DIABETES: A DOENÇA INVISÍVEL
Muito se fala hoje na diabetes. As estatísticas publicadas anualmente pelo Observatório Nacional da Diabetes relatam a ascensão de uma epidemia que atinge cada vez mais pessoas e cada vez mais precocemente.
A diabetes é como um incêndio descontrolado que arrasa este país e o mundo. Em Portugal os números são alarmantes, pois todos os dias cerca de 200 pessoas ficam a saber que têm diabetes, 22 pessoas com diabetes têm um AVC, três a quatro pessoas sofrem uma amputação, 12 pessoas morrem por diabetes, cerca de 500 pessoas com diabetes são internadas e cinco pessoas saem de internamentos motivados por pé diabético. Muito se fala hoje na diabetes. Todavia, a diabetes é uma doença que continua a ser desvalorizada em várias frentes. Desvalorizada pelas próprias pessoas que a têm e a conhecem, pelos profissionais de saúde, pela comunidade e pelos decisores políticos. É uma doença silenciosa e silenciada, pois não tem a mesma atenção e o mesmo impacto na sociedade que outras doenças como o VIH ou a tuberculose, que, juntas, matam cerca de 3 milhões de pessoas por ano em todo o mundo. Só a diabetes mata 5 milhões de pessoas por ano no mundo, segundo dados da Federação Internacional da Diabetes.
Uma doença exigente
A diabetes pode ser exigente e implica alguma complexidade na sua gestão diária, como, por exemplo, o controlo da glicemia, a perda de peso, a manutenção da atividade física, a toma regular da medicação, o autocontrolo e os cuidados aos pés. Na doença crónica, como é o caso da diabetes, é a pessoa que tem de aprender a cuidar de si. O profissional de saúde é aqui um educador, que educa a pessoa a viver diariamente com a doença. Quantas pessoas com diabetes tipo 2 escolhem tornar-se invisíveis porque se sentem fracassados e frustrados durante o confronto de uma visita ao gabinete médico, sabendo que os valores de glucose no sangue estão ainda pouco controlados, o seu peso ainda não mudou e pouco ou nenhum esforço foi feito para fazer dieta ou exercício físico, ou cuidar dos pés? Quantas pessoas param de tomar a medicação prescrita após 6 a 12 meses, perdendo muito dos seus benefícios, e quantas vezes abandonam as consultas? É fácil criticar estas pessoas esperando que isso melhore o seu controlo. Mas quantas vezes é que os profissionais de saúde despendem o tempo necessário para ouvir e conhecer as principais razões pelas quais as pessoas não conseguem controlar a diabetes? A educação é fundamental e tem de ser uma prática real e efetiva.
Mais visibilidade
É preciso dar visibilidade à diabetes para que ganhe impacto junto do público e da comunidade médica. Imagine-se um mundo onde nenhuma criança é internada por descompensação diabética, onde acabamos com o estigma e o julgamento às pessoas com diabetes tipo 2, onde as amputações são limitadas a um número irrisório de casos, e onde estamos efetivamente a ajudá-las a conseguir um controlo eficaz e prolongado. A quatro anos das comemorações dos 100 anos da descoberta da insulina, recorde-se o que já em 1925 dizia Pulido Valente: “Mais do que em qualquer outra doença o médico será aqui educador. A sua função é menos tratar o doente do que ensiná-lo a tratar-se ele próprio.” Pulido Valente foi influenciado por Ernesto Roma que, depois de conhecer o milagre da insulina nos EUA, a trouxe para Portugal e fundou a Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal, instituição que até hoje mantém alta a bandeira de respeito pelas pessoas com diabetes e de defesa da sua autonomia e integração social. Temos de saber defender e exigir tratamentos melhores e mais em conta, maior apoio aos cuidadores, uma vida com mais qualidade e mais longa, menos amputações, menos úlceras do pé, menos infartos em adultos jovens, menos IRC, menos ambliopia… Estes são alguns dos muitos desafios que se colocam hoje na luta contra a diabetes.