CONFIANÇA, COMPROMISSO E TRANSPARÊNCIA
Há várias teorias para explicar a riqueza e a pobreza das nações. Todas dão um contributo para descrever uma realidade que depois se reflete nos indicadores, nas perceções e na vida em concreto. Ao longo da vida fui percebendo como a geografia interagiu com a história e como ambas traçaram rotas que nos trouxeram até aqui. Viajando por quase todo o mundo, pude comprovar empiricamente a validade das ideias e a diversidade dos factos que traçam o destino dos povos.
Do cadinho teórico e prático a que acedi emerge a chave que determina quase tudo, ou seja, a confiança nas instituições, nas empresas, nas pessoas, nas relações, nos processos, nas decisões, nas informações, nas redes neuronais que tecem o tecido social, político e económico dos territórios e das sociedades.
A confiança marca o destino e traça a fronteira entre o sucesso e o insucesso das obras da humanidade, desde os mais simples gestos às mais extraordinárias gestas. Foi a confiança ou a impossibilidade de não a ter que trouxe Portugal através de quase mil anos de história, como um dos mais improváveis sobreviventes da geopolítica global.
Acredito no meu país e na sua capacidade de se continuar a afirmar num mundo em mudança, e acredito também, e cada vez mais, que a confiança prática é o que mais nos vai faltando para sermos melhor sucedidos. Confiança, não em nós mesmos, mas nas relações que se estabelecem e que se desenham quase sempre sobre a arquitetura do controlo em detrimento do primado da transparência.
A falta de confiança não é de agora, mas agora funciona como um garrote mais apertado que nunca. Nada se faz ou executa na nossa administração pública sem antes ter que passar pelo atarraxado gargalo das “Finanças”. Assim se atrasam processos, se perdem oportunidades, se desperdiçam energias e se destroem vontades.
As contas certas e a sustentabilidade financeira do país são um bem comum que nos beneficia a todos e cuja quebra, quando sucedeu, como sabemos por experiência própria, convocou os fantasmas e os diabos que alguns invocaram como salvadores, como a austeridade, os baixos salários ou a precariedade das respostas sociais.
Com confiança, a adequação das execuções financeiras e dos impactos concretos dos projetos e das políticas pode e deve ser feita de forma dinâmica, com reporte de quem executa e com responsabilização pelo resultado final.
Assisto com expetativa e colaboro com entusiasmo e compromisso no desenho de novas políticas públicas, mais descentralizadas, integradas, transversais e modernas. Temo, no entanto, que se a modernização não desatar os nós dos múltiplos “vistos prévios”, formais ou informais, filhos da desconfiança, muito do que poderíamos conseguir se perca nas malhas da burocracia.
Comemoraremos em breve os 50 anos de Abril. Celebraremos também 50 anos sem “visto prévio” à liberdade de pensar e de escrever. É tempo de ter confiança numa sociedade capaz de fazer segundo as regras, trocando tutelas prévias por compromisso e transparência. Todos ganharemos com isso.