Quem diria há alguns anos, ou mesmo meses, que as réstias de esperança que ainda vão flamejando na União Europeia no momento em que escrevo este texto seriam provenientes não dos decisores europeus, cada vez mais controlados pela cegueira tecnocrata dos mercados, mas de um Papa que veio de Buenos Aires e que com uma simplicidade desarmante mostrou ao mundo um novo caminho de desapego, humildade e empatia. A partir duma crise financeira iniciada nos Estados Unidos da América, Merkel e os seus seguidores, entre os quais se destacaram sempre na cabeça do pelotão Passos Coelho, Vítor Gaspar e Carlos Moedas, imbuídos dum facciosismo ideológico quase demencial, feriram a identidade humanista e solidária da União Europeia, garante de mais de meio século de integração exemplar à escala global. Será que um Papa não europeu poderá ser o guardião do templo, protegendo a chama da fraternidade e da solidariedade, para a reacender no coração dos europeus e do mundo? Não sei. Talvez estejamos apenas a assistir a um “estado de graça” mais forte do que o habitual. No entanto, só a admissão racional desta hipótese já merece reflexão. É um enorme clarão que contrasta com o cinzento forte que nos chega de Berlim e Bruxelas. A Estratégia de Lisboa, concebida em 2000 na nossa capital, estava inspirada num sonho cosmopolita e na vontade de fazer do modelo social europeu um referencial de sustentabilidade para uma globalização amiga do ambiente, capaz de suster as alterações climáticas e de melhorar a qualidade de vida das populações usando o conhecimento e as novas tecnologias. Passaram apenas 13 anos e desse sonho nada ou quase nada resta. A Europa é hoje um território de recessão e desilusão, comandada pelos mercados, com milhões de desempregados e uma juventude cada vez mais prisioneira duma armadilha que não merecia. Francisco é portador de mais esperança para uma Europa de paz e desenvolvimento do que todos os funcionários das instituições europeias tomadas de assalto pela frieza dos poderosos sem compaixão e treinados para não sentir ou pelo menos para não mostrarem que sentem. Funcionários que deveriam ser políticos e que deixam a revolta política a alguns que sendo funcionários ainda remam contra a maré. Não esperemos de Francisco mais do que ele nos pode dar. Todos conhecemos os trabalhos de Hércules que esperam o novo Papa. A esperança legítima é que os líderes europeus percebam a força que pode ter a liderança quando exercida com convicção, determinação e propósito, e que se inspirem no novo Papa para se despojarem das vestes da submissão, devolvendo a alegria ao povo e o progresso às nações.