PORTUGAL PODE SER A SOLUÇÃO PARA VACINAÇÃO EUROPEIA – Leio as notícias dos últimos dias. Aflijo-me. A AstraZeneca avisou esta semana que vamos ter perturbações no fornecimento das vacinas à Europa. A Pfizer, no início do mês, já tinha feito soar os alarmes com uma mensagem semelhante.
O programa de imunização da população europeia era ambicioso. Mas não está a correr bem. A gestão das expetativas foi terrível e isso explica o desespero que atinge largas franjas da população quando escalamos o pico da terceira vaga. Há grupos que já falharam o deadline para a segunda toma. Outros não fazem a mínima ideia de quando serão imunizados. Mesmo na minha realidade local, deparo-me com dificuldades tremendas em vacinar os grupos prioritários, como as populações em lares, com mudanças de planos permanentes e com uma imprevisibilidade colossal. As cadeias logísticas globais estão a sofrer um stress tremendo. Em cima disto, as dificuldades de produção e alguns erros de planeamento explicam o que estará a correr mal. O resultado é que todos os países europeus estão a ficar para trás no processo de vacinação quando comparados com o Reino Unido, Israel ou os Estados Unidos. Enquanto Washington já foi capaz de administrar 5,3 doses por 100 habitantes, Berlim, a principal potência europeia, fica-se por umas meras 1,8 doses por 100 habitantes.
É preciso agir. E agir depressa – Quis o destino que Portugal assumisse a Presidência do Conselho nestas circunstâncias dramáticas. Podemos e devemos ser ambiciosos. Portugal deve bater-se, com toda a urgência, por produções descentralizadas da vacina contra a Covid-19. Essa negociação, certamente difícil, terá de ser feita já com as farmacêuticas. O nosso país, por exemplo, tem capacidade instalada mais do que suficiente para começar a produzir vacinas em larga escala. Cascais tem, a título de exemplo, encetado conversações com uma farmacêutica nacional com capacidade de produção de 250 milhões de vacinas por ano. Caso o Governo português conseguisse o licenciamento da Moderna – a vacina da Pfizer tem o desafio suplementar da conservação a 70 graus negativos –, esta farmacêutica nacional poderia arrancar com a produção de dezenas de milhares de doses em semanas. O líder da Organização Mundial de Saúde disse recentemente que estamos à beira de uma catástrofe moral se os países ricos não partilharem as vacinas com os mais pobres.
Este não é um caminho sem retorno – Portugal pode e deve mudar este estado de coisas. Somos conhecidos por termos um peso diplomático superior à nossa dimensão territorial. António Costa tem a presidência rotativa da União Europeia. António Guterres lidera a ONU. Durão Barroso está à frente da Aliança Global para as Vacinas. Este triângulo de influência, bem como a nossa diplomacia e rede económica global, tem de trabalhar com urgência para que o licenciamento da produção descentralizada de vacinas seja uma realidade. Há empresas portuguesas preparadas para avançar para a produção em larga escala. Isso seria bom para Portugal (na frente de saúde pública e na frente económica) e para o mundo – também para os países mais pobres, aproveitando a ligação do nosso país aos continentes africano, asiático e sul-americano. Portugal pode ter a chave para desbloquear o impasse na vacinação. Pode contribuir ativamente para terminar com a catástrofe moral e de saúde pública.
Haja ambição e visão do nosso Governo. Quanto a mim, Cascais esteve e estará sempre do lado da solução.