FERNANDO SANTO

ACESSO À HABITAÇÃO, DE NOVO, UM PROBLEMA NACIONAL! – A recente constituição do Ministério da Habitação, separado das infraestruturas, é uma boa medida perante a crescente dificuldade de acesso à habitação, seja com recurso a crédito ou arrendamento.

A primeira vez que foi constituído o Ministério da Habitação foi em fevereiro de 1976, quando era primeiro-ministro o almirante Pinheiro de Azevedo, (setembro de 1975 a junho de 1976), tendo sido ministro da Habitação, Urbanismo e Construção o Eng.º Eduardo Pereira, que teve um papel determinante na dinamização do setor da construção e nas políticas de habitação.

À data, a difícil situação do setor da construção e do acesso à habitação, como consequência do PREC (Processo Revolucionário em Curso), agravado pela chegada dos habitantes das ex-colónias, cerca de 500 mil pessoas, justificaram a criação do ministério e a nomeação de um ministro conhecedor do setor e das medidas necessárias para a sua dinamização, tendo lançado o Programa de Alojamento de Refugiados.

Decorridos 46 anos, a situação do país é bem diferente, mas na última década agravaram-se as condições para acesso à habitação, tema que repetidamente tenho tratado nas edições da FRONTLINE, como consequência de oferta reduzida, da subida do custo da construção, com implicação direta nos preços de venda e de arrendamento.

Por outro lado, a oferta de habitação pública ou as medidas para mitigar a diferença entre a capacidade financeira das famílias e o preço da habitação não têm sido adequadas nem suficientes, apesar dos programas que têm sido anunciados.

Por isso, a solução passa por um conjunto de políticas e medidas que permitam assegurar o contributo dos diversos participantes na cadeia produtiva: o Estado; as autarquias; os investidores para construção nova, reabilitação e arrendamento; os projetistas e as empresas de construção.

PROBLEMAS ESTRUTURAIS

Para além das questões conjunturais, existem problemas estruturais que exigem soluções pragmáticas e de rotura com políticas que têm contribuído para a não dinamização da oferta, ao contrário do modelo passado, em que a oferta era elevada e as taxas de juro permitiam prestações mensais para compra de habitação com valores inferiores aos das rendas.

A situação atual resulta do acumular de diferentes constrangimentos, nomeadamente: (1) Falta de confiança dos investidores perante as sucessivas alterações legislativas; (2) Sistema de licenciamento urbano complexo, como obstáculo ao investimento; (3) Impostos excessivos e de interpretação pouco clara; (4) Falta de mão-de-obra qualificada, o que provoca o acréscimo dos preços, a par com o aumento extraordinário de alguns materiais; (5) Elevado custo da construção e da reabilitação urbana e consequente preço de venda; (6) Regime de Arrendamento Urbano que condiciona o investimento para esse fim, uma vez que o Estado continua a obrigar os senhorios a assegurar a função social para proteção dos inquilinos; (7) Taxas de juro e inflação em crescimento; (8) Insuficiência da oferta pública e falta de apoio para subsídios de renda; (9) Código da Contratação Pública desadequado da contratação de empreitadas e execução dos contratos, bem como das prestações de serviços; (10) Perda de competência técnica e de gestão especializada dos serviços públicos para implementar as medidas necessárias para a promoção pública de habitação; (11) Dispersão da tutela do setor da construção, licenciamento, contratação pública e do imobiliário por vários ministérios, com ausência de medidas pragmáticas que tenham em conta o ciclo produtivo, as decisões de investimento, o tempo e o custo final.

Perante a atual situação não é suficiente tratar apenas uma parte dos constrangimentos, pois são necessárias políticas de amplo alcance para aumentar a oferta e reduzir preços, mobilizando o esforço conjunto e harmonizado de todos os intervenientes. Foi com esse objetivo que a CIP (Confederação Empresarial de Portugal), a CPCI (Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário), a Ordem dos Engenheiros, a Ordem dos Arquitectos e o Laboratório Nacional de Engenharia Civil promoveram a Convenção da Construção e da Habitação, no passado mês de dezembro, em que esteve presente o Presidente da República e a atual ministra da Habitação, então secretária de Estado.

DIAGNÓSTICO E PROPOSTAS

Foi apresentado o diagnóstico e propostas consideradas como necessárias para se desenvolver um programa que permitisse solucionar uma parte das dificuldades, das  quais se destacam as seguintes, para fazer acontecer o aumento da oferta de habitação a preços mais reduzidos: (1) Legislação estabilizada que assegure a confiança dos investidores; (2) Profunda alteração do sistema de licenciamento urbano, com harmonização das normas, regras e procedimentos a aplicar uniformemente a todos os municípios; (3) Regime fiscal adequado à redução de custos; (4) Regime para Regularização da Propriedade Imobiliária e de Prescrição de Infrações Urbanísticas; (5) Alterar o regime de arrendamento para fomentar a oferta de habitação; (6) Simplificar disposições da contratação pública de empreitadas, com adequação às boas práticas; (7) Reorganizar os serviços públicos, com as competências que permitam a eficiência da execução; (8) Centralizar, na organização do Governo, um novo Programa Nacional de Habitação, contemplando as propostas e medidas transversais para atingir os objetivos; (9) Publicar recomendações baseadas em boas práticas, para a contratação de projetos, fiscalização, contratação de empreitadas e gestão de empreendimentos; (10) Promover a aprovação de decreto-lei que permita a venda de imóveis inacabados; (11) Alterar a política de imigração para trabalhadores qualificados de outros países; (12) Alterar os processos construtivos, para incorporar sistemas prefabricados ligeiros que permitam reduzir custos e prazos.

Como representante da CIP na convenção e relator das propostas relativas à Habitação, considero que só uma política agregadora de todos os intervenientes e que mobilize o investimento, passando pela simplificação do sistema de licenciamento urbano, permitirá obter os resultados que todos desejam, mais habitação e com custo mais reduzido.

Há investimento privado e fundos comunitários disponíveis, pelo que, o insucesso só dependerá das políticas desajustadas e da incapacidade para implementar as medi- das necessárias.

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