JANEIRO DO NOSSO DESCONTENTAMENTO – Se a nação se olhasse ao espelho, aposto que não ia gostar do que via. Portugal é cada vez mais pequeno, mais pobre e mais periférico. Engolidos por uma marcha de empobrecimento inexorável nos últimos 25 anos, os portugueses sabem que a convergência com os pares europeus ao longo das últimas décadas foi, no máximo, episódica. Preparamo-nos para escolher mais um governo sem que os principais partidos da democracia portuguesa tenham tido a coragem de apresentar ao eleitorado um projeto capaz de mudar para melhor o nosso modo de vida. Portugal sofre de doença prolongada. Mas nenhum dos médicos de serviço se propõe tratar dos verdadeiros males que nos afligem. E que males são esses?
PEQUENEZ – Somos um país a encolher. Portugal é a terceira nação mais envelhecida na Europa e a quinta em todo o mundo. Ao mesmo tempo, somos incapazes de seduzir mão de obra qualificada de outras partes do mundo. A “seca de bebés” terá efeitos devastadores na nossa economia. O mercado interno encolhe e a massa crítica é mais escassa, a classe média menos numerosa e a economia mais engasgada e menos inovadora – já para não falar, sequer, no garrote nas contribuições para o sistema de pensões. Os especialistas dizem que o desenvolvimento económico tem sido o grande contracetivo nas sociedades modernas. Isto é, dizem que há uma correlação direta entre o nível de conforto de uma sociedade e o número de filhos. Há um fundo de razão nesta asserção, mas não há a razão toda. Se assim fosse, Portugal seria a terceira nação mais próspera da Europa e a quinta do mundo – o que, infelizmente, não corresponde à verdade. Ou seja: há razões especificamente nacionais para que os casais portugueses tenham menos filhos, ou não tenham filhos de todo. Ouvimos os debates e lemos os programas dos partidos de Governo e eu pergunto: quantas medidas encontramos para estimular a natalidade? Para emancipar os jovens? Para criar uma rede de creches pública que apoie os pais? Para reconhecer o papel da mulher e o seu direito à maternidade sem penalizações de qualquer género no mundo profissional? Quanta fiscalidade está dirigida ao alívio das nossas famílias? E quantos serviços públicos estão orientados para a excelência, na saúde ou na educação, garantindo que a escolha de ter filhos não tem de ser passada a pente fino por uma folha de Excel?
POBREZA – Para além do inverno demográfico, sem surpresa, Portugal é cada vez mais um país pobre. Em números redondos, há 2 milhões de pessoas em risco de pobreza no nosso país. Cifra que dobraria se o Estado parasse as transferências sociais. Metade do país não desconta um cêntimo de IRS. Não temos nenhuma marca global. Entrámos de braço dado com a Espanha na UE mas hoje estamos mais perto dos mais pobres do que dos remediados. Este é o estado em que estamos quando caminhamos rapidamente para os 40 anos de integração europeia. São números que nos devem levar a uma profunda reflexão. Das duas, uma: eles mostram ou a nossa impotência coletiva ou a nossa displicência perante as oportunidades que teimamos em desperdiçar. O nosso modelo económico falhou. De PS e PSD a única coisa que ouvimos são diferenças de grau e de velocidade na forma como olhamos para as mexidas nos impostos. Um horizonte para o país, uma análise de setores estratégicos, de vantagens competitivas a oferecer ao mundo global e interconectado, a formação de clusters e a correspondente criação de cursos técnicos e superiores que nos preparem para a economia digitalizada: tudo isto é uma miragem.
PERIFERICIDADE – Por estar mais velho e mais pobre, Portugal está mais distante dos centros de decisão e não mostra pedalada para as fortíssimas dinâmicas da quarta revolução industrial. Portugal não tem de ser nem pequeno, nem pobre, nem periférico. Os portugueses já o provaram no passado e provam-no diariamente, em todos os cantos do mundo, que são os melhores dos melhores nas suas atividades. Mas o que falta então para que o coletivo replique o sucesso individual? Citando livremente Charles Dickens, a coisa mais importante para se ter sucesso na vida é deixar de dizer “eu quero fazer” e começar a dizer “eu vou fazer”. Que no dia 31 de janeiro, haja mais quem faça do que quem queira aos comandos do país.