O PNID: PLANO NACIONAL INVISÍVEL DO DESPORTO – Não obstante o sucesso alcançado nos Jogos Olímpicos de Tóquio, não nos podemos dar por integralmente satisfeitos e devemos querer sempre mais e melhor.
Os Jogos Olímpicos de Tóquio foram, objetivamente, os melhores de sempre ao nível dos resultados da Missão portuguesa. Atletas, treinadores e demais responsáveis estão mesmo de parabéns, merecendo o nosso tributo, a nossa admiração e a nossa gratidão. A todos, na pessoa do timoneiro, o presidente do Comité Olímpico de Portugal, José Manuel Constantino, renovo as minhas felicitações públicas. Foi ímpar!
Não obstante o sucesso alcançado, estou com aqueles que pensam que não nos podemos dar por integralmente satisfeitos e devemos querer sempre mais e melhor. Por isso, todas as reflexões, avaliações e análises prospetivas que se façam serão de aplaudir. Com rigor, profundidade e racionalidade. Para depois legitimarmos novas e realistas ambições. Pelo mesmo motivo, julgo que as críticas em relação ao que se identifique como menos positivo merecem toda a atenção, concordemos mais ou menos com esses pontos de vista. Todos somos poucos para mudarmos o cenário da lamúria e em que se apontam culpados ou bodes expiatórios, para um discurso otimista, vitorioso, de união, de mobilização geral. É neste contexto que, aproveitando o tangível sucesso ora alcançado, entendo ser imperioso e urgente que os responsáveis pelo desporto nacional, do Estado às organizações desportivas, se juntem para projetar um futuro risonho que temos ao nosso alcance, no quadro do modelo corporativo gizado no artigo 79.º da Constituição da República Portuguesa.
DAR CORPO A UM PLANO – Entre muito mais a definir e agir, creio que está na hora de darmos, enfim, corpo a um (verdadeiro) Plano para o Desporto Nacional. Custará assim tanto? Há medo de assumir compromissos? Nunca percebi, aliás, a razão pela qual a vigente Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto (Lei n.º 5/2007, de 16 de janeiro) deixou de fazer referência a um plano desta natureza. Em 1985 (no artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 168/85, de 15 de maio), previa-se o seguinte: “O Estado, através da Secretaria de Estado dos Desportos, elabora e executa um plano de fomento desportivo, integrando as pessoas colectivas de direito público e privado com atribuições no âmbito do desporto, para promover o associativismo desportivo, e o acesso dos cidadãos à prática desportiva.” Depois plasmava-se que tais pessoas coletivas iriam elaborar “(…) os seus planos de desenvolvimento desportivo, de âmbito regional ou nacional, de acordo com as suas finalidades, características e níveis de prática”, tarefa em que o Estado articularia “(…) o plano de desenvolvimento elaborado pelas referidas pessoas coletivas de direito privado para obter a completa utilização dos recursos afetos ao desporto”. Por sua vez, em 1990, no artigo 3.º, n.º 3 da Lei de Bases do Sistema Desportivo (Lei n.º 1/90, de 13 de janeiro), consagrou-se o seguinte: “No quadro da definição e da coordenação da política desportiva, o Governo aprova um programa integrado de desenvolvimento desportivo, de vigência quadrienal, coincidente com o ciclo olímpico.” Por fim, a Lei de Bases do Desporto (Lei n.º 30/2004, de 21 de julho) dedicou um capítulo autónomo ao “Planeamento e financiamento da atividade desportiva”, no qual constava o artigo 64.º, sob a epígrafe “Plano Estratégico de Desenvolvimento Desportivo”, que dispunha conforme segue: “No quadro da definição e da coordenação da política desportiva, o Governo aprova um plano estratégico de desenvolvimento desportivo.” Será a atual omissão legislativa um sinal de desistência ou relativização da parte do Estado? Esperemos que não…
PENSAR O DESPORTO NA SUA AMPLITUDE – Mas com ou sem cobertura legal, o que importa é o que, na prática, se queira e consiga fazer. A meu ver, os programas de Governo, as Grandes Opções do Plano e os orçamentos do Estado têm feito do Desporto um parente pobre, têm-no votado ao ostracismo, ignorado e mesmo desprezado. Não pode ser. E os documentos estratégicos que vão sendo emanados, por melhores e mais bem-intencionados, evidenciam uma lógica de silos, em que se esboça e implementa de forma paralela e nem sequer com coincidência temporal. São documentos que tornam claro que nos falta uma abordagem convergente e integrada, e em que o Desporto seja pensado na sua amplitude. Por exemplo, temos uma Estratégia Nacional para a Promoção da Atividade Física, da Saúde e do Bem-Estar para o horizonte temporal 2016-2025 e um Programa Estratégico do Desporto Escolar 2021-2025, em que não se vislumbram verdadeiras sinergias ou continuidades. E continuamos a não interligar os vários subsetores do desporto, desde a base ao topo, isto é, da fase infantojuvenil ao alto rendimento e seleções nacionais.
METAS, PRIORIDADES, ESTRATÉGIAS – Sou da opinião de que urge um plano em que se defina, para o médio-longo prazo, a implementação de um conjunto de metas, de prioridades, de estratégias para o desenvolvimento do desporto nacional. Não seria a panaceia, mas ajudaria claramente, porquanto o que se faz numa escola ou num clube é o ponto de partida para o que se contabiliza em medalhas e diplomas nuns Jogos Olímpicos, e não nos podemos conformar com o casuístico. É mesmo imperioso um plano que identifique as ações, os objetivos temporais e os atores responsáveis pelo quando e pelo como. E, necessariamente, um plano cuja aplicação, na prática, seja devidamente monitorizada e dotada dos meios humanos e financeiros condicentes, de molde a não passar de boas e bonitas intenções. Se for uma resolução do Conselho de Ministros, que resulte não só de um diálogo interministerial, mas também de um diálogo intenso com o movimento associativo desportivo. Porque isto só lá vai com um documento, senão subscrito, pelo menos consensualizado pelo Estado e (pelo menos) as organizações de cúpula do desporto português.
Para já, infelizmente, esse plano é uma miragem. Um verdadeiro PNID: Plano Nacional Invisível do Desporto. “Bora mudar?”