ALEXANDRE MESTRE

MEXE-TE PELA TUA SAÚDE … PELO TEU PRAZER … E PELA NOSSA ÉTICA NA VIDA!

O desporto é essencial, porquanto inerente à pessoa humana, ao desenvolvimento do seu corpo, da sua personalidade. Nesse sentido, todos, em particular o Estado, os movimentos associativos, as empresas, as famílias, devem promover, desenvolver, fomentar um “Desporto com Todos e para Todos”.

A nova Lei do Desporto espanhola merece atenção (e porventura réplica) a diversos níveis. Mas detenhamo-nos, aqui e agora, apenas numa expressão que ali é utilizada: o desporto constitui uma “atividade essencial”. Faz-nos recordar uma outra, já abordada nesta revista, que em tempos a legislação francesa acolheu: a de que o desporto deve ser uma “obrigação nacional”. Ousará alguém questionar esta visão? Cremos que não. O consenso é cada vez maior e o próprio Comité Olímpico Internacional reforça na sua Carta Olímpica o reconhecimento do desporto como um direito humano.

Estamos, na verdade, no domínio do óbvio: o desporto é essencial, porquanto ineren- te à pessoa humana, ao desenvolvimento do seu corpo, da sua personalidade. Nesse sentido, todos, em particular o Estado, os movimentos associativos, as empresas, as famílias, devem promover, desenvolver, fo- mentar um “Desporto com Todos e para Todos”. Mas a verdade é que, inexplicavelmente, quando se chega ao concreto surgem as contradições e os paradoxos, provindos de todos os lados.

UM SETOR ESSENCIAL

Quando um governo escala a sua orgânica, o desporto é quase sempre o parente pobre. Pergunta-se: como se justifica não dar um ministério para um setor essencial?! Por outro lado quando um governo define o seu orçamento, o desporto raramente é uma prioridade. Pergunta-se: como se fundamenta não conferir verbas devidas a um setor que se consensualiza ser uma obrigação nacional?

Novo exemplo: quando um governo quantifica o número de horas para Educação Física e o Desporto Escolar, conclui-se, não sem lamento, que não se lhes pode dar mais horas, porque as outras disciplinas e atividades são quase sempre mais relevantes. Afinal onde está aquele fenómeno tão essencial?

Mas não se pense que não devemos também apontar o dedo a nós próprios. Na gestão quotidiana do nosso tempo, que atire a primeira pedra quem nunca relegou o desporto para segundo plano: vou antes almoçar fora, vou antes ao cinema, prefiro antes ficar a ver televisão. Onde está, então, afinal, aquela atividade inerente à pessoa humana, essencial?

Também no plano da nossa gestão financeira, quando há períodos de crise, mas não só, e temos de cortar em algo no nosso orçamento, quantos de nós não prescindimos de imediato do ginásio ou deixamos de pagar a inscrição no clube? Onde está, então aquela atividade de que o corpo não pode prescindir? Mas depois lamentamos, criticamos mesmo, as estatísticas quando apontam para a ilite- racia desportiva, para os baixos índices de prática desportiva. Não faz sentido. Mexamo-nos. Não faltam motivos.

Em Portugal temos apostado muito, e bem, no mote: “Mexa-se, pela sua Saúde!” Em França, discute-se, de momento, o desígnio lançado num livro, por Régis Juanico, chamado Vamo-nos mexer, que sugere que se incremente a literacia desportiva dos cidadãos através da mudança de uma lógica de “Desporto Saúde” para um “Desporto Prazer”. Por conseguinte, o ponteiro vira-se mais agora para um “Mexe-te pelo teu Prazer”.

PELA NOSSA ÉTICA NA VIDA

Será porventura menos sexy, mas creio que há um outro mote (ainda mais coletivo) que nos devia guiar: um “Mexe-te pela Nossa Ética na Vida”. E todos os que me leem antecipam já o que vou dizer: lamentamos cada vez mais a crise de valores da sociedade hodierna. Ora busquemos ou recuperemos esses pilares na prática desportiva. Uma vez mais o óbvio, bem sei: o Desporto é uma escola de vida que permite descobrir os valores essenciais para viver em comunidade, que facilita processos de integração e de desenvolvimento. Ora tal não é imposto, não é ensinado, tem de ser vivenciado, experienciado. Neste sentido, quanto menos prática desportiva houver, menos ética desportiva se propaga, logo menos ética na vida se pode almejar a partir do desporto. Assim sendo, reclamar por mais e melhor ética, no desporto e na vida.

Por conseguinte, também quando lamentamos que há corrupção no desporto e violência associada ao desporto, acrescentando que antes de tudo são um reflexo da sociedade, como que nos desculpando um pouco de o desporto não ser a causa, mas sim algo não imune a esses flagelos, é importante lembrarmos que quanto mais pessoas praticarem desporto, seguramente, teremos pessoas mais leais, mais justas, mais corretas, que cooperam mais, que têm mais propensão a respeitar as regras, e acima de tudo que têm mais tendência a ter respeito pelo próximo. Logo, pessoas menos violentas e menos corruptas. Meditemos no óbvio, evitemos tornar complexo o que é simples, sejamos coerentes connosco próprios (o que pensamos e o que proclamamos) e… toca a mexer!

P.S. A recente discussão em torno do “Caso Rubiales”, bem como antes do tráfico de jovens futebolistas numa academia no Norte do país, ou da violação de direitos humanos no (Mundial do) Catar, tiveram a amplitude que tiveram, projetando-se bem para além do fenómeno desportivo, graças à força (mediática) do desporto. O que evidencia que discutir publicamente, e agir, prevenindo e sancionando condutas sociais antiéticas que surgem também no desporto, é um contributo que (n)o desporto se dá para a Ética Desportiva, em particular, mas é mais do que isso: é um passo de gigante para mais Ética na Vida, de forma geral. Para, passo a passo, a sociedade ir virando de página.

 

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