TÃO PRÓXIMOS, À DISTÂNCIA
Um estudo recente, apresentado no mês de maio do corrente ano, na última reunião anual da Sociedade Americana de Oncologia (ASCO), mereceu um comentário que merece ser destacado. “If this were a drug that had a survival advantage of this magnitude, it would be retail priced at $100,000” (Se fosse um fármaco, valeria 100.000 dólares!). Estava, o autor do comentário, a referir-se a uma ferramenta de base web (disponível na internet) para a monitorização clínica de sintomas, auto-reportados, de doentes com carcinomas metastáticos. O mais interessante foi a demonstração de que o uso desta ferramenta esteve associada a um incremento de sobrevivência de mais cinco meses, em comparação com o grupo de controlo que apenas teve acesso aos cuidados habituais com reporte de sintomas sem uso da internet. Tratando-se de um estudo aleatorizado, a confirmação de uma vantagem de sobrevivência com significado clínico é um marco importante para a mudança de paradigma no tratamento de doentes com cancro. Estes resultados que foram obtidos no Memorial Sloan Kettering Cancer Centre (MSKCC), de Nova Iorque, ilustram os caminhos que a Medicina clínica tem de forçosamente seguir. Disponibilidade permanente dos médicos e enfermeiros, via ferramentas de telemática que não existiam quando me licenciei – nem telemóveis havia –, exigência dos doentes em serem melhor e mais permanentemente acompanhados e, o mais importante, maior controlo da doença pelo próprio doente. Profeticamente, embora apenas constatando uma realidade inultrapassável, foi publicado, em 2015, um livro intitulado The patient will see you now, de Eric Topol. O doente determina o que quer e quando quer ser observado, à distância, quando precisa e com a possibilidade de poder ser seguido circadianamente. Curiosamente, o título que não foi alvo de ação por pelágio, já tinha sido usado por Carey Kriz e Steven Kussin, em 2008 e 2012, respetivamente. Oito anos é uma eternidade na evolução das tecnologias de comunicação. A utilização da telemática e da informática médica abriu novas possibilidades para o uso de informação gerada pelos doentes, patient reported outcomes, que é o novo hype na avaliação de qualidade de vida e do importantíssimo controlo que cada um de nós, em especial se doentes, deve poder manter sobre a sua vida. Os resultados do MSKCC dizem-nos que ter acompanhamento permanente é bom, já o sabíamos, mas dizem-nos também que é fundamental ser capaz de ouvir os doentes na hora certa e responder-lhes em tempo útil. Há uma nova forma de encarar a palavra ACESSO a cuidados de saúde. Mas não nos iludamos, para que estas realidades novas possam funcionar, precisamos de uma nova geração de doentes e cuidadores, que até já está aí, mas também de recursos humanos e técnicos que custam dinheiro. Não serão os 100 mil dólares de que se falou na reunião da ASCO, mas será muito mais do que centenas de milhares de euros, dependente de uma vontade política nova nos modos como se devem encarar o sistema de saúde e os doentes.