Com um percurso profissional invejável e tendo já desempenhado funções em vários hotéis da cadeia internacional Starwood Hotels & Resorts, Francisco Nogueira de Sousa é o diretor-geral para a região de Lisboa do Grupo Hotéis Real e ainda para as áreas comercial, de marketing, revenue management e E-commerce para todo o grupo. Foi em 2009 que integrou o Grupo Hotéis Real, enquanto diretor do Grande Real Villa Itália Hotel & Spa, um Leading Hotel of the World, tendo vivido um dos maiores desafios profissionais da sua vida: mobilizar um conjunto de equipas para um sentimento urgente de mudança. Hoje, Francisco Nogueira de Sousa partilha connosco a sua história de sucesso.
Como descreve o Grupo Hotéis Real? E particularmente o Grande Real Villa Itália Hotel & Spa?
O Grupo Hotéis Real é composto por nove hotéis, cinco em Lisboa e quatro no Algarve. A sua primeira unidade foi o Hotel Real Parque, que abriu em Lisboa, em 1994, sendo inicialmente um hotel isolado. Desde então, ao longo de 18 anos, o Grupo Hotéis Real teve um crescimento notável, com as unidades distribuídas pelas regiões de Lisboa e Algarve. Os Hotéis Real destacam-se pela capacidade de adaptação a múltiplas ocasiões, diversidade e flexibilidade de oferta de serviços, respondendo a diferentes necessidades do mercado. O Grande Real Villa Itália Hotel & Spa, localizado em Cascais, foi a mais ambiciosa aposta do grupo. O projeto contemplou o edifício das antigas residências do rei Humberto II de Itália e da família Pinto Basto, sendo-lhe, então, atribuída uma forte componente histórica. O investimento representava o sonho do fundador do grupo, Bernardino Gomes, tendo o hotel sido construído com base nos mais elevados standards de infraestruturas, condições e serviços. O objetivo, que se pode dizer que foi atingido, foi a edificação de um produto que impressiona todos os que por cá passam. Desde a receção até aos quartos, passando pelos restaurantes e pelas áreas de lazer, tudo se traduz numa experiência única e de constante interatividade com o cliente.
Qual foi o primeiro passo ao chegar ao Villa itália?
Quando cheguei ao Grande Real Villa Itália, apesar das excelentes condições do produto, os resultados não eram os mais positivos. O produto tinha de evoluir, mantendo como pilar a qualidade e o posicionamento, mas respondendo à evolução das necessidades do cliente e do mercado. Era clara a necessidade de começar a criar nas equipas um sentimento urgente de mudança. Tinha, contudo, a certeza de que o grau de resistência ia ser muito elevado. Na generalidade, todos nós temos receio de mudar, e esse receio torna-se maior quando temos de acreditar em alguém que não conhecemos. Ninguém me conhecia, quer pessoal quer profissionalmente. A minha primeira aposta foi ganhar a confiança das equipas, e para mim isso só é possível quando tratamos todas as pessoas de igual forma, quando explicamos a todos a causas das coisas, quando coordenamos as equipas e quando somos exigentes com os outros e, principalmente, connosco. Com o objetivo de alcançar um conhecimento mais profundo da situação e de envolver os principais intervenientes, reuni-me com os diretores de cada departamento, mostrando-lhes toda a informação que tinha recolhido através de uma análise financeira que comprovava que o modelo de negócio a adotar teria de ser outro. A recetividade é diferente quando expomos de uma forma clara e objetiva em que situação nos encontramos. Inevitavelmente, cada um tira as suas próprias conclusões. Este primeiro passo foi essencial para a partilha de uma visão comum: transformar o Grande Real Villa Itália não apenas num dos melhores produtos nacionais, mas numa referência de gestão e numa história de crescimento do qual todos fariam parte e com o qual todos beneficiariam. Desde a definição de objetivos por departamento à responsabilização dos líderes de cada área, atribuindo grande importância a fatores relacionais entre departamentos, começava a vislumbrar-se a vontade generalizada de mudança.
Numa fase inicial, como se dirige um processo de mudança?
