Escrevo esta crónica algumas horas após ter falhado o designado Compromisso de Salvação Nacional e com o País Político suspenso das cenas dos próximos capítulos. Corro assim o risco de as minhas reflexões serem desmentidas pela dinâmica da realidade entre o momento da escrita e o momento da publicação, sobretudo porque o tema que me proponho abordar – o bom senso – tem andado arredio da nossa democracia. O Compromisso de Salvação Nacional, tal como enunciado pelo Presidente da República, tinha um pressuposto – a necessidade de mudança de políticas, tendo em conta os resultados não obtidos pelas políticas em curso e o falhanço reconhecido dessas políticas, notório no quotidiano dos portugueses, nas estatísticas e nas cartas dos ministros de Estado demissionários, quer do irrevogável Vítor Gaspar, quer do revogável Paulo Portas. O Presidente da República estabeleceu três pilares para o acordo. Respeito a sua opção. Do meu ponto de vista, no entanto, o bom senso teria recomendado outra metodologia.Primeiro, a maioria governamental deveria ter reconhecido formalmente o falhanço das suas prioridades e escolhas e aceitar alterá-las. Depois, todos os partidos e organizações que o desejassem deveriam ter celebrado um pacto para a renegociação do modelo de pagamento da dívida. Finalmente, cumpridos estes dois passos, poderia ter sido tentada uma convergência nas prioridades para o crescimento e o emprego. Não foi este o caminho seguido. Em resultado disso não foi possível chegar a um acordo e é fácil perceber porquê. Nos sites do PSD e do PS podem ser consultados os documentos base do diálogo. O PS respondeu ao repto da mudança de políticas e da entrada numa nova fase de aposta no crescimento e no emprego sem pôr em causa o rigor das contas públicas. O PSD tentou amarrar o PS às mesmas políticas de sempre e ao fecho tecnocrático das várias fases do processo de ajustamento, compondo depois esse nó essencial com alguma conversa mole mas inconclusiva sobre economia. Do CDS nada se sabe, a não ser que claudicou nas suas posições em troco da permanência no poder. Seja qual for o resultado imediato deste falhanço de diálogo, continuo a considerar válida a minha perspetiva de bom senso. Poderá já ser uma perspetiva impossível ou ter sido totalmente ultrapassada quando esta crónica for publicada, mas partilho-a com os leitores para memória futura. O caminho dum futuro melhor para Portugal implica três passos. Reconhecimento do falhanço do modelo da espiral recessiva. Renegociação do modelo de pagamento da dívida. Aposta em políticas rigorosas de fomento do crescimento e do emprego. É o que exige o bom senso e que nos deveria fazer convergir.