O Padrão Mestre
Sinal dos tempos, o livro A Revolução do Algoritmo Mestre, publicado em 2015 pelo professor de Ciências da Computação da Universidade de Washington Pedro Domingos e editado em português em outubro de 2017 pela Editorial Presença, atingiu rapidamente notoriedade e os escaparates dos livros mais vendidos. A questão colocada com grande engenho comunicativo e densidade teórica pelo autor é central. A brutal aceleração tecnológica nas capacidades de captura, armazenamento, processamento e transmissão de dados gera um quadro de forte complexidade e incerteza. Sem uma gestão compatível dos padrões de leitura, esses dados são um lixo monstruoso e um ruído ensurdecedor. Mesmo que todos os seres humanos se especializassem em codificadores de dados para os transformarem em conhecimento, perderíamos a corrida contra o volume de novos dados que é gerado em cada minuto. A solução encontrada em parceria pelas empresas, laboratórios de investigação e universidades foi tentar automatizar também a aplicação de padrões cada vez mais emulados do comportamento humano, gerando a designada capacidade de aprendizagem automática das máquinas através de algoritmos de análise cada vez mais sofisticados (embora não necessariamente complexos). Neste quadro, que experienciamos cada vez que consultamos um motor de busca ou interagimos com uma página automática de registo ou informação, por exemplo, as máquinas encaminham-nos cada vez mais para a tomada de decisão. O nosso grau de liberdade reside na capacidade que tivermos de usar com sentido crítico as novas ferramentas, dominarmos a pergunta que queremos colocar e saber o que desejamos em cada momento, para confrontar e escolher entre isso e aquilo que o algoritmo intui que deveria ser a nossa escolha. Contudo, a avalanche de decisões que teremos que tomar em cada dia fará com que seja crucial também para nós selecionar as que queremos testar e as que queremos simplesmente adotar. Assistimos a um estimulante caminho científico para encontrar um algoritmo (o designado algoritmo mestre) que emule o ADN dos processos de decisão e se torne um artefacto lógico de uso universal. As barreiras mais difíceis são a incorporação nesse algoritmo dos valores e dos princípios éticos (veja-se o dilema na condução automática sobre o que fazer em caso de acidente inevitável em que é preciso optar entre vítimas alternativas). A procissão neste domínio científico, como em muitos outros, ainda vai no adro, mas dará passos longos em pouco tempo. Oxalá se consiga definir um algoritmo mestre, mas que antes disso a humanidade seja capaz de se comprometer com um padrão mestre de valores que permita que a mudança tecnológica nos conduza a uma sociedade mais livre, inclusiva, digna e feliz.