Quando dirigimos um processo de mudança, não podemos ter apenas em vista uma definição de objetivos concretos, mas também a forma de os atingir. Se a rentabilidade e o aumento de receitas são o objetivo final, tornou-se evidente que a forma de o atingir passaria por duas estratégias complementares: por um lado, uma resposta mais eficaz à evolução do mercado e às necessidades dos clientes; por outro, a redução e otimização de custos. O cliente passou a surgir no centro das preocupações de todas as equipas, numa ótica de busca proativa do reconhecimento das necessidades. Simultaneamente, otimizaram-se os recursos do hotel, o que passou por um modelo de gestão simplificado, que relacionava a procura existente, gerando forecasts de receitas e custos em função da ocupação.
Como estendeu essa nova visão por toda a estrutura da organização?
O desafio foi ainda maior do que julgava, se pensarmos que um hotel tem uma diversidade de serviços complementares e interdependentes. Todos têm de saber atuar sob as mesmas diretrizes, caso contrário o cliente sairá com expetativas defraudadas. Aqui, é de destacar o excelente desempenho das chefias de cada departamento. Foram elas que passaram essa nova visão através da partilha e envolvimento de todos os colaboradores. Foram delegadas funções individualizadas e por núcleos de atuação, com um grau de autonomia que se refletiu numa maior responsabilização de cada um, individualmente e no seu todo. Todos tomaram consciência de que trabalhavam numa organização prestadora de serviços e que o cumprimento de responsabilidades se refletia no desempenho de funções de outros colegas ou departamentos e, consequentemente, no serviço. As equipas aprenderam a trabalhar em conjunto com os diferentes departamentos da unidade e externos, com um objetivo comum: responder às necessidades dos clientes para atingir resultados. Os primeiros sucessos foram ilustrativos para esse objetivo. O produto foi alterado para ir ao encontro das necessidades do cliente e, consequentemente, os resultados aumentaram. Os colaboradores conseguiram identificar a diferença entre o que era executado antes do novo modelo de gestão e depois da implementação do mesmo, ganhando motivação para a continuidade do processo. Ao mesmo tempo que a mudança decorria no hotel, os serviços de marketing e vendas do grupo adaptavam-se a uma nova gestão, com vista a atingir resultados para todas as unidades, entre as quais o Grande Real Villa Itália. Apostou-se na centralização de estruturas, com o grande objetivo de criar novos processos que contribuíssem para um aumento de receitas e de clientes nos hotéis. Esta centralização permitiu um maior enriquecimento dos recursos humanos proporcionado pela partilha de experiências, uma maior rapidez de resposta aos pedidos, visto que a equipa estava concentrada num só local, a identificação de opor tunidades de negócio já existentes, mas que não eram percetíveis em departamentos que se encontravam divididos, e um conhecimento cada vez mais profundo do cliente.
Houve grandes alterações na estratégia comercial?
A nível comercial, tudo passou por um plano de promoção que visava novos mercados e canais com o objetivo de recrutar novos clientes. Para melhor definirmos a estratégia de vendas, procedemos à segmentação dos diferentes canais de distribuição, fazendo uma forte aposta nos parceiros online. Explorámos diferentes mercados, trabalhando em diferentes áreas de negócio. Os preços praticados também mudaram. Fizemos uma análise de mercado e concorrência, e o preço médio de alojamento praticado foi reduzido, sendo mais flexível de acordo com o forecast. Na área de restauração e spa, os preços foram revistos tendo em conta o mercado e feedback dos clientes. Todas estas alterações inverteram a tendência de queda de receitas sentida nos últimos anos.
Podemos falar de um caso de sucesso?
Quantitativamente, os resultados foram comprovativos do sucesso do novo modelo de gestão implementado. Na receita total houve um crescimento acima de 22% em dois anos, sendo que o REVPAR (receita por quarto) teve uma subida de 32%. Os questionários de satisfação demonstraram o crescimento dos níveis de serviço num período de aumento das taxas de ocupação (variação de 68%), o que significa que aumentámos a qualidade de serviço, num período com muito mais hóspedes. Isto implicou um esforço e coordenação a nível operacional muito elevado. Basicamente, as alterações efetuadas recrutaram novos clientes, respondendo, assim, ao mercado, mantendo-se os níveis de satisfação global. Quanto às equipas, julgo que qualquer ser humano gosta de fazer parte de uma equipa vencedora, todos querem ser do clube que ganha, sendo mais ou menos teimoso. Nada teria tido sucesso se não fosse acompanhado por satisfação do cliente, resultados financeiros e o apoio de todos.
