FERNANDO SANTO

A TEIA  ADMINISTRATIVA

A Administração Pública é uma organização cada vez mais complexa, apesar das permanentes reformas, modernização dos serviços, formação profissional e introdução de novas tecnologias. Parece que, por cada medida no caminho da simplificação, se criam duas para responder a novos problemas. Se apenas estivesse em causa a prestação de serviços públicos, tudo seria mais simples, pois a organização teria como objetivo satisfazer os cidadãos, tal como as empresas se orientam para os seus clientes. A despesa seria menor e maior a satisfação dos cidadãos. Mas no nosso modelo de Administração Pública convergem muitos outros interesses, com enorme peso e capacidade de intervenção. Refiro-me, (1) aos interesses de todos os que trabalham na Administração Pública e ao correspondente modelo de organização e gestão, (2) aos procedimentos necessários para a aquisição de bens e serviços, os quais, supostamente, deveriam garantir a transparência e a concorrência, (3) à intervenção das entidades que regulam, licenciam, certificam e fiscalizam, para além de um infinito número de procedimentos impostos pela legislação, por circulares e até por interpretações jurídicas, por vezes contraditórias. Para o cidadão, o que importa são os serviços que satisfazem as suas necessidades, e sobre os quais têm perceção e capacidade de avaliação. Relativamente à outra parte da Administração Pública, a justificação da sua existência e crescimento resulta da necessidade da intervenção do Estado em todo o tipo de atos ou atividades, impondo obrigações e procedimentos que decorrem da teia legislativa. São milhares de disposições produzidas nas últimas décadas, com exigências dirigidas à Administração Pública, às empresas e aos cidadãos, seja para transpor Diretivas Comunitárias, geralmente acrescentando mais exigências, seja por iniciativa própria, o que tem vindo a transformar a vida de qualquer um e das empresas num verdadeiro labirinto de dificuldades. Neste labirinto legislativo estão incluídos os licenciamentos de todos os tipos, a necessidade de mais serviços para responder às exigências, os quais, não podendo ser assegurados pela Administração Pública, criam mais contratos com privados, que passam a ser regulados, certificados e fiscalizados, assim se alimentando uma máquina geradora de ineficiência, de despesa pública e privada. Este modelo de geração quase espontânea, mas que tem alimentado interesses muitos divergentes, tem também contribuído para o nosso permanente défice, perda de competitividade das empresas e para a dificuldade acrescida dos serviços públicos poderem responder em tempo útil às solicitações dos cidadãos e à concretização das políticas públicas. Em muitos casos, demora mais tempo a preparação de um concurso e o cumprimento de todas as normas e procedimentos em vigor do que a produção do bem ou a prestação do serviço. Esta é também uma face do Estado a que chegámos e que não poderá ser esquecida na Reforma do Estado.