ADRIANO MOREIRA

SOBRE OS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA. A importância excecional que tem o tema da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, não apenas pela história que não pode ser recebida a benefício de inventário, mas pelo facto de ser um facto único no desfazer do Império Euromundista, nem sempre é objeto dos cuidados e atenções a que todos os participantes se obrigaram com espírito não apenas jurídico, mas também de futuro participado. Entre as muitas manifestações dessa atitude, que não podem ser esquecidas, é justo registar a segunda edição do Novo Atlas da Língua Portuguesa, que se fica a dever a Luís Antero Reto, Fernando Luís Machado e José Paulo Esperança. Uma segunda edição da Imprensa Nacional – Casa da Moeda, cujos autores não desanimaram com a dificuldade de terem atualizado o retrato económico-financeiro dos países de língua portuguesa, porque apenas “uma pequena parte dos dados necessários para o efeito foram atualizados nas bases de intervenção utilizadas”. Todavia, isso não diminui o valor da contribuição que a obra presta nas áreas “do crescimento do ensino, dos falantes e do uso escrito do português no mundo”. Sobretudo tendo presente o crescente enfraquecimento dos recursos destinados às humanidades, é de maior utilidade, para a dimensão de Portugal no mundo global que enfrenta com tantos sacrifícios internos, evidenciar: a História e o Futuro da Língua Portuguesa; Geografia e Demografia da Língua Portuguesa; o Ensino do Português no Mundo; a Posição Geoestratégica e Expressão Económica dos Países de Língua Portuguesa; o Português, Língua de Negócios; a Língua Portuguesa e a Mobilidade Humana; a Língua como Património Comum, Unidade e Diversidade; Cultura, Artes e Ciência; Personalidades dos Países de Língua Portuguesa; a Língua Portuguesa na Net.

A questão que tanto divide os cultores da língua, que tem como centro de discórdia o Acordo Ortográfico, encontra neste excelente trabalho, feito de amor à ciência e aos interesses nacionais, uma forma delicada de acentuar que “a língua não é nossa, também é nossa”. É muito clara a afirmação da evidência esquecida, nas seguintes palavras de Augusto Santos Silva: “a língua portuguesa é a única língua materna de muitos milhões de pessoas, na Europa, em África, ou na América. É língua segunda para um número considerável de outros falantes, por exemplo em Cabo Verde ou Timor Leste. Em países como Angola ou Moçambique funciona como a língua nacional em que convergem falantes com muitas línguas maternas, algumas dificilmente comunicáveis entre si. Na diáspora, o português representa a língua materna de toda a primeira geração e de parte da segunda geração de emigrantes, mas também é chamada língua de herança, cuja aprendizagem não apenas facilita a comunicação entre gerações, mas também, e sobretudo, assegura a ligação simbólica, afetiva e prática entre a comunidade vivendo no estrangeiro e a sua terra de origem, assim cumprindo uma função identitária e integradora de maior relevância”. É difícil organizar uma argumentação mais expressiva e convincente do interesse humano em geral, e nacional em particular, deste trabalho que enriquece o património imaterial português. Lembrar apenas que, em vista das várias latitudes, etnias, e culturas que abrange, também nessa trajetória multiplica, conforme as latitudes, valores privativos que não são pertença de outras comunidades com distâncias, não apenas geográficas ou étnicas, mas culturais. E por isso a língua não é facilmente obediente a reivindicações nacionalistas, a tratados internacionais. A sua capacidade de exprimir o real diferente é ilimitada, é dificilmente reprimível. Mas é um valor que nenhuma comunidade que a tenha adotado pode abandonar. Não apenas a língua, mas o interesse nacional, fica devedor aos autores deste oportuno e valioso trabalho.

É sempre oportuno recordar que, do Império Euromundista, que incluiu a Holanda, a França, a Bélgica, o Reino Unido e Portugal, todos sofrendo combates militares penosos, apenas Portugal conseguiu a convergência de todas as antigas colónias numa organização – CPLP – solidarizada em primeiro lugar pela língua. Apoio de outras solidariedades, científicas, culturais, económicas e de segurança, que não devem ser esquecidas no projeto de futuro.

Na diáspora, o português representa a língua materna de toda a primeira geração e de par te da segunda geração”

Adriano Moreira – Presidente do Instituto de Altos Estudos da Academia das Ciências/Professor Emérito da Universidade Técnica de Lisboa