ISABEL MEIRELLES

PORTUGfrontline_25_meirellesAL CONDENADO NO TRIBUNAL EUROPEU DOS DIREITOS DO HOMEM POR VIOLAÇÃO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO

A necessidade de uma ONU europeia foi advogada por Churchill nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial, ideia que germinou e deu origem, em 1949, ao Conselho da Europa. A instituição mais emblemática desta organização, porque reconhecida internacionalmente, sobretudo pelo cidadão comum, é o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), que tem tido um papel fundamental na defesa da Convenção, repositório destes mesmos direitos. Diga-se, antes de mais, que os destinatários são apenas e tão-somente os Estados que podem, verificados uma série de estritos requisitos processuais, ser demandados junto do TEDH e condenados a indemnizações por vezes avultadas. Neste ano de 2014, Portugal já sofreu várias condenações, sendo uma das mais emblemáticas o caso Amorim Giestas e Jesus Costa Bordalo. Estes eram, em 2002, respetivamente jornalista e diretora do Jornal do Centro, o qual cobre a região de Viseu, tendo questionado, em artigo e editorial, a legalidade da doação de 36 dos 64 móveis do tribunal de S. Pedro do Sul, pelo seu secretário, à Misericórdia local, com exclusão de outras associações. No essencial, discutia-se naquelas peças jornalísticas o facto de terem sido dados móveis, sem concurso, sem critério, sem preocupação de informar eventuais interessados, a uma única instituição, o que estaria a levantar suspeitas fundadas. Nesta sequência, quer a Misericórdia quer o secretário judicial processaram, criminalmente, por difamação, os jornalistas, tendo obtido ganho de causa quer no Tribunal de Primeira Instância quer na Relação, por se ter considerado que a imputação de factos sob a forma de suspeitas e de insinuações maliciosas não podia ser acolhida sob o manto protetor do dever e do direito de informar e de ser informado, nem da liberdade de expressão, condenando-os ao pagamento de 4353,42 euros. Inconformados com esta condenação, os jornalistas recorreram para o TEDH alegando que a condenação penal não era admissível numa sociedade democrática e que os artigos revestiam interesse público, dado que não continham julgamentos dos comportamentos, mas que apenas se limitavam a constatar as suspeitas que agitavam a comunidade e as associações locais. O Estado português defendeu-se alegando que havia que proteger os direitos constitucionalmente consagrados dos visados, no caso, ao seu bom-nome e reputação, e que com os artigos publicados se ultrapassaram os limites da boa-fé e da crítica razoável. O TEDH considerou, por seu turno que a imprensa tem um papel determinante numa sociedade democrática e que lhe incumbe veicular, sem ultrapassar certos limites, informações e ideias sobre questões de interesse geral, sendo que, no caso concreto, foi isso que aconteceu, dado que as críticas eram baseadas em factos concretos e judiciosas enquanto contribuição cívica para um debate de interesse geral, tendo os envolvidos sido consultados e as suas declarações publicadas. Nestes termos, o TEDH condenou o Estado português a pagar aos requerentes jornalistas a soma de 11.753 euros a título de danos materiais e de 5 mil euros a título de despesas incorridas com o processo. A moral deste acórdão é que há uma instância judicial internacional à qual se pode recorrer e que pode reparar os erros cometidos a nível nacional e que não deve, por isso, ser negligenciada e, antes, observada com muita atenção como último reduto de defesa dos direitos e liberdades dos cidadãos.