CARLOS ZORRINHO

MUDAR O DESTINO

Na História de Portugal sempre foram muito fortes os mitos de regresso, de que o Sebastianismo é o mais forte exemplo. Regresso sempre marcado pela ideia de que significava a recuperação de uma glória perdida, de uma ambição ou de uma visão que se tinha esfumado pelos caprichos dos acontecimentos. Vivemos hoje um tempo diferente. O mito que agora ilumina quem nos governa é o mito do regresso aos mercados. Para isso enviaram-se descobridores de verbas que as entesouraram a custos elevados e preparam-se folguedos para assinalar o anúncio do descobrimento do caminho financeiro para a sustentabilidade, algures lá para meados da primavera. Nos regressos da História tivemos grandes sucessos e grandes desastres. Não desejo nem auguro que este regresso seja um desastre, mas não posso calar a revolta com a insensibilidade social e falta de visão estratégica com que está a ser preparado. Quando um povo é conduzido a um porto em que se torna mais pobre, menos competitivo, menos qualificado, com menos condições para ser feliz, a viagem que aí o conduz não é uma epopeia. É antes uma capitulação. Precisamos por isso de nos mobilizar para outros combates e para outra forma de regressar, ou, como diria Eduardo Lourenço, de termos saudades do futuro. Temos que ser fortes a marcar uma posição no contexto europeu, exigindo condições razoáveis para pagarmos a nossa dívida e um programa de recuperação que nos compense da asfixia resultante da imposição (consentida e até incentivada pelo Governo em funções) de um programa de ajustamento mal calibrado e que enfraqueceu, sem reestruturar nem requalificar, a nossa economia. Esta mobilização terá um ponto alto nas eleições para o Parlamento Europeu agendadas para 25 de maio. Exorto todos os eleitores a refletirem sobre a enorme importância destas eleições para o futuro de Portugal e para o futuro da União Europeia. Exorto a uma participação massiva e a uma escolha ponderada. A soma das escolhas dos europeus acenderá um sinal verde, um sinal laranja ou um sinal vermelho à continuidade da vacuidade política que vem dilacerando o projeto europeu, capturado por interesses financeiros e sem chama agregadora no horizonte. Afinal o regresso está sempre presente. O regresso aos mercados implica perguntar: a que mercados? Com que solidariedade e suporte europeu? Com que regulação e controlo? Com que Europa e com que instituições europeias? Com que país e com que governo? A resposta depende de cada um de nós. Estamos perante um momento chave na nossa História. Salvar a democracia, usando-a para mudar o destino.