Vivemos um tempo de sacrifícios em nome do cumprimento de um plano de consolidação das contas públicas e de financiamento estrutural da nossa economia, genericamente conhecido como “Memorando da Troika”. É um plano duro cuja consistência tem vindo a ser posta em causa pelos fracos resultados de uma terapia similar em concretização na Grécia e pela forma descompensada como tem sido aplicado em Portugal, com grande incidência da cobrança fiscal e muito pouco foco na compensação pelo lado da economia e da sua dinamização, ou seja, da criação de riqueza. A questão mais crítica para o nosso futuro colectivo tem sido, a meu ver, a incapacidade do actual governo, de transmitir aos portugueses e às empresas uma mensagem credível sobre os impactos e a justiça relativa dos sacrifícios pedidos, bem como de justificar os sucessivos agravamentos na interpretação em concreto das exigências do entendimento. O que teremos a ganhar no futuro com o esforço actual? Como será afectada a nossa competitividade? Em que sectores seremos líderes e quantos novos empregos serão criados se e quando vencermos o Adamastor da dívida soberana? Haverá uma correspondência entre os que agora se sacrificam e os que virão a ganhar com o controlo dos desequilíbrios macroeconómicos? Sem uma resposta a estas questões e uma visão mobilizadora para os sacrifícios pedidos, todos os esforços individuais e colectivos parecerão excessivos e sem sentido para quem os tem que concretizar. É necessário colocar uma luz de orientação no fundo do túnel e essa luz não pode deixar de ser uma ideia forte e motivadora do posicionamento económico e social que ambicionamos para o Portugal do século XXI, na sequência de um bom desempenho na aplicação do Memorando e das políticas que lhe são complementares. Vivemos entre 2005 e 2010 um tempo de propostas claras. A ideia de um Portugal do conhecimento, da tecnologia e da inovação centrada no Plano Tecnológico e nas agendas que se desenvolveram em torno dele, melhorou os nossos indicadores e a base competitiva da nossa economia, mas não foi suficiente para nos imunizar da crise global. O tempo de colher os frutos foi prejudicado por uma forte e inesperada tempestade. O novo governo tem uma nova legitimidade. Pode e deve reorientar a caminhada, mas não pode dar, como tem dado, a ideia de que não sabe para onde vai. A luz ao fundo do túnel sempre foi o melhor tónico para as travessias arriscadas. Precisamos dela. Um Memorando sem luz poderá levar-nos para o abismo. Não podemos correr esse risco.