A interminável narrativa da crise europeia, a mediocridade continuamente revelada da generalidade dos seus líderes políticos e o consequente precipitar de Portugal numa espiral cada vez mais recessiva, cuja face mais evidente e alarmante é a destruição de todo o seu tecido social, levam-me a querer gritar aquilo que há anos ando a escrever: Portugal não é Europa, não pertence à Europa, nunca pertenceu e não deve pertencer. Aliás, em bom rigor histórico, a Europa é que já alguma vez foi Portugal. Não compreendo, a não ser por obstinação ou estupidez, a visão estratégica dos nossos governantes dos últimos 30 anos em quererem aniquilar, na forma e na substância, aquilo que a nossa História já provou sobre nós, os portugueses, nos nove séculos que nos separam do berço da nacionalidade: somos um povo de vocação atlantista, de olhos postos no mar como horizonte, onde novos continentes sempre foram braço do nosso destino, nomeadamente África e as Américas. Nesta lógica é inultrapassável falar de Angola, hoje terra de retorno para muitos, terra de acolhimento para muitos outros, mas, na verdade, terra de onde de alma e coração nunca saímos. Espanta-me, por isso mesmo, a incongruência e muitas vezes manifesta irracionalidade da nossa política externa neste domínio, não só para com Angola mas também para com muitos outros países africanos. Ainda há pouco tempo vi com algum espanto as parangonas na imprensa portuguesa sobre um artigo que falava de alegados favorecimentos a Isabel dos Santos, filha do presidente angolano, só porque tinha sido publicado pela revista Forbes. Como se, por si só, este facto fosse relevante ou se a dita revista fosse digna de maior isenção do que qualquer órgão de comunicação social português. O que não percebo é este clima persecutório por parte de alguns ou que interesses poderão mover, da mesma forma que não percebo esta total ausência de determinação do Estado português. No entanto, mesmo neste oásis, há que saudar um novo ministro deste velho Governo, logo o da Economia e de seu nome Pires de Lima, que no imediato da sua posse pôs Angola e Moçambique no topo das suas preocupações. Não significa tudo isto que ache que tudo está bem em Angola, claro que não. E em Portugal está? Agora também há uma verdade que os angolanos têm rapidamente de se aperceber. Se se querem afirmar como país, nunca o conseguirão sem os portugueses e sem a sua capacidade de contribuírem para estruturar o tecido social angolano. Cem mil hoje já contribuem nesse sentido, dispersos por aquele vasto território, e começa a ser clarividente para muitos que o caminho futuro é para traçar em conjunto. Resta esperar que governantes de ambos os lados percebam esta inevitabilidade e deixem de ser entrave ao progresso.