ISABEL MEIRELLES

feira-de-emprego-na-europa-intercambio-press-abroadNA LINHA DA FRENTE

A União Europeia, com as suas incertezas e derivas, foi particularmente escrutinada em termos de Brexit, Eurexit e outras eventuais saídas desagregadoras das teorias dos projetistas da paz que os cidadãos devem acompanhar e vigiar, não vá dar-se o caso de se facilitar o imprevisto que sempre aguarda oportunidades.

O Brexit foi especulado e observado nas suas negociações/imposições que se centram, no essencial, em questões económicas e financeiras, na competitividade, na livre circulação de trabalhadores comunitários e extracomunitários, que têm como pano de fundo a recuperação da soberania, no sentido de evitar, nomeadamente, que os bancos e as instituições financeiras britânicas sejam controlados no âmbito da União Bancária, de que a City não seja afetada por um reforço do euro e por alterações na regulação financeira e que se evite o pagamento de quaisquer medidas de resgate de instituições ligadas ao euro. Daí que se tenha escrito também sobre a necessidade de uma estratégia europeia de que Juncker foi depositário, mas que não conseguiu implementar, fruto do crescimento da intergovernamentalidade e do poder dos Estados. Contudo, foi referenciada a Agenda da Energia e a Agenda Digital, bem como a nova geração de líderes digitais, em que os dados são o novo petróleo deste ciclo, têm ajudado à competitividade e a garantir um melhor acesso dos consumidores e das empresas em toda a União Europeia, com proveitos para todos os envolvidos. Porém, nada disto tem evitado o galopar dos populismos, que devido à fraca perceção dos fatores positivos da União aproveitam o sistema democrático, capitalizando os descontentamentos dos eleitores, designadamente na Holanda e na França, onde, por isso, as eleições foram e são seguidas com uma especial preocupação. Aliás, o detonador destes populismos foi em muito a crise migratória e dos refugiados, bastante analisada por ter provocado brechas profundas na coesão europeia face a uma Turquia cada vez mais instável, depois de uma tentativa falhada de golpe de Estado militar, seguida de uma purga e de um quase redesenhar da máquina do Estado, com a finalidade da instauração de um regime presidencialista em que Erdogan congregue também o poder executivo.

O caso da Turquianaom_5077dfac6f25d

Considerando que a Turquia é, ainda, candidata a Estado-membro da União Europeia, pertence à Nato e é um verdadeiro tampão para a Europa no que diz respeito a todos os conflitos do Médio Oriente e ao mais recente fenómeno das pressões migratórias, é preocupante a sua instabilidade interna comprometida com aquilo que parece ser uma deriva autoritária, securitária e islamizadora, apostada em enterrar os princípios básicos fundadores da laicidade de Ataturk e da Turquia moderna. Contudo, o relevo das questões internacionais também se estendeu ao outro lado do Atlântico, com a eleição de Trump, que fez despertar uma América que vive muito do debate da opinião pública e que vai ter consequências, desde logo, no reordenar das correntes políticas do Partido Democrata, mas também Republicano, dado que este presidente sintetiza um novo agregado político-ideológico. Estamos perante um novo chamamento aos valores da pátria, ao orgulhosamente nós e a um fechamento em relação ao mundo exterior, em detração da cooperação geralmente pródiga feita até agora com países terceiros em quase todos os domínios, mais expressivamente na área comercial, económica e de segurança e de defesa. Assim, a União Europeia terá de começar a pensar em independentizar-se e a prover à sua autossuficiência, não só no domínio comercial como no da segurança e defesa, porque o atual presidente já afirmou não querer que a América continue a ser o polícia do mundo, o que, com Trump back to business, põe em causa a própria estrutura e sustentabilidade da NATO. Também no continente americano a Venezuela começa a ser considerada um dos países mais inseguros do mundo, em que já não se rouba para comer, mas se mata para não morrer à fome, e é o modelo de tudo aquilo que um Estado não deve ser, com paradigmas económicos errados, gastos governamentais fora de controlo, elevados níveis de corrupção e de nepotismo e graus de insegurança absolutamente inimagináveis.

naom_577e86f0e3ff4Pelo mundo

Mas nem tudo o que aconteceu no mundo este ano foi preocupante. Com grande orgulho de todos os portugueses e a elevar mais alto o nome de Portugal, António Guterres ascende ao cargo máximo das Nações Unidas como o novo secretário-geral e chega ao topo do mundo, embora as missões que o esperam sejam titânicas, dadas as suas dimensões e a incapacidade de gestão dos conflitos pelas partes envolvidas. As expetativas sobre António Guterres são muito altas, mas há que reconhecer que este não tem uma varinha de condão nem é o feiticeiro de Oz, embora o seu método de eleição, a sua experiência e habilidades diplomáticas, reanimem a esperança da ONU de recuperar presença e resposta. Exprimo nesta súmula as minhas congratulações à revista FRONTLINE pela acutilante perceção da importância das questões internacionais, que acolhe em cada edição, o que confere aos conteúdos uma qualidade acrescida. A FRONTLINE continua a fazer, ao longo deste último ano, jus à sua designação, designadamente em matéria de assuntos internacionais, questão tantas vezes negligenciada, mas essencial para compreender o mundo globalizado, os temas europeus e, em especial, os acontecimentos recentes no nosso país. Parabéns também à respetiva equipa, com os desejos de que contem muitos anos de tiragem.