Ao nível da estratégia de marketing, quais foram os primeiros impactos?
A estratégia passou por um reposicionamento do produto e por alterações nas ofertas ao cliente, quer na forma como o abordamos, onde passámos a apostar em ofertas e promoções diferenciadoras no mercado, quer na forma como o servimos quando está connosco. Aos olhos do cliente, o primeiro impacto foi a abordagem de um serviço menos formal que, mantendo os mais elevados standards, se tornou mais acolhedor. Quanto ao produto em si, tentámos, essencialmente, potenciar as características do hotel, bem como da região em que está inserido, apostando nos vários serviços que temos para oferecer, sejam eles alojamento, reuniões de empresa, restauração, spa e eventos, como casamentos ou outros. Independentemente do tipo de atividade de que falemos, uma coisa é comum: tentamos sempre viver a nossa portugalidade, apostando e promovendo produtos portugueses. Um bom exemplo é o spa, que promove uma série de tratamentos, entre os quais tratamentos de assinatura com produtos regionais. Por exemplo, o La Terraza nasce numa conversa descontraída, onde procurávamos um conceito menos formal do que o Belvedere. Passados alguns dias de levantamento da concorrência, de feedback dos clientes e de discussões entre as várias equipas, surge um restaurante de tapas gourmet, que iria levantar algumas resistências internas. É verdade, todos estávamos habituados a pensar no Villa Itália como um local que só poderia ter restaurantes “clássicos de hotel”, e a realidade é que conseguimos criar um local descontraído e de sucesso. Também foram desenvolvidos novos produtos: o brunch que decorre todos os domingos no La Terraza; os barbecues de verão, aos domingos, no Bar Mare junto à piscina, com Dj; workshops de gastronomia, entre outras ações. Neste momento, vamos começar também a oferecer uns finais de tarde fantásticos, que juntam Arte e Gastronomia. Vamos ter connosco todos os sábados, a partir das 17h00, músicos, escritores, artistas plásticos.
Atualmente, a aposta nos “pacotes promocionais” que oferecem, é a resposta do grupo à crise que enfrentamos?
Os pacotes que regularmente apresentamos tentam, acima de tudo, simplificar as escolhas dos nossos clientes. Queremos que quem nos procure possa associar a experiência de alojamento aos restantes serviços, dos quais poderá desfrutar, desde a gastronomia ao spa, ou outros. Tendo em conta o período que estamos a viver em Portugal, temos também pacotes bastante atrativos no que concerne à experiência de meia-pensão, o que acaba sempre por ser uma forma mais económica de passar férias.
Está a gostar da experiência no Grupo Hotéis real? Que balanço faz?
Estou a gostar muito. Depois de ter passado, praticamente, 14 anos por vários hotéis da Starwood Hotels & Resorts, desde Tenerife a Marbelha ou ao Algarve, a experiência no Grupo Hotéis Real tem sido fantástica. Nas cadeias internacionais, muitas das coisas já vêm predefinidas, sendo apenas necessário o mais difícil, implementar. Nos Hotéis Real tenho a oportunidade de criar projetos de raiz que respondem às necessidades de cada unidade. É muito gratificante poder formar equipas de gestão de projetos, porque, no fim, todos se sentem parte da solução.
Qual foi o seu percurso profissional até aqui?
