comemorações oficiais do 10 de Junho– Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.

AFIRMAÇÃO DA CULTURA

E por falar em língua, a realidade também é avassaladora, e somos nós próprios que, muitas vezes, tendemos a menosprezar a afirmação da nossa cultura.O que significa hoje a língua portuguesa no mundo,sustentada em números: a 4ª língua mais falada (e a 1ª no hemisfério sul) , com uma comunidade de 261 milhões, espalhada pelos cinco continentes e cujas estimativas apontam para 380 milhões de falantes em 2050.

Sem esquecer os muitos milhares de pessoas que ajudam a engrandecer uma língua da forma mais simples, ou seja, aprendendo essa língua. E, neste contexto, hoje são mais de 70 mil alunos que, em 17 países, estão a aprender ou a desenvolver competências em português, aos quais se juntam outros 90 mil que o aprendem como língua curricular- no ensino básico e secundário e nos países em que existe essa oferta- e os mais de 100 mil alunos do ensino superior espalhados por todo o mundo que fazem os seus estudos em português.

PORTUGAL DOS PEQUENINOS

É este Portugal dos Pequeninos (que também o temos em Coimbra que hoje se voltou a afirmar maior no mundo. E “não veio, mas sim voltou” é o termo certo, deixando-se aqui o desafio de algum historiador poder vir a estabelecer o friso ou o ciclo cronológico dos momentos impactantes do papel de Portugal no mundo e na História da Humanidade.Na verdade, para os mais desatentos, esta realidade de afirmação de Portugal no mundo e muitas vezes em momentos determinantes da História da Humanidade parece uma miragem enaltecida por Camões. Mas, desde a tenacidade de Viriato à teimosia de D. Afonso Henriques – e aqui relembro o livro do professor Freitas do Amaral – que Portugal é um país inviável e aí, pelo menos, já temos nós, os portugueses, uma característica intrínseca de sucesso que nos distingue de todos os outros: somos o único povo capaz de tornar viável um país inviável e já o fazemos há 900 anos.E relembremos aqui outra data, , que assinalou o fim do Império, quando entregámos formalmente Macau aos chineses. Hoje, se olharmos para o sucesso do território, quem diria que já foi português. Mas, na realidade, se soubermos olhar para a nossa História e dela retirar as necessárias ilações, vemos que este caso de sucesso se deve ao facto de “esta pequena pérola” ter cunho lusitano e a obra e o engenho das gentes lusitanas.Em 1999, os chineses perceberam e assimilaram bem esta lição e Macau lá continua na senda próspera, hoje não nossa, mas alma e ainda pátria de muitos e bons portugueses.

DAR VALOR

E fechámos o ciclo. Já não é só a nossa capacidade de afirmação lá fora e nos mais variados domínios, no desporto, na cultura, na ciência – relembro aqui, por exemplo, o papel pioneiro da Fundação Champalimaud na investigação –, como é também a nossa recetividade cá dentro, num país hospitaleiro, rico nas suas tradições, paisagens e costumes, rico nas suas gentes, o qual todos, de repente, parecem querer descobrir, experimentar ou escolher como destino para viver.Talvez agora saibamos também dar mais valor aos milhares e milhares de emigrantes portugueses que, ao longo de décadas, tomaram este desígnio por seu: o orgulho de ser português.

por José Caria

Jornalista