A agricultura, o equilíbrio com a natureza e um caminho de sustentabilidade são alguns dos pontos-chave que movem o enólogo Anselmo Mendes, um verdadeiro apaixonado pela vinha e pelo vinho.
Quem é Anselmo Mendes?
Produtor de vinhos, as suas vinhas situam-se em Monção e Melgaço numa área de mais de 50 , com predominância da casta Alvarinho. Ainda explora 70 ha de vinhas com predominância da casta Loureiro, no Vale do Lima, em seis quintas. Tem a sua adega em Melgaço e exporta para 48 países grande parte da sua produção. Estudou Agronomia, em Lisboa, e Enologia, em pós-graduação da Universidade Católica do Porto. Foi consultor em várias regiões vitícolas portuguesas até 2020, com vários reconhecimentos à sua carreira: Enólogo do Ano em 1998; Produtor do Ano em 2010 e Senhor doVinho em 2020. Dirige a empresa Anselmo Mendes Vinhos, com 25 colaboradores, e brevemente vai abrir o Enoturismo Anselmo Mendes, na Quinta da Torre, em Monção.
Agricultura e Enologia
Desde muito jovem que o hoje enólogo Anselmo Mendes tinha o sonho de ser agricultor, e foi através desse sonho que chegou ao mundo dos vinhos. Iniciou carreira como agrónomo e logo de seguida percebeu que seu caminho era a enologia. Hoje, conjuga as três funções de agricultor, agrónomo e enólogo e ainda tenta ser gestor. E confessa-nos que o negócio do vinho tem sucesso somente quando há equilíbrio entre a razão e a paixão. Conta-nos que às vezes pensa que não seria capaz de sobreviver sem o vinho, e que em certa medida é a verdade, mas em última instância seria agricultor (confessando que tem um fraquinho pela economia). Com um projeto que se expande pelo mundo, uma marca posicionada a nível nacional e especialmente internacional, o enólogo sente-se reconhecido em Portugal e em muitos outros países. Focado em gerir o seu negócio, sente que a sua missão passa por ser um embaixador do seu país e contribuir para uma maior notoriedade dos vinhos portugueses. O seu trabalho evidencia e abrange cinco regiões vinícolas. Questionado sobre qual a particularidade de cada uma e o que o leva a explorá-la, o enólogo explica que, apesar de hoje em dia se dedicar exclusivamente aos seus vinhos, durante muitos anos desenvolveu projetos no Douro uma região com elevada diversidade, onde os tintos complexos e profundos atingem classe mundial. Na Bairrada conheceu e trabalhou com uma das castas mais desafiantes do mundo, a Baga, capaz do melhor e do pior. Os seus vinhos são eternos na longevidade. A Beira Interior tem elevado potencial, mas ainda não encontrou o seu caminho. As castas Rufete e Síria fazem a diferença. Lisboa cria brancos frescos e ecléticos perto do Atlântico. Os tintos têm alguma rusticidade atenuada por tecnologias adequadas. No Alentejo aprendeu que o conceito de terroir é adequado a uma região que, injustamente e de uma forma simplória, dizem ser homogénea, quanto aos vinhos aí a diferenciação é enorme. Nos Açores a viticultura é heróica e os seus vinhos brancos são desconcertantes, exprimindo o território.
Alvarinho
Se uma casta e um vinho refletissem a personalidade do enólogo, a casta seria sem dúvida aquela sobre a qual assume ter mais conhecimento e ainda continua a estudar, a Alvarinho. E o vinho – como seria de esperar, totalmente 100% Alvarinho –, que resulta das suas experiências de fermentação em madeira conjuntamente com o estudo de parcelas e solos, seria o Parcela Única.
Sendo pioneiro a fazer experiências com a casta Alvarinho, o enólogo explicou que o que o levou a estudar o vinho Alvarinho com tanta intensidade foi, desde muito jovem, a sua curiosidade e paixão pela agricultura, em geral pelas plantas, mas em particular por esta casta.
É a sua paixão pela agricultura que o leva a implementar no seu trabalho métodos de sustentabilidade, para que essa regra seja o caminho para o futuro. O enólogo acredita que o caminho da sustentabilidade é uma forma de estar em equilíbrio com a natureza, apresentando-nos o conceito e de como já o implementa na sua empresa, começando por explicar que a sustentabilidade tem três vertentes – ambiental, económica e social – que funcionam em equilíbrio. Por exemplo, quer o arrelvamento das vinhas, contribuindo para a biodiversidade dos solos, quer a eficácia hídrica nos primeiros anos de vida da planta, com vista a poupar água no futuro, são algumas das medidas que já tomam. Na adega usam quase 50% de energias renováveis e caminham para depender 100% da água da chuva.
Futuro
O enólogo considera que Portugal fez uma revolução no vinho em pouco mais de 30 anos e que se sente parte dessa revolução, acreditando que ainda vai melhorar. Portugal tem esse potencial e capacidade. Essa evolução passa por explorar melhor as castas autóctones, melhorar a biodiversidade dos solos vitícolas, fazer vinhos que expressem genuinamente o local de origem e serem fortes e convictos na sua promoção. E que o segredo do vinho português é a escassez. Outro segredo é sabê-la gerir.
Sobre a oportunidade de um dia acordar e conseguir configurar à sua medida o mundo “perfeito” da enologia e da viticultura, o enólogo respondeu-nos: “O mundo perfeito da enologia e da viticultura é trabalhar muito em prol da notoriedade do vinho português, que permita uma vida feliz aos viticultores e todos os que trabalham na fileira do vinho. E que estes sejam generosos e pensem que neste negócio o fator tempo é determinante, ou melhor dizendo, que pensem nas gerações futuras sem egoísmo.”
Para terminar, mas não menos importante, pedimos ao enólogo para partilhar o que lhe falta fazer ou alcançar, ao que nos responde que lhe falta estudar melhor as suas vinhas para, consequentemente, melhorar os seus vinhos e conseguir produzir outros de maior valor acrescentado. Falta-lhe ver o seu país no topo do mundo dos vinhos. Para concluir, acrescentou que pode, podemos todos nós, ter negócios rentáveis, mas só seremos verdadeiramente felizes quando os outros reconhecem e nós mesmos reconhecemos que fizemos algo pelo coletivo.