OS 75 ANOS DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) foi adotada há 75 anos pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, e pretendia ser um documento fundamental para definição e respeito pelos princípios básicos e universais dos direitos humanos, em resposta às atrocidades cometidas pelos beligerantes da Segunda Guerra Mundial.
À época, a DUDH refletia a vontade do mundo civilizado de evitar que as violações dos direitos humanos voltassem a ocorrer. Até ao momento a sua eficácia ficou-se pelas definições, já que o respeito universal não foi conseguido. Segundo a ONU, estima-se que cerca de 60 milhões (dos quais 40 milhões foram civis e 20 milhões militares) tenham perdido a vida na guerra, devido às perseguições políticas, aos genocídios e à fome e doenças subsequentes.
O Holocausto, que mostrou quão perversa pode ser a mente humana, originou o genocídio de cerca de 6 milhões de judeus, além de um número impreciso de vários milhões de outras vítimas, nomeadamente dissidentes políticos, ciganos, deficientes e homossexuais, bem como vítimas de retaliações pós-guerra.
Na altura admitiu-se que a adoção da DUDH permitiria proteger os direitos fundamentais das pessoas, independentemente de nacionalidade, raça, género, religião, ou qualquer outra característica, pois consagrava que o “reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”, ou que, no limite, iria balizar os princípios dessa dignidade.
Em Portugal a DUDH só foi publicada no Diário da República em 9 de março de 1978, por força de uma disposição da nova Constituição da República Portuguesa que consagrou disposições democráticas e liberdades e direitos individuais que o 25 de Abril veio permitir, sendo que o facto de até então ser matéria incómoda para o regime ditatorial é, por si só, suficientemente significativo.
Padrão internacional
A DUDH contempla 30 artigos que abordam direitos e liberdades fundamentais, incluindo direitos civis, políticos, económicos, sociais e culturais e, pelo menos, tem a virtude de constituir o padrão internacional pelo qual é avaliado o desempenho dos países em relação aos direitos humanos.
Nas últimas décadas deflagraram na Europa, Ásia e Améria Central e do Sul sucessivos conflitos armados originados por razões de natureza política, étnica e religiosa, disputa de territórios e não reconhecimento de fronteiras, narcotráfico, etc., que, no essencial, desrespeitam a Carta das Nações Unidas que data de junho de 1945, atentam e colocam em causa a DUDH e menorizam o papel da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Já muito depois da Guerra do Vietname e dos conflitos coloniais, ocorreram as guerras civis em países como Líbano, Sudão, Ruanda, Bósnia, Croácia, Kosovo e Macedónia, Iémen, República Centro-Africana, Síria, Mianmar, as guerras no Iraque e no Afeganistão e as consequências do seu abandono apressado, as guerrilhas e conflitos em algumas regiões da América Central e do Sul, bem como as violações das ditaduras políticas e religiosas, para compreendermos que as boas intenções nem sempre produzem bons resultados, tal o atropelo que foi e continua a ser feito aos direitos humanos fundamentais.
A par, persiste a postura de países como China, Coreia do Norte, Irão, Arábia Saudita, Federação Russa e uma parte significativa de países que resultaram do desmembramento da URSS e do Bloco conexo, entre muitos outros, em que mulheres e homens têm os seus direitos e liberdades condicionados ou coartados, desde logo o direito ao pensamento, à vida, à liberdade e à segurança pessoal e à não submissão à tortura e a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.
Desrespeito
De nada adiantam as denúncias da Amnistia Internacional, da Human Rights Watch e a atenção das Nações Unidas, nem os apelos dos refugiados e dos que procuram asilo político.
Recentemente, a invasão da Ucrânia pela Federação Russa e o conflito na Faixa de Gaza originado pela retaliação por parte do Estado de Israel a um ignóbil atentado terrorista no seu território, vieram mostrar o desrespeito pelos direitos humanos e, quiçá, pelos acordos de guerra e paz, nomeadamente a Convenção de Genebra, e pior, provocar o enfraquecimento e desrespeito do que poderia ser o último reduto de salvaguarda civilizacional, a Assembleia Geral das Nações Unidas, banalizando-a.
O Conselho de Segurança das Nações Unidas, que na verdade é um órgão ineficiente, é composto por 15 membros, dos quais cinco têm direito de veto, entre os quais a Federação Russa, a China e os EUA, para além da França e Reino Unido, o que significa que nada poderá ser aprovado ou produzir efeitos se algum dos big five se opuser.
Este poder de veto reflete o equilíbrio que existia no final da Segunda Guerra Mundial, quando a Carta da ONU foi elaborada, mas, mesmo correndo-se o risco de poder ser cada vez mais um órgão ineficaz, deveria ser revisitado por forma a que o veto seja uma prerrogativa exclusiva de gente confiável.
Mas na verdade não conseguimos fazer melhor. Continuamos incapazes de combater na origem os movimentos migratórios da América e de África, a que reagimos com repulsa e xenofobia perante aqueles que apenas procuram alimento e uma vida digna que poderiam ter nas suas terras.
Os líderes religiosos e políticos exploram à exaustão as diferenças étnicas, as crenças, e até diferenças entre as mesmas crenças, conduzindo para conflitos e enquadramentos medievais o que deveria ter outras soluções.
Nunca o mundo esteve tão extremado e tão perto de uma catástrofe. Infelizmente serão poucos os que creem que o caminho de saída será pautado por bom senso.