REABERTURA DA ECONOMIA – Resistir para recuperar. Ainda é incerta a magnitude do impacto económico da pandemia COVID-19 na economia. Conduzirá, certamente, em 2020, à maior quebra da atividade económica de que temos memória em Portugal, superando os valores registados em 1975 e, mais recentemente, em 2012. Não é ainda claro se esta quebra será mais ou menos profunda do que a média da União Europeia: se, por um lado, Portugal foi atingido de forma menos intensa em termos de saúde pública e não recorreu a medidas restritivas tão radicais como noutros países, por outro lado o peso na economia dos setores ligados ao turismo, mais severamente afetados, é mais elevado em Portugal do que em muitas outras economias europeias. Mais relevante do que quantificar este impacto inicial é saber qual será o estado das empresas quando a reabertura da economia começar a ser possível e visível. Quantas empresas conseguirão sobreviver? Com que solidez? O que resistirá, em termos da capacidade produtiva a reativar e impulsionar a recuperação? A resposta a estas questões depende, em grande medida, dos apoios que o Estado for capaz de mobilizar e fazer chegar ao terreno. Tenho de reconhecer o esforço do Governo em procurar conceber e implementar, desde o início, em diálogo com as empresas e os seus representantes, medidas no sentido de atenuar o impacto económico da pandemia. Tímidas e desajustadas, num primeiro tempo, estas medidas foram-se adequando, à medida que o Governo foi ouvindo os agentes económicos e se foi apercebendo da realidade.
Apoios disponibilizados – No entanto, também tenho de reconhecer que existe ainda um grande desfasamento entre os apoios disponibilizados e as necessidades e, sobretudo, que ainda persistem, aqui ou ali, disfunções que prejudicam a eficácia e rapidez com que as medidas estão a chegar ao terreno. Quanto aos montantes envolvidos, o Programa de Estabilidade estima a resposta orçamental à pandemia de COVID-19 em 0,9% do PIB por mês e quantifica as restantes medidas de apoio à liquidez sem impacto orçamental em 11,8% do PIB. Refira-se que, nesta avaliação, a rubrica com maior peso consiste nas moratórias de crédito, cujo esforço, em boa verdade, recai sobre o setor financeiro. Ora, estes valores comparam mal com os que estão a ser mobilizados em muitos outros Estados-membros, onde o impulso orçamental imediato associado é significativamente maior. A título de exemplo, em finais de março, esse impulso estava estimado em 4,4% do PIB na Alemanha, 3% na Bélgica e na Polónia, 2% nos Países Baixos e na Grécia. Isto significa que as empresas portuguesas estarão numa posição de fraqueza relativa para enfrentar, no período de recuperação, a concorrência de empresas de outros Estados-membros, que beneficiam de apoios mais robustos.
Endividamento das empresas – O problema, contudo, não se prende apenas com a dimensão dos apoios, mas também com a sua tipologia. Com a exceção do lay-off simplificado, quase todas as medidas tomadas têm em comum o facto de implicarem ou o recurso ao crédito, ou encargos mais pesados num futuro relativamente próximo. Ou seja, o mix de medidas até agora desenhadas pelo Governo concorre largamente para o aumento do endividamento das empresas. Ora as empresas não precisam de mais endividamento, cujo agravamento as colocará numa posição ainda mais frágil, quer em termos de concorrência, quer de vulnerabilidade face a aquisições hostis, por parte dos designados “fundos abutres” ou de empresas (europeias ou de outras geografias). O terreno será propício a quem pretenda comprar ao desbarato o que muito tempo e esforço levou a construir. Por isso, a CIP tem apelado a uma reorientação das medidas de política económica, com um maior recurso a incentivos a fundo perdido e a instrumentos de capitalização das empresas. Surgem, agora, algumas medidas que, embora tímidas, escapam à lógica do endividamento, como os apoios destinados à reconversão para produção de bens destinados ao combate à pandemia ou à cobertura de custos com a adaptação às novas necessidades de proteção da saúde. Mas é preciso mais e melhor para que as empresas resistam e sejam capazes de concorrer com as suas congéneres europeias em pé de igualdade, no fim desta crise. Reconheço que este caminho é exigente do ponto de vista orçamental. Mas, mesmo do ponto de vista da sustentabilidade das finanças públicas, é preferível fazer, agora, um esforço drástico, mas limitado no tempo, do que sofrer, durante anos, as consequências de mais despesa, com desemprego elevado, e menos receita, dada a degradação da base tributária.
Resposta da União Europeia – Espero, da União Europeia, uma resposta que facilite este caminho, garantindo que todos os países europeus – e não só os financeiramente mais sólidos – podem responder a esta crise com força suficiente. Depois de episódios lamentáveis de falta de compreensão do que está em jogo, a União Europeia parece ter começado a trilhar um rumo mais condicente com a natureza e a dimensão dos desafios que enfrenta, num espírito de maior compromisso e união. O Fundo de Recuperação que está a ser preparado poderá, se bem concebido, mobilizar em comum o financiamento necessário e evitar que as vulnerabilidades financeiras de alguns países – incluindo Portugal – agravem desigualdades e divergências no seio da União.
O caminho ainda está apenas no início, mas estou confiante de que os decisores políticos, ao nível europeu e ao nível nacional, estarão à altura das suas responsabilidades e serão capazes de proporcionar às empresas condições que tornem possível uma recuperação rápida e robusta.