ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES CIDADES UNIDAS
Cascais recebeu o 10.º Fórum da Aliança das Civilizações das Nações Unidas (UNAOC), de 25 a 27 de novembro, um mês após as Conferências do Estoril. Uso estes dois grandes eventos para sublinhar a abertura de Cascais à promoção do diálogo global e à cooperação entre culturas e nações.
Sob o lema “Unidos na Paz: Restaurando a Confiança, Remodelando o Futuro”, o fórum reuniu membros do Grupo de Amigos da UNAOC, líderes políticos influentes e pensadores para debater questões globais cruciais para a paz e segurança, apelando à restauração da confiança e à união pela paz.
Setenta e nove anos após a fundação da Organização das Nações Unidas (ONU), é impossível não nos inquietarmos com o estado do mundo. Vivemos tempos complexos, marcados pelas alterações climáticas, pelo fanatismo político e religioso, pelo radicalismo nas sociedades ocidentais, pelo conflito israelo-palestiniano, pelo protecionismo económico e pela guerra no coração da Europa. Há dois anos, uma nação livre, soberana e com uma história ancestral foi brutalmente atacada pelo seu poderoso vizinho a Leste.
No Kremlin está alguém que despreza o primado da lei e governa pela força bruta. Este é o exemplo de como um único homem pode semear o mal, o ódio e a escuridão no mundo. Contudo, é igualmente verdade que nenhum tirano dorme em paz, pois em todas as épocas se ergueram as vozes dos homens e mulheres livres. Embora estejamos geograficamente distantes da Ucrânia, nunca deixámos de estar próximos e solidários com o povo ucraniano.
O Presidente russo ambiciona um império, mas os impérios, além de injustos e imorais, estão obsoletos. Foram precisamente as catástrofes dos impérios que levaram à criação da ONU. Seguiu-se então um tempo de afirmação do Estado-nação como unidade política determinante. Porém, este modelo encontra-se desatualizado nos seus princípios e descredibilizado nos seus resultados.
As cidades
Hoje, os estados veem os seus poderes progressivamente diluídos, seja para instituições supranacionais, seja para as cidades. As cidades não são apenas a forma mais antiga de organização política; são as mais bem-sucedidas na gestão dos assuntos dos cidadãos, e têm alcançado uma importância e protagonismo até então reservados aos Estados.
Embora ocupem apenas 1% da superfície terrestre, as cidades concentram 55% da população mundial, produzem 80% do PIB global e são responsáveis por 80% das emissões de carbono. Estes números mostram que o mundo está cada vez mais urbanizado. As cidades são incubadoras de diversidade e talento, lideram o debate pela inclusão e tolerância, e impulsionam a construção de um futuro mais sustentável.
Talvez seja este o momento de repensarmos a organização global. Se a ONU se mostra ineficaz, se os Estados perdem poder para as cidades, e se são os cidadãos que cada vez mais lideram e tomam decisões, talvez seja altura de criarmos a Organização das Cidades Unidas.
Esta iniciativa traria múltiplas vantagens. As cidades são o verdadeiro lar da cidadania, onde homens e mulheres exercem a sua liberdade. São democráticas por natureza, exigindo de todos participação na pólis. São também o berço da inovação e do progresso, liderando os debates sobre as alterações climáticas, a integração de migrantes e o combate à pobreza e exclusão social.
Por fim, as cidades não fazem guerra entre si. Em certo sentido, são agentes de paz.
O leitor poderá pensar que falo em causa própria, afinal sou um autarca a defender a importância das cidades. Mas não me interprete mal: escrevo estas linhas como Presidente de Câmara no meu último mandato, impedido por lei de concorrer a nova eleição.
Líderes do futuro
O que aqui deixo é um contributo para repensar o caminho para os líderes do futuro, inspirado por quem hoje é talvez a maior referência de liderança global, o Papa Francisco.
É essencial que todos os líderes mundiais reconheçam a urgência de repensar a era em que vivemos: Re-Humanizar o mundo com base nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, tornando-o mais justo e humano; Re-Criar uma sociedade fundada na compaixão, justiça social e equilíbrio com a natureza, como defende a encíclica Laudato Si, do Santo Padre, que nos lembra da urgência de cuidar da “nossa casa comum” e da necessidade de uma ecologia integral que proteja o meio ambiente e restaure a dignidade humana.
Encontros como o Fórum Global da UNAOC e as Conferências do Estoril obrigam-nos a elevar o olhar e a ter esperança num futuro melhor. Reforçam a reputação de Cascais como um centro de intercâmbio cultural e intelectual, proporcionando uma oportunidade única de estar ao lado de protagonistas da vida pública internacional, com foco na paz, segurança e restauração da confiança mundial.
De Cascais, continuemos a construir uma herança de liberdade, democracia, humanismo, ação política e profunda convicção no potencial de cada pessoa.