CARLOS ZORRINHO

INCERTITUDE – Se há um sentimento que sintetiza o mundo em que vivemos, obrigados a uma perigosa convivência com o COVID19, é a incerteza. Não é certa a forma como o vírus chegou à humanidade, como se propagou, como vai evoluir, que impactos vai ter na saúde individual e global, na economia, na sociedade e no ambiente. Com humildade e coesão institucional e social, os portugueses responderam com rigor à ameaça. Sobrevivemos com perdas relativamente menores que países vizinhos ao terramoto sanitário e estamos a preparar-nos para resistir ao tsunami económico e social que dele decorre, procurando evitar que a economia e o tecido social se afoguem e impedir que os nossos pés se prendam na lama e nos impeçam de recuperar quando for tempo disso. Não reconheço a um agente patológico que semeou a tristeza, a dor e a pobreza pelo mundo qualquer qualidade transformadora. O que ele provocou, no entanto, vai induzir em cada um de nós uma transformação interior, nos nossos sentimentos, no nosso olhar e na nossa perspetiva perante a vida, nas nossas escolhas e opções e nos nossos comportamentos e atitudes. Inspirado pelo exemplo português, mas também a clara derrota dos líderes arrogantes nas suas estratégias de confronto com a pandemia um pouco por todo o mundo, acredito que a humanidade em geral, e cada um de nós em particular, sairá desta crise mais humilde, mais consciente das potencialidades e das fragilidades, da necessidade de cooperar e de ser solidário, da força dos sonhos e do poder dos limites. Somos humanos, e precisamos de sobreviver para sermos capazes de nos transcender. O que está a acontecer na União Europeia também é fonte de permanente aprendizagem. O egoísmo inicial foi-se esbatendo à medida que os povos foram percebendo que estar coordenados lhes daria mais capacidade para a resposta sanitária e potenciaria a recuperação económica e social por que todos anseiam. No momento da aflição, os cidadãos olharam primeiro para os seus Governos e depois exigiram deles as melhores respostas em coordenação e cooperação. A arrogância também aqui não pagou dividendos, nem políticos, nem de bem-estar. No momento em que escrevo este texto, decorre um braço de ferro entre os países solidários e os países forretas sobre o grau de solidariedade na recuperação política, económica e social da União Europeia. É arriscado prognosticar o resultado, mas a indiferença em relação à União Europeia morreu. Com esperança ou sem ela, com aceitação ou desilusão, com amor ou desamor, os europeus voltaram a perceber que nas grandes catástrofes, sozinhos ficam mais expostos. 

Para um grande número dos seus cidadãos, a União Europeia deixou de ser indiferente no meio da incerteza. Da forma como for capaz de responder às expectativas perante a Incertitude do tempo em que vivemos, assim ganhará um futuro mais coordenado e solidário ou uma irrelevância letal.