A BARBÁRIE RUSSA CONTRA AS JOVENS E MULHERES UCRANIANAS – A guerra de agressão da Federação Russa contra a Ucrânia marca o regresso de um conflito aberto no coração da Europa, que confronta, uma vez mais, a população europeia com os horrores da guerra, como violência, opressão, destruição, fuga e exílio.
O conflito em curso no coração da Europa reproduz, infelizmente, os esquemas e forma de agressão entre os povos, que são tão velhos como a própria guerra. O combate armado e a violação são armas utilizadas para desmoralizar e destruir os indivíduos, lares, famílias e povos, em especial contra as mulheres ucranianas, as maiores vitimas de violência sexual.
A ideologia pode constituir uma motivação muito forte para cometer atos de violência sexual, especialmente através das violações, utilizada como meio para repovoar um país ou uma região pelo agressor, ou para suprimir, através da destruição, os direitos e a saúde sexual e reprodutiva das populações inimigas, fazendo uma limpeza étnica. A violência pode também fazer parte de um plano que visa eliminar um povo inteiro, o que constitui o crime de genocídio.
MULHERES UCRANIANAS, VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA
Foi neste sentido que a secretária-geral do Conselho da Europa, Marija Pejcinovic Buric, tem feito declarações sobre a necessidade de ajudar as mulheres ucranianas vitimas de violência e abusos sexuais às mãos dos soldados russos. Em abril de 2022, após os ataques das forças russas em Boutcha, o mediador para os Direitos do Homem da Ucrânia reportou cerca de 25 jovens e mulheres entre os 14 e os 24 anos que foram detidas, violadas e engravidadas.
Dois testemunhos pungentes firmados por diversas organizações internacionais são o de Mariya, que conta como “um soldado russo incitou os seus colegas a violar repetidamente as mulheres até que elas ficassem destruídas mentalmente, sendo que não se trata de um ato isolado, mas de ordens claras do Kremlin que este nega veementemente”. Ou o testemunho de Svetlana que, incapaz de contar o sucedido na primeira pessoa, se refugia no caso de uma amiga que conta como “em Mariupol foi violada por um soldado russo enquanto outro segurava o seu filho e o forçava a olhar”. Svetlana conta que “seguidamente outro soldado russo violou uma outra mulher num abrigo anti-aéreo e que a sua amiga o viu pôr a pistola na vagina e disparar para se assegurar que dela não nasceriam mais ucranianos”.
CRIMES CONTRA A HUMANIDADE
O artigo 7.º do Estatuto do Tribunal Penal Internacional qualifica como crimes contra a humanidade a violação, a escravatura sexual, a prostituição, a gravidez e a esterilização forçada, ou qualquer outra forma de violência sexual de gravidade comparável, quando cometidos contra a população civil. O Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia e o Tribunal Penal Internacional para o Ruanda tiveram um papel determinante para a criação de precedentes, formulando definições e elementos constitutivos dos crimes baseados no género.
Os crimes contra a humanidade, enquanto atrocidades internacionais graves, estão igualmente submetidos à competência universal, o que implica que os tribunais nacionais podem ser competentes para julgar uma pessoa suspeita de um crime contra a humanidade, mesmo se esta ou a vítima não forem nacionais do país onde está sediado o tribunal e se o crime foi praticado fora desse Estado.
A existência e o alcance da competência universal depende da legislação nacional. Por exemplo, as investigações no quadro desta competência relativas aos crimes de guerra cometidos aquando da invasão da Ucrânia pela Rússia, já se iniciaram em vários países como Alemanha, Espanha, Lituânia e Suécia. Para além disto há́ que pensar no apoio às vítimas e o estigma social que envolve estes crimes, pelo que é necessário oferecer-lhes locais seguros onde se possam exprimir livremente. As vítimas sobreviventes deveriam poder prevalecer-se do direito de serem indemnizadas sem terem necessariamente de comparecer em tribunal, mas esta possibilidade só é exequível nas sociedades onde a justiça permitiu alterações políticas e sociais.
Um mundo melhor, não o de hoje, mas o de amanhã, seria aquele em que todas as mulheres ucranianas e do mundo inteiro estivessem livres de qualquer violência, lhes fosse garantido o direito à vida, sempre em estreita associação com o respeito e a dignidade.