PEDRO PEREIRA GONÇALVES

JCF_3559“TEMOS DE REFORMAR MAIS E DE NOS TORNAR MAIS COMPETITIVOS”

Pedro Pereira Gonçalves, o secretário de Estado da Inovação, Investimento e Competitividade, é licenciado em Economia pela Universidade Católica e é mestre em Economia pelo Scottish Doctoral Programme & Masters Degree in Economic. Depois de ter assumido este compromisso com Portugal, Pedro Pereira Gonçalves elegeu a área da Inovação como uma das suas prioridades. Na opinião do secretário de Estado, é necessário “aumentar o valor dos produtos que vendemos, com mais inovação e mais valor acrescentado para o produto”. Atualmente, contamos com instrumentos fiscais que apresentam uma forte componente de apoio à inovação, mas é necessário continuar a “reforçar a capacidade e a competência das empresas nessa área”, sublinha. Destacando o trabalho que tem sido desenvolvido pelas empresas e pelo sistema científico nacional, de forma a melhorar a nossa posição ao nível da Inovação, o secretário de Estado salienta que é necessário continuar a “criar condições financeiras de apoio às empresas, para que estas possam inovar mais, de modo aplicado, de modo a criarem valor no seu produto”. Quanto ao tema das exportações, Pedro Pereira Gonçalves não esconde o seu entusiasmo: “A evolução das exportações nacionais tem sido surpreendente” e, na sua opinião, um dos elementos mais relevantes deste processo de ajustamento foi, e tem sido, “a capacidade de resiliência e de dinamismo das empresas perante uma diminuição drástica do mercado nacional e europeu”. Confiante de que temos, hoje, um Portugal “mais competitivo”, o secretário de Estado refere que a competitividade é uma corrida que “não termina” e por isso não podemos ter, no país, a perspetiva de que “já podemos parar”, porque há outros que estão a trabalhar e a tornar-se mais competitivos. “Isto é um jogo dinâmico com países, regiões, cidades, em que estar parado não é opção”, conclui.

 

A Inovação, uma das áreas que tutela, tem sido uma prioridade do Governo no contexto de mudança do paradigma da economia nacional. O que tem sido feito para que as empresas portuguesas consigam ser cada vez mais inovadoras?

A intervenção na inovação tem sido prioritária para o Governo português e para o Ministério da Economia em particular. O desenvolvimento da economia portuguesa tem passado por um reforçar, muito claro, da produção e do investimento nos bens transacionáveis, bem como na procura de fomentar as nossas exportações. Ora, o crescimento, e o alimentar desse crescimento das nossas exportações, passa por duas variáveis muito relevantes: aumentar as exportações em volume, mas também em preço. No aumento do preço, a inovação é determinante. Nós só conseguiremos aumentar o valor dos produtos que vendemos, com mais inovação e mais valor acrescentado para o produto. Por outro lado, temos também um conjunto de instrumentos para apoiar a inovação direcionada ao produto. Contamos com instrumentos fiscais e com outros, como o novo Quadro Comunitário de Apoio – Portugal 2020 –, que apresenta uma forte componente de apoio à inovação, à inovação produtiva, à inovação destinada ao produto, ao processo e ao equipamento, reforçando a capacidade e a competência das empresas nessas áreas. Esta é uma aposta em vários eixos, desde o apoio financeiro, passando também pelo apoio ao talento e pelo reforço de incentivos. Deste modo conseguimos que uma geração, altamente qualificada, esteja mais presente nas empresas, fomentando também a ligação entre o sistema científico nacional e as empresas. Estamos claramente empenhados numa aposta de reforço de competitividade por via do valor acrescentado no produto.

Segundo um relatório divulgado pela Comissão Europeia, em 2014, Portugal foi o país da União Europeia onde a inovação mais cresceu. Contudo, estamos ainda longe dos líderes nesta área. O que há a fazer para alterar esta situação?

Neste campo é importante referir o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pelas empresas e pelo sistema científico nacional de forma a melhorar a nossa posição ao nível da inovação. Nós somos hoje um país moderadamente inovador e temos de criar condições financeiras de apoio às empresas para que estas inovem mais, de modo aplicado, de modo a criarem valor no seu produto, mas também temos de apostar em mecanismos para fomentar e apoiar os projetos de inovação, nomeadamente aqueles que são feitos em copromoção com as universidades, com o sistema científico nacional, porque um dos grandes desafios que Portugal tem é converter esse conhecimento em produto, em produto e serviço vendável. Este caminho tem de ser assegurado por um maior trabalho de ligação entre o sistema científico nacional e as empresas. Para isso criámos, no final do ano passado, uma entidade muito concreta, a ANI – Agência Nacional de Inovação. Esta é uma agência absolutamente focada, dentro do novo quadro Portugal 2020, a trabalhar e a potenciar esta relação entre o sistema científico nacional, as empresas e a inovação, resultando numa melhoria e no aumento de valor acrescentado no produto.

