EQUIDADE FISCAL
Ao longo da história a questão orçamental foi sempre um tema chave para a governação e para a soberania do país. A turbulência nas contas explica muitos dos episódios da nossa vida coletiva. No século XX levou ao enfraquecimento da República e abriu caminho à implantação do Estado Novo. Já em democracia, as contas obrigaram o país a recorrer várias vezes ao apoio das instituições internacionais, quase sempre com contrapartidas dolorosas no plano da austeridade imposta aos portugueses, em particular aos mais carenciados.
Com uma dívida pública ainda elevada, mas a descer e com contas certas e equilibradas nos últimos exercícios, Portugal, mesmo num cenário internacional muito desfavorável e marcado pela inflação e pelos impactos da guerra, tem margem de manobra para poder debater escolhas e opções estruturantes no plano fiscal. É de inteira justiça creditar ao Governo em funções o notável sucesso que constitui a criação de condições para que possam ser introduzidas mudanças positivas tecnicamente viáveis.
Com folga técnica, as diversas forças políticas não hesitaram em colocar a questão fiscal na primeira linha do debate político. Essa opção não é alheia à perceção que campeia pelo país de que os últimos desenvolvimentos económicos na Europa e no Mundo e o seu impacto em Portugal geraram distorções de equidade fiscal e fardos excessivos para a classe média e para alguns segmentos específicos da nossa sociedade.
No momento em que escrevo este texto não foram ainda apresentadas pelo Governo as grandes prioridades orçamentais. As oposições fizeram sonoras proclamações e agitaram grandes números, mas sem detalhe do como fazer ou dos objetivos específicos a atingir.
Consciente da complexidade da elaboração e da negociação de um orçamento e sem poder neste texto abordar todas as áreas que precisam de obras, enumero três domínios que exemplificam os caminhos que julgo serem fundamentais para trilhar com coragem e determinação, congregando esforços no plano nacional e também, quando necessário, no plano internacional.
Em primeiro lugar, é preciso assegurar um rendimento disponível mais atrativo para as novas gerações altamente qualificadas, evitando a sangria brutal de talentos a que o país tem sido sujeito, pondo em causa, no presente e no futuro, os índices de produtividade, inovação e reputação.
Em segundo lugar, é necessário aprofundar a discriminação fiscal positiva do interior para atrair pessoas e empresas, descongestionar a pressão sobre o litoral e permitir uma melhor gestão das redes, designadamente da rede de habitação.
Finalmente, num quadro internacional poroso, é necessário aprofundar o combate à fuga fiscal e desincentivar o recurso aos paraísos fiscais, recorrendo também à diplomacia multilateral, no plano europeu e global.
Não há soluções mágicas e de resultados imediatos para garantir a equidade fiscal, mas medidas no sentido certo mudam as perceções e as boas perceções geram alianças para a transformar numa realidade. Portugal precisa.