A SELEÇÃO – O processo de escolha e seleção de membros do Governo de Portugal tem estado no centro das atenções depois de semanas em que assistimos a sucessivas demissões de governantes, sempre depois de invocados ou provados problemas de incompatibilidade ética ou legal, por vezes das duas, com o exercício dos cargos governantes. É evidente que houve leviandade, termo forte, até mesmo negligencia na indicação de pessoas. Também é certo que alguns dos indigitados, sabedores das suas limitações e passado, deveriam ter recusado os convites. Mas todos sabemos como está a ser difícil encontrar gente com qualidade profissional e moral que esteja na disposição de incorrer nos riscos associados ao desempenho de um lugar no Governo. Contudo, apesar dos salários relativamente baixos que um governante aufere, haverá́ sempre aqueles que por vaidade, simples necessidade de ocupação do espaço mediático ou expetativas de promoção após o fim do tirocínio governamental, estarão dispostos a assinar o livro de posse. Também há os que pretendem defender o interesse público e os que, sendo políticos por profissão ou vocação, têm de participar nos governos dos partidos políticos onde militam. Nem sequer são originalidades nacionais, a venalidade de uns, a incompetência de outros, a desadequação para o exercício de funções de mais uns quantos, a par de nomeações que se demonstram acertadas nas pessoas, nos cargos e no tempo em que são chamadas a governar. Sendo o objetivo e sem minimizar as consequências na reputação do primeiro-ministro (PM) por casos mediáticos envolvendo escândalos com recém-nomeados, nem as perdas de tempo e capacidade que advém do corrupio de substituições, podemos reconhecer que a maioria dos governantes lá se tem aguentado em funções, até porque o PM de agora é avesso a remodelações.
Ora, se é claro que para quem escolhe deve ficar toda a imputação do erro na escolha, não é menos verdade que nem sempre se pode saber tudo sobre os outros. Ainda bem. Fala-se agora de vetting, o processo de análise aprofundada e criteriosa de nomeados para cargos de governo, como já tende a acontecer com a CRESAP para a administração pública – organismo cheio de defeitos e que não colhe o meu apreço – e, imagino, acontecerá hoje em serviços de segurança do Estado. Não é tão simples como possa parecer, desde logo porque introduz mais demora na constituição do Governo. Depois, será preciso definir se a avaliação será́ feita pela Assembleia da República, Presidente da República, Tribunal Constitucional, já depositário de declarações de interesses dos governantes, deputados e outros altos-cargos, ou por uma nova comissão do tipo da CRESAP, até mesmo por esta última com poderes, termos de referência e constituição diferentes. E também será preciso definir se a avaliação se centrará sobre a idoneidade ética e legal ou sobre habilitações específicas que se deveriam exigir a um governante.
Parece-me que será sempre mais fácil manter o sistema vigente, documental, com a eventual criminalização da prestação de declarações falsas, exigindo um certificado de registo criminal e declarações de rendimentos e de ausência de incompatibilidades, claríssimas num quadro legal que não esteja sujeito a interpretações díspares. Tudo isto deveria ser entregue previamente à tomada de posse, nunca depois como agora acontece, e verificado por um órgão do poder judicial capacitado e mandatado para essa função, até mantendo o sigilo sobre os factos apurados se o candidato for reprovado, mas sem deixar de investigar e mandar investigar o que precise de ser esclarecido. Há países com sistemas mais complicados, como acontece nos EUA, regime de forte pendor presidencial, ou em outros casos de influência anglo-saxónica. Mas julgo não haver necessidade de complicar em demasia, e se ao menos fosse possível detetar casos de incumprimento de leis, mesmo que ainda sob investigação, já se aliviara muito stress politico e mediático. Claro que, para princípio futuro, dever-se-ia começar por não se continuar com este forrobodó de familiares de uns a sucederem aos familiares de outros, na verdade todos da mesma famiglia.