BREXITISH AIRWAYS – “A satisfação dos utilizadores é parte integrante da valoração e definição do que é qualidade”
Recentemente tive uma experiência altamente negativa numa renomada companhia aérea do Reino Unido. No essencial, fui violenta e inopinadamente alvo de agressões verbais e ameaças de um funcionário de terra que, seguramente, não estaria nos seus melhores dias. Meio dia antes, ao embarcar para um voo de uma companhia americana, de nome e sede, havia sido tratado com inusitada preocupação, que só foi possível porque, ao contrário do recomendado, usei o check-in pessoal em vez das máquinas que não me conseguiriam resolver o problema em questão. Este contraste, na forma de tratamento e na impressão que me foi causada enquanto cliente, levou-me a pensar em possíveis razões profundas que poderão estar na origem do crescente mau tratamento dos utilizadores do transporte aéreo comercial. Note-se que há experiências nefastas, algumas enchendo as redes sociais, em todo o mundo e em ambos os lados do Atlântico, pelo que o mau feitio do britânico que me caiu na rifa não se poderá explicar pela ansiedade gerada com a incerteza do Brexit.
Mas há uma outra possibilidade que interessa explorar. Logo à partida, também por causa da tradição remuneratória nos EUA estar muito ligada à qualidade do serviço prestado e ao atendimento, é inegável que, requinte à parte, em lojas, restaurantes e outras atividades em que há intervenção humana, na América há tendencialmente uma maior preocupação com o que o cliente pensa e, acima de tudo, sente.
Mas há mais. Nos últimos anos, com a intenção declarada de aumentar a eficiência dos procedimentos, reduzindo a variável tempo despendido, e a vontade não declarada de reduzir custos da operação, tem havido a substituição da intervenção humana, com contacto pessoal, por procedimentos automáticos, mediados por máquinas e teclados. Ora, este facto, filho do progresso bem-vindo, tem-se associado a uma crescente diminuição da presença de pessoas que possam ajudar os clientes e do treino em relações interpessoais das que ainda existem.
Convirá que todas as indústrias de serviços, com grande enfoque na da Saúde, não deixem de investir no treino e na formação dos funcionários que lidam com os clientes. As pessoas têm cada vez menos oportunidades, tempo efetivo, de contacto ocular com o interlocutor que se senta atrás de uma secretária, de um balcão, de qualquer coisa que os afasta de quem nos deve servir. Afastamento é proteção, mas também é fonte de insatisfação. Afastamento gera incompreensão e, pior ainda, reduz a capacidade de procurar compreender.
Uma coisa é certa. A satisfação dos utilizadores é parte integrante da valoração e definição do que é qualidade. Quem não souber tratar bem os seus clientes não tem qualidade. Tratar bem não é só chegar a horas. A experiência de quem usa um serviço tem muitos componentes e nenhum pode ser esquecido. Nenhuma máquina, por enquanto, é capaz de compreender um ser humano como outro ser humano. Não desinvistam nas pessoas.