CIRCULAR É VIVER – A presidência portuguesa do Conselho da União Europeia cumpriu em circunstâncias difíceis um programa muito ambicioso de conjugação das dimensões climáticas, energéticas, digitais e sociais do desenvolvimento e do crescimento sustentável e deixou marcas indeléveis no reposionamento geoestratégico da União face ao Brexit e à mudança da administração americana e na forma como conseguiu cerzir respostas financeiramente solidárias e parcialmente harmonizadas à pandemia. Depois de, entre muitos outros avanços legislativos, ter conseguido o acordo em relação à Lei do Clima que será o pilar das estratégias de descarbonização da União e em particular do pacote FIT 55, que visa reduzir as emissões em pelo menos 55% até 2030, a presidência conseguiu também um acordo histórico sobre a Política Agrícola Comum, compatível com os objetivos da neutralidade carbónica e da biodiversidade estabelecidos no Pacto Ecológico europeu (Green Deal).
Para que tudo isto seja possível, é fundamental uma alteração forte de modelos de organização e de comportamentos, e também um forte impulso tecnológico. Na comunicação que atualiza a estratégia industrial europeia de março de 2020, apresentada em maio deste ano, a Comissão Europeia redefine os princípios da autonomia estratégica europeia, reforça os mecanismos de cooperação entre Estados-membros e de promoção de alianças industriais em setores-chave e define prioridades claras em setores como as matérias-primas essenciais, as baterias, os produtos farmacêuticos, o hidrogénio, os semicondutores, a computação em nuvem e as tecnologias de ponta. Nessa comunicação é também muito reforçada a capacidade de monitorização dos impactos das políticas e de acompanhamento da evolução das tecnologias e das cadeias de valor. Essa monitorização é fundamental para permitir flexibilidade na tomada de decisão, num quadro de financiamento que, espero, seja adequado ao novo contexto de aceleração dos desafios, e também para colocar em prática uma estratégia eficaz e transparente de comunicação, que possa chegar da forma mais alargada possível a toda a sociedade civil.
Umas com boas intenções e outras nem tanto, são cada vez mais as referências aos impactos ambientais colaterais de algumas tecnologias que ajudam a promover a neutralidade carbónica, designadamente no plano da gestão de resíduos e da exploração de matérias-primas críticas para a produção dos equipamentos de nova geração. A resposta a este desafio implica voltarmos a colocar no centro de todos os modelos de ação a aposta determinada na economia circular. Reduzir, reutilizar e reciclar os recursos é a forma mais eficaz de conciliar a transformação tecnológica, a renovação do parque de equipamentos necessários e a sustentabilidade ambiental. Usando uma expressão que se tornou conhecida por outras razões, também no equilíbrio entre o progresso e a preservação do ambiente, circular é viver.