CARLOS ZORRINHO

ZORRINHOPOPULISMOS E POPULISTAS

No mundo ocidental, no quadro de democracias maduras e consolidadas, os populismos e os populistas têm vindo a ganhar terreno aos modelos de concertação e representação tradicional, caracterizados pela alternância ou alternativa entre propostas progressistas e conservadoras de governo. Os populismos e os populistas estão a aproveitar com grande eficácia as regras democráticas e os erros das forças que foram centrais no exercício dos mandatos de governação nas últimas décadas. Temos que respeitar democraticamente as escolhas dos povos, mas não podemos permitir que, à semelhança do que conseguiram os fascistas no século passado, a sequência de uma ascensão segundo as regras democráticas seja a sua brutal suspensão. O Ocidente está a ser vítima do seu próprio sucesso e da incapacidade de manter os seus princípios de diferenciação positiva no quadro na nova globalização. Vejamos o exemplo da União Europeia (UE), um projeto de sucesso na promoção da paz, de modelos sociais avançados, de regras fundamentais de proteção do ambiente e de princípios solidários de cooperação global. A aplicação liderada pelos social-democratas e pelos democratas-cristãos destas linhas de afirmação tornaram a UE um território de oportunidades e aumentaram de forma marcante as expectativas de realização e qualidade de vida dos seus cidadãos.  No entanto, ao não completar a construção da União Económica e Monetária no início do milénio e ao falhar com estrondo a reação à crise financeira de 2008, a UE deixou que a iniquidade e as brutais desigualdades resultantes da globalização desregulada minassem os seus pilares e gerassem entre a maioria dos seus cidadãos uma profunda frustração por não conseguirem realizar o futuro que tinham idealizado. A UE continua a ser uma referência em temas tão importantes como os direitos humanos, a dignidade e o direito à proteção social, a cooperação internacional, o combate às alterações climáticas ou a defesa da democracia. No entanto a perceção sobre a solidez destes fatores positivos é cada vez menor, e a essa perda de confiança juntam-se agora a insegurança, a incerteza, as divisões regionais, a xenofobia e o medo. Está criado o campo fértil para o populismo que tem que ser combatido com compromisso ético e participação cívica, começando por atacar as iniquidades sociais e económicas que geram a revolta dos povos. Liberdade, igualdade, solidariedade, dignidade, felicidade. Estes valores têm que ser embutidos nas regras de convivência global e em cada território e comunidade. A alternativa será um ciclo mais ou menos longo de “trevas”. Não seria o primeiro.