As exportações nacionais continuam a crescer, e o objetivo do Governo é que tenham cada vez mais peso no PIB nacional. Como avalia esta evolução?JCF_3659

A evolução das exportações nacionais tem sido surpreendente. Na minha opinião, um dos elementos mais relevantes deste processo de ajustamento foi, e tem sido, a capacidade de resiliência e de dinamismo das empresas perante uma diminuição drástica do mercado nacional e europeu, porque a crise sentiu-se muito ao nível da União Europeia e foi necessário procurar novos mercados. Perante esta situação, nós passámos – como é conhecido – de cerca de 28% do PIB em exportações para mais de 39%. Teremos em 2014, novamente, um ano recorde de exportações, quer de bens quer de serviços, com uma dinâmica de diversificação de setores e de mercados. Esse é um trabalho notável feito pelas nossas empresas.

Pelo contacto constante que tem com as empresas, que setores se têm destacado pela aposta de crescimento em inovação, nomeadamente inovação tecnológica?

Nós hoje temos, em Portugal, desde setores de ponta, como o farmacêutico ou a biotecnologia, a setores emergentes, como o aeronáutico. Contudo, muitas vezes confundimos a palavra inovação com novidade. Ninguém tem dúvida de que a área da biotecnologia ou a farmacêutica, entre outras, são inovadoras, porém, o que nós também procuramos potenciar é a inovação nos nossos setores fortes – calçado, têxtil, metalomecânica. Estes são setores onde Portugal tem um peso muito grande e uma capacidade e presença histórica relevantes, bem como uma competência inovadora cada vez mais relevante. Dou-lhe um exemplo muito concreto, o aumento de exportações que a indústria do calçado teve nestes últimos anos não foi em número de pares de sapatos, mas sim no preço a que passamos a vender esses mesmos sapatos. Nós, em termos de número de pares de sapatos vendidos, estamos praticamente no mesmo nível em que já estivemos noutras fases de exportação, a diferença está no preço a que estamos a exportar. Hoje, Portugal exporta ao segundo preço mais alto do mundo, porque este setor inovou. Este aumento do preço por via da inovação, por novos produtos, por novos processos, novos equipamentos, é o grande desafio que temos em muito setores. A aposta de Portugal na inovação tem de ser diversificada e tem de passar, necessariamente, por vários setores, nomeadamente aqueles onde somos fortes. A inovação de que falo é visível em tantas outras áreas, nomeadamente na agro-indústria: temos produtores a inovar no vinho, nas frutas, em produtos transformados. Estão a inovar com uma enorme qualidade e com um valor de produto muito relevante.

JCF_3676Um dos grandes desafios de Portugal, para que a retoma económica seja uma realidade, passa pela captação de investimento, nacional e estrangeiro. Que tipo de investimento deve o país privilegiar?

Eu acho que devemos privilegiar e receber bem todo o investimento em Portugal. Uma das características que Portugal, os portugueses, tem é acolher bem. Temos uma boa tradição de acolher e no investimento temos de ter – e temos – a mesma prática, e esse é um dos elementos distintivos de Portugal. O facto de nós acolhermos bem os investidores, em função do projeto, em função do investimento, e não em função de outros critérios, como se viu, por exemplo, no nosso processo de privatizações onde os investidores chineses e asiáticos tiveram uma presença relevante e foram tratados como os investidores brasileiros ou franceses, é um elemento diferenciador de Portugal na atração de investimento. Devemos estar abertos ao mundo na captação de investimento, privilegiando não tanto a origem, mas a qualidade do investimento. Investimento que tenha impacto reprodutivo; que gere valor acrescentado na economia nacional; que potencie as exportações; que tenha um valor acrescentado bruto na economia relevante; que tenha externalidade sobre a cadeia de valor, de fornecedores; que faça surgir pequenas e médias empresas associadas; que aposte claramente no talento, na valorização de recursos humanos e no emprego em Portugal, deve ser sempre valorizado. Estas devem ser as características que devemos exigir aos investidores.

Quais são, neste momento, para si, os principais sinais de retoma económica, no nosso país?

Há sinais estruturais e outros mais conjeturais. O primeiro sinal de retoma que tivemos foi, tal como já lhe disse, o crescimento, fortíssimo, das exportações e a correção do défice, crónico, das contas externas, que Portugal tinha. Desde a democracia nunca tínhamos tido um superavit de transações correntes e conseguimos obter um equilíbrio em 2012, mantivemo-lo em 2013 e também em 2014. A redução do nosso défice orçamental é, sem dúvida, um dos aspetos fundamentais da nossa recuperação. Depois há ainda que referir a redução do desemprego, que foi a mais forte em todos os países da União Europeia, quando passámos de 16,2% para 13,4%, em 2014. Estes são sinais claríssimos da retoma e da melhoria da condição económica em que o país se encontra. É uma trajetória que tem de ser mantida.

