A TEORIA DO NADA
Já escrevi muitas vezes nas páginas desta revista que Portugal precisa de elites, precisa de uma sociedade que se reveja nas suas elites, precisa de um poder político que entenda as elites como um fator de coesão para o seu exercício político. Não precisa é de uma massa intelectualmente aculturada, pronta a respostas meramente emotivas, sem tentar descortinar a sua natureza ou as consequências da sua adesão. Falo de Portugal, falo da Europa, e os exemplos estão aí, são palpáveis, como em França onde esta mesma massa aculturada permitiu a Marine Le Pen passar a uma segunda volta das eleições presidenciais. Agora é tempo de medo quando devia ser de assunção de responsabilidades. O estado de negação da grande parte das lideranças europeias é confrangedor. Esse mesmo estado de negação perante as constantes mudanças ideológicas e sociológicas das nossas sociedades modernas, essa sistemática destruição de um tão necessário espaço público como forma de combater a aculturação provocada pela excessiva mediatização do discurso político mas que, em última análise, se estende viralmente a todos os domínios da sociedade, projetou uma cultura de massas onde o desvio de valores tende a ser normativo, pois o elemento agregador e catalisador resultante do exercício do poder democrático está, cada vez mais, vazio de sentido. Hoje já estamos a meio caminho entre a mediatização e a espetacularização, correndo o risco – mesmo que não seja essa a intenção – de transformar todo o discurso político numa imensa amálgama de propaganda com todas as consequências nefastas que daí podem advir. A este propósito relembro só o que, há mais de 70 anos, escreveu Adolf Hitler, no capítulo dedicado à Propaganda, no seu livro Mein Kampf: “A capacidade de compreensão das grandes massas humanas é limitada e o seu entendimento muito restrito; em compensação, a sua falta de memória é maiúscula (…) Toda a propaganda deve ser popular e adotar um nível intelectual dentro dos limites das faculdades de assimilação do mais limitado daqueles a que é dirigida.” Mais uma vez, hoje, estamos a falar de propaganda ou do discurso estereotipado a que todos os dias assistimos nos media, principalmente na televisão? Como rasgar esta cortina? Este papel cabe não só aos políticos, mas também às elites, essas mesmas capazes de catalisar o amorfismo do discurso político vigente, propagandeado pela forma, mas que em simultâneo lhe vaza o conteúdo. É fundamental rasgar esta cortina e que os políticos – os que representam as forças partidárias capazes de alicerçar a democracia e o Estado de Direito – percebam que têm de voltar a falar para as pessoas. E que só o podem fazer se procurarem apoio nas elites que têm teimado em aniquilar. Caso contrário, olhem para a França e para Marine Le Pen, para a Holanda e indivíduos como Jeroen Dijsselbloem, para a Grécia… ou até para Portugal. E deixo-vos uma última ressalva: importante relembrar que as ideias propostas em Mein Kampf não surgiram com Hitler, mas foram oriundas de teorias e argumentos então correntes na Europa, esta mesma nossa Europa.