JOSE CARIA

Foto FrontlineUM GESTO INÚTIL

O ministro da Administração Interna demitiu-se! Demitiu-se alegando falta de condições políticas por força da investigação judicial que está a decorrer sobre a atribuição dos denominados vistos gold. O ministro não tem culpas, nem qualquer responsabilidade no caso, e a sua alegada falta de condições políticas advogará da sua proximidade a arguidos ou empresas que envolvem arguidos em tempos idos. O ministro demitiu-se e ninguém percebeu porquê. É uma demissão inútil, é um gesto inútil que só veio causar mais perturbação num Governo já fragilizado. Tão inútil que para os portugueses foi indiferente, mas o mesmo não se poderá dizer de alguns setores tutelados, caso da Polícia ou dos Bombeiros, que até reagiram com alguma apreensão à saída do ministro. Passos também compreendeu esta inutilidade e até tentou travar a saída do seu governante, mas aparentemente sem sucesso. Porque a opção com sentido seria uma única: ou o primeiro-ministro aproveitava para fazer uma remodelação profunda no seu Governo, ou então não mexia apenas num ministro ou neste ministro. Já escrevi aqui que louvava a resiliência de Passos Coelho, mas quando esta se transforma em obstinação, o caminho está perdido. Sendo assim, afinal onde está a utilidade de toda esta inutilidade? Esta bem expressa na habilidade política de Miguel Macedo. O ministro agiu por interesse próprio, não revelando se a sua saída era ou não útil ao seu país e aos seus pares. Macedo é um farejador político e apostou que a sua permanência no cargo lhe iria causar erosão pessoal pelo mediatismo que este caso, conhecido por Operação Labirinto, lhe iria trazer. Macedo não esperou para sair deste labirinto e construiu um álibi inteligente que ao mesmo tempo lhe permitiu sair de um Governo em rápida erosão política e social. Sabemos que os portugueses têm má memória política. Não tenho dúvidas se, numa pergunta de resposta espontânea, perguntassem ao povo de que políticos se lembra, a resposta não iria além dos três presidentes da República, Eanes, Soares e Cavaco; dois políticos retardados no tempo, Santana e Sócrates, e duas figuras atuais, Passos e Portas. Quanto a Macedo, o seu gesto inútil pode-lhe ter salvado o futuro político. Resta saber se faz sentido viver com estas inutilidades políticas quando a descrença do povo nos agentes democráticos cresce de dia para dia. Até quando os políticos julgam que os portugueses não vão perceber?