NÃO É POSSÍVEL DAR TUDO A TODOS
Em março, escrevi neste espaço que o enquadramento externo hostil em que vivemos torna ainda mais necessária uma política económica que contraponha a uma conjuntura adversa um enquadramento interno mais favorável ao crescimento. O grande desafio que se coloca ao Governo, neste domínio, é o de conciliar políticas públicas mais favoráveis ao aumento da produtividade com a sustentabilidade das finanças públicas, numa dinâmica positiva.
Olhando para o Programa do Governo, constatamos precisamente o reconhecimento expresso de que a manutenção de equilíbrio orçamental tem de estar baseada numa economia com maior produtividade e competitividade, geradora de mais crescimento económico, o que permitirá sustentar uma forte ambição na redução da carga fiscal sobre as famílias e as empresas. Constatamos também o reconhecimento de que a melhoria dos serviços públicos e o equilíbrio orçamental pressupõem uma reforma das finanças públicas e do Estado.
De facto, são estas as duas vias para, simultaneamente, prestar serviços públicos de maior qualidade e reduzir a dívida que deixamos às próximas gerações, sem continuar a sufocar cidadãos e empresas com um peso sempre crescente dos impostos na economia.
Economia mais produtiva
Em primeiro lugar, contribuir para uma economia mais produtiva, capaz de gerar e distribuir mais rendimentos – salários e lucros – que proporcionarão, por sua vez, mais receita pública, com menor esforço fiscal. Para isso, precisamos de um enquadramento mais favorável ao investimento, desde logo no domínio da fiscalidade, mas também no acesso ao capital. Precisamos de mais emprego qualificado. Precisamos de libertar as empresas do excesso de custos de contexto que absorvem muito do seu tempo e dos seus recursos.
Em segundo lugar, cuidar melhor da eficiência e da eficácia com que o Estado gere os seus recursos. Todos teremos exemplos a dar de estruturas que não servem o propósito com que foram criadas, de tempo e trabalho desperdiçado em atividades de utilidade duvidosa, de organização deficiente de serviços, de como seria possível poupar ou utilizar melhor o dinheiro público.
A tarefa a que o Governo se propõe não será, certamente, nem simples nem fácil. A este respeito, o próprio Programa do Governo alerta-nos que o excedente orçamental de 2023 não deve criar falsas ilusões de prosperidade nem alimentar a ideia de que todos os problemas podem ser imediatamente solucionados.
Falsas ilusões
Se falsas ilusões houvesse, os resultados da execução orçamental do primeiro trimestre depressa as teriam desmentido. Ora é precisamente este o ponto que quero aqui realçar: se, de facto, existem muitos grupos sociais com legítimas queixas, nomeadamente grupos profissionais dentro da função pública, mas não só, temos de reconhecer que não é possível dar tudo a todos, de imediato, e satisfazer todas as reivindicações corporativas que se perfilam no horizonte.
Haverá, certamente, inúmeros problemas e injustiças a resolver, mas todos nos lembramos do resultado de políticas irresponsáveis que, sob louváveis propósitos, nos conduziram a uma situação de quase rutura das contas públicas. E todos nos lembramos também das consequências de pôr, depois, toda a prioridade na chamada consolidação orçamental.
Vencer as dificuldades
Defendi, neste espaço, a necessidade de Governo e oposição evitarem situações de instabilidade e incerteza que enfraqueçam, tanto no plano interno como no plano externo, a nossa capacidade de ação para vencer as dificuldades.
Esta responsabilidade não cabe apenas aos políticos, cabe também aos parceiros sociais e a todas as organizações que formam a Sociedade Civil, na sua diversidade, e que interagem entre si e com o poder político.
Ao Governo, que assumiu uma elevada ambição em diversas frentes, cabe agora uma difícil missão, apresentando resultados e sabendo gerir as expectativas que criou sem, no entanto, as defraudar.