CARLOS ZORRINHO

CORTA!

Escrevo esta crónica num tempo em que o País está paralisado pelo anúncio em catadupa dos “cortes” que o Governo enumera, na sequência da entrega na Assembleia da República do Orçamento do Estado para 2012 (OE 2012) para atingir os objectivos de consolidação orçamental negociados com as instituições financeiras internacionais. Desde logo a constatação de o País estar paralisado é um péssimo sinal. Neste contexto de emergência nacional, não deveríamos estar paralisados, mas sim mobilizados. O discurso do Governo tem sido, no entanto, tudo menos mobilizador. Convida a baixar os braços e a deixar passar a onda. É do meu ponto de vista um erro tremendo e de consequências imprevisíveis. O deficit orçamental é por natureza um saldo. Precisamos de atingir um ponto de equilíbrio nesse saldo, conseguindo que, em 2012, as despesas não suplantem as receitas em mais de 4,5%. A dúvida não deve estar no saldo (embora a velocidade exigida no ajustamento possa ser questionada) mas no ponto de equilíbrio. O saldo negociado tem que ser atingido em nome da credibilidade. O ponto de equilíbrio tem que ser ambicioso em nome da sustentabilidade e do futuro. Ao promover uma política proactiva de empobrecimento generalizado, o Governo desiste de um país capaz de competir pelo valor e pelo conhecimento. Ajusta-nos aos países mais pobres da União Europeia. Mata a ambição de sermos um dia como a Finlândia e atira-nos para outras companhias que, por elegância e respeito, não nomeio, mas que uma simples análise estatística permite identificar. Lutei, como Coordenador Nacional da Estratégia de Lisboa e do Plano Tecnológico por um Portugal criativo e inovador, capaz de fazer a diferença pela ousadia das soluções, pela liderança de nichos de mercado, pela modernidade combinada com memória e identidade. O esforço conjugado das políticas públicas e da sociedade civil permitiu criar um repositório de competências com grande potencial. Uma rede de pessoas e de empresas acreditaram e investiram num futuro melhor. A agenda Inovação Portugal é o testemunho último dessa vontade colectiva de combater a descrença e fazer a diferença. Nestas circunstâncias, os sinais dados no Orçamento Geral do Estado para 2012 ao carro-vassoura para olhar por nós doem-me particularmente. Sinto-os como um filme de mau gosto. Por isso tomo por momentos o lugar na “realização”, que democraticamente foi ocupado pela maioria que os portugueses escolheram. E tomado esse lugar, desabafo: “Corta!” Assim não vamos lá.