A minha carreira começou no Sheraton Algarve, precisamente quando tinha acabado o curso de Gestão Hoteleira. Subi os vários patamares da área comercial e tornei-me, com 25 anos de idade, diretor Comercial e de Marketing do hotel Mencey, que era um Luxury Collection, em Tenerife, com cerca de 300 quartos. Depois dessa experiência, fui diretor Comercial e de Marketing no hotel Westin La Quinta, em Marbelha, o primeiro Westin a surgir na Europa, um resort com um campo de golfe de 27 buracos. Optei então por voltar para Portugal, onde desempenhei as funções de diretor Comercial e de Marketing do Sheraton Algarve, sendo posteriormente promovido a diretor de hotel num projeto da Luxury Collection que iria abrir no Porto Santo. Infelizmente, o projeto acabou por não avançar, sendo que então passei para diretor regional de Comunicação da Starwood, ao nível da Península Ibérica, e um ano e meio depois, passei a diretor de Operações do Sheraton Lisboa. Fizemos a reabertura da unidade e, posteriormente, voltei para o Sheraton Algarve, onde tinha começado a minha carreira, como diretor de Operações. Um ano depois achei que estava na altura de experimentar o outro lado, de sair de uma cadeia internacional, e aceitei o convite, que na altura me foi feito, para ser administrador executivo de um projeto que estava a ser desenvolvido no Algarve, que era o Martinhal Resort. Ao fim de seis meses, deu para perceber que este não seria necessariamente o melhor caminho e nessa altura recebi a proposta dos Hotéis Real e aceitei o desafio. Comecei como diretor-geral do Villa Itália e do Real Oeiras, sendo também responsável por toda a parte de Vendas e Marketing do grupo. Ao final de, sensivelmente, um ano, foi-me proposta uma promoção para diretor-geral, sendo responsável pela área de Operações dos hotéis de Lisboa e também com a componente de Vendas e Marketing para todo o grupo.
Diga-me três pontos de que mais se orgulha na sua carreira.
Primeiro, ter sido o diretor comercial mais novo da Starwood, com 25 anos. O segundo marco é o facto de ter conseguido, aos 30 anos, chegar à função de diretor-geral num grupo como a Starwood. Por último, o facto de, no ano de 2009 – o primeiro no Grupo Hotéis Real –, termos conseguido fazer algumas alterações na estratégia e filosofia do Villa Itália, que nos permitiram um crescimento, em termos de resultado líquido, na ordem dos 900%.
Como justifica esse crescimento?
Por trás destes resultados excecionais está uma equipa fantástica que aceitou, sempre com um espírito absolutamente e empreendedor, todas as alterações propostas e que me apoiou desde o início. Estão também os nossos parceiros no mercado, que aceitaram a nossa estratégia e a nossa postura. Foi o resultado de um conjunto de fatores.
Na área da hotelaria, tem alguma referência que queira destacar?
Sim, tenho duas referências, que me servem todos os dias de exemplo: uma é o meu pai, Nogueira de Sousa, que foi muitos anos o diretor-geral do Hotel Montechoro, na altura um hotel sobejamente conhecido a nível nacional e internacional. Foi ele que me inspirou ao nível da postura, da maneira de estar, da forma de trabalhar, na ética e no respeito por qualquer colaborador, sem fazer distinção de posição. O segundo é o vice-presidente da Starwood para o Médio Oriente, Guido de Wilde, que foi diretor-geral da Starwood em Portugal e que é uma referência, para mim, pelo rigor e pela ambição.
Portugal atravessa uma das maiores crises económicas. No seu entender, o que há a ser feito para alterar esta realidade?
Eu acho que Portugal tem de apostar claramente na indústria do Turismo. Devemos potenciar as mais-valias que temos, não só o fator da segurança, da gastronomia, como também os hotéis fantásticos que temos para oferecer. Temos ainda ótimas condições geográficas e um país belo de norte a sul. Falta-nos uma linha estratégica, a nível nacional, que nos permita potenciar tudo isto e fomentar mais o espírito de união entre todos.
O que há a fazer para promover ainda melhor as unidades hoteleiras existentes no nosso país?
Quem tutela o Turismo tem de promover Portugal como um destino internacional. Mas para isso é necessário uma estratégia articulada entre todos os intervenientes do trade, no sentido de promover aquilo que o país tem para oferecer de melhor. Assim, todos beneficiariam: as receitas turísticas de uma forma geral e as unidades hoteleiras, que se debatem todos os anos com o problema das variações de ocupação por época, o que, em algumas regiões, atinge níveis preocupantes na época baixa. O Algarve é um bom exemplo disto, pois necessita claramente de um esforço de promoção conjunta no sentido de combater a sazonalidade.
O que podemos esperar, no futuro, dos hotéis do Grupo Real?
O que podem e devem esperar é um crescimento sustentado do grupo, ou seja, nós queremos ser cada vez melhores naquilo que fazemos, mais do que crescer, agora, a curto prazo, em número de unidades, queremos que aquelas que já existem sejam um exemplo de bem servir, de bem receber.