O CHUMBO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E A CONVERGÊNCIA DAS PENSÕES
Não é frequente que os 13 juízes do Tribunal Constitucional se ponham de acordo, incondicionalmente, para declarar a inconstitucionalidade de normas do Orçamento do Estado que previam, tendo por objetivo a convergência dos sistemas de pensões, uma redução em 10% nas pensões de aposentação, reforma e invalidez de valor ilíquido mensal superior a 600 euros. Este pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade foi feito pelo Presidente da República, cuja tese essencial se centrou na ideia de que esta redução se configurava como um imposto especial que, em cumulação com o IRS, se dirigia a uma categoria específica de pessoas e que, por isso, feria o princípio da igualdade e o caráter universal e progressivo do imposto sobre o rendimento. O Tribunal Constitucional rejeitou esta tese e, pedagogicamente, considerou que as normas em causa não relevavam do direito fiscal, mas sim do direito da segurança social previsto no artigo 63.º, n.º 3 da Constituição, aproveitando para fazer o histórico da evolução da ideia de um sistema de segurança social unitário, recensão muito útil e que nos leva a compreender melhor a sustentabilidade, ou a falta dela, do atual sistema previdencial público e da justiça intergeracional. Considerou o Tribunal Constitucional que quando o legislador ordinário concretiza aquelas disposições perde margem de manobra para um eventual retrocesso social que, em qualquer caso, tem de ser sempre visto como necessário, adequado e proporcional. Contudo, o argumento essencial do Tribunal centrou-se no princípio da proteção da confiança, previsto no artigo 2.º da Constituição, onde ponderou, por um lado, os direitos e legítimas expetativas dos pensionistas e, por outro, a salvaguarda do interesse público. Se é certo que constitucionalmente se tutela o direito à pensão, e não a um certo montante pecuniário de pensão, o que é facto é que se tratava de medidas avulsas e inadequadas à realização da sua convergência e apenas visavam a consolidação orçamental pelo lado da despesa. Estas medidas propostas pela maioria governamental na Assembleia da República foram consideradas como afetando planos de vida do segmento mais vulnerável da população portuguesa, pela fraca capacidade de gerar outros rendimentos que colmatassem estes cortes, até por se encontrarem já no ocaso da vida, afetando legítimas expetativas e sendo, por isso, inadmissíveis, arbitrárias e demasiado onerosas, não podendo prevalecer sobre o invocado interesse público. Porém, a estocada final do Tribunal referiu-se ao facto de o diploma invocar na exposição de motivos que as medidas eram estruturais e visavam contribuir para a reforma do sistema, o que estava claramente em contradição com o facto de as normas questionadas se intitularem de temporárias e com vigência transitória. Em suma, um acórdão que ficará nos anais da história constitucional e que é um elemento fundamental de compreensão dos inúmeros conflitos de interesses com que, atualmente, se debate a sociedade portuguesa.