ISABEL MEIRELLES

DA FUGA DE CÉREBROS A UMA GERAÇÃO PERDIDA

 

A verdadeira discussão sobre a fuga de cérebros de Portugal, ou seja, de profissionais altamente habilitados, tendo em conta os seus níveis de formação, qualificação e desempenho – onde se incluem cientistas, artistas, quadros ligados ao desporto e, especialmente, altos quadros executivos –, está na ordem do dia. A partir de 2008, com a entrada em dificuldades das economias e sobretudo da recessão em Portugal, o poder político começou a distanciar-se desta expressão de evasão dos seus melhores quadros, para preferir falar de mobilidade. A polémica tornou-se mais acesa quando o atual primeiro-ministro aconselhou os jovens profissionais mais qualificados a emigrarem e a encontrarem oportunidades fora do país.Só que, concetualmente, existe o fenómeno da mobilidade, que beneficia de uma neutralidade valorativa e se aplica, no essencial, quando a emigração se refere a países com níveis de desenvolvimento equivalente, enquanto a fuga de cérebros se mantém associada a países subdesenvolvidos para países com mais progresso e bem-estar.Nesta situação, sobretudo com grandes fluxos, como os que existem atualmente, isto sinaliza a incapacidade do sistema político nacional de fixar as suas elites, aliás por razões sobejamente conhecidas que se prendem com os elevados níveis de desemprego, a enorme carga fiscal, a diminuição das prestações sociais e os baixos salários consequência da oferta de enorme mão de obra disponível.Uma tese de mestrado, realizada na Universidade de Utrecht, apresentada por Bo Irik, uma holandesa que cresceu em Portugal, baseou-se nas respostas de 2387 inquéritos respondidos por estudantes e recém-graduados portugueses para tentar quantificar a dimensão da fuga de cérebros em Portugal, tendo concluído que 29% dos jovens portugueses com formação superior está ativamente à procura de emprego no estrangeiro. O perfil dos potenciais emigrantes é de alunos com melhores notas e cujos pais também têm o ensino superior completo, que em regra fizeram Erasmus, não sendo a língua um obstáculo.Por outro lado, aproveitando estes e outros estudos, bem como a realidade do país, vários órgãos de comunicação social estrangeiros têm vindo a fazer reportagens sobre esta      realidade inquietante que protagoniza a maior onda de emigração desde os anos 60.Assim, recentemente, a BBC dedicou uma reportagem aos jovens licenciados que abandonam Portugal à procura de emprego e melhores condições de vida, dando como exemplo o de uma professora de 29 anos que se candidatou a 362 escolas nos últimos seis anos, tendo conseguido como único contrato nove meses de trabalho e auferindo apenas o salário mínimo. Entre 2009 e 2010 o Observatório de Emigração estima que, no Brasil, o número de portugueses registados nos consulados tenha crescido para cerca de 60 mil, e em Angola, onde se fixaram cerca de 3 mil empresas nacionais, foram emitidos cerca de 24 mil vistos para portugueses, contra 156 em 2006. Contudo, a questão mais preocupante é que a maior parte destes emigrantes não pretende regressar, ao contrário do que sucedeu na década de 60, o que pressagia, a prazo, um Portugal quase desertificado de elites e com terreno fértil para que grasse a mediocridade, com consequências nefastas dificilmente quantificáveis, que nem a exaltação dos feitos dos portugueses, por esse mundo fora, pode devolver a autoestima que assim se vai perdendo.  Em suma, uma geração colhida por outros, mas perdida para Portugal!