Ao longo dos últimos 18 meses fez muitos  quilómetros para ajudar a pôr Portugal na mira dos investidores… O que foi feito ao certo? Que resultados práticos tiveram essas deslocações e roadshows? Houve mais investimento em Portugal no ano passado?

Não tenho a ambição de associar um maior investimento ao meu trabalho, apenas tentei trabalhar o melhor que sabia.

Na sua opinião, Portugal está bem posicionado no radar dos investidores?

Sim, e, claramente, como vemos nos indicadores de competitividade, temos melhorado significativamente a nossa posição competitiva. É uma recuperação notável. Somos vistos lá fora como um país cumpridor. Como pessoas, quando motivadas e bem geridas, todos acreditam que temos uma capacidade de desempenho impressionante, ao nível dos melhores do mundo.

O que é que já foi feito para atrair o investimento?JCF_3591

Licenciamento industrial; o novo código fiscal para o investimento, muito mais competitivo; incrementámos o nível de apoio às empresas que investem em Portugal, privilegiando quem investe na inovação e no desenvolvimento, quem emprega e quem investe no interior, dando bonificações claras a esses investidores; estamos a trabalhar na fase final de um eixo fundamental do apoio ao investimento, que é o Portugal 2020. Depois, reduzimos as taxas de certificação em mais de um milhão de euros, por ano, para as empresas. Este tipo de medidas, que nos tornam mais simples, mais competitivos do ponto de vista fiscal e da qualificação dos nossos recursos humanos, torna-nos muito mais competitivos na capacidade de atrair investimento estrangeiro. De referir também a continuidade dada à reforma do IRC, e a descida de dois pontos, num compromisso estabelecido entre este Governo e o principal partido da oposição – PS –, no sentido de reduzir, progressivamente, a taxa de IRC e tornar Portugal num dos países mais competitivos fiscalmente para empresas.

Quem são, neste momento, os nossos principais concorrentes e quais os principais argumentos de Portugal para captar investimento em condições competitivas?

Os nossos concorrentes são a Polónia, a República Checa, a Irlanda, a Áustria, a Holanda ou Marrocos.

Um dos problemas das empresas nacionais continua a ser a baixa capitalização. Que mecanismos foram criados para ajudar a debelar esta situação?

Um dos problemas que Portugal enfrenta, até na sua capacidade de investir mais, de crescer mais, de exportar mais, passa exatamente pelo nível de endividamento das nossas empresas. Temos uma dívida pública elevada, mas temos uma dívida privada – seja empresas ou famílias – bastante elevada. Uma das preocupações muito grandes que temos tido no Ministério da Economia foi a de criar mecanismos que ajudem a desalavancar as empresas e as ajudem a capitalizar. O Banco de Portugal criou um sistema de rating que avalia todas as PME e que no fundo permitirá às empresas melhor conhecer a sua situação financeira. Nós, Ministério da Economia, ajudamos na avaliação financeira de cada empresa com indicadores verdes, vermelhos e amarelos. Também intervimos ao nível de todos os investimentos de recuperação das empresas. O nosso objetivo é atingir as empresas que estejam financeiramente em dificuldades mas que sejam operacionalmente viáveis. Também interviemos ao nível dos instrumentos. Hoje, as nossas PME, para realizarem um projeto, têm à disposição duas fontes de financiamento: os sócios ou os bancos. Quando olhamos para outros países, vemos que a diversidade de financiamento é muito maior, portanto, interviemos também no sentido de modernizar instrumentos que consideramos ser muito importantes para financiar as PME. Refiro-me, por exemplo, às obrigações convertíveis, às preferenciais, até à própria emissão de obrigações. Fizemos uma revisão profunda da lei, no sentido de tornar estes instrumentos mais adaptados às PME.

A Instituição Financeira de Desenvolvimento já está a funcionar. Quais são os principais objetivos desta instituição?

A IFD é uma instituição financeira de desenvolvimento recém-criada. O capital da IFD – 100 milhões de euros – resultou de um processo de reorganização de outras sociedades financeiras do Estado. Agora temos como ambição integrar, sob a gestão da IFD, estas várias sociedades. O objetivo que temos é que haja uma única entidade em Portugal que gira, quer do ponto de vista de balanço, quer do ponto de vista de gestão de risco ou operacional, os instrumentos que temos já hoje e os que vamos criar, nomeadamente através do Portugal 2020.

O que ganharam as empresas com a revisão do Sistema de Indústria Responsável?

As empresas vão ganhar bastante. A revisão já foi aprovada no ano passado em Conselho de Ministros e está em fase de promulgação. Estamos também a trabalhar nas linhas de apoio às empresas em fase de recuperação. Lançámos uma linha de 50 milhões de euros para apoiar as empresas na fase de recuperação e, por exemplo, nas linhas PME Crescimento também estamos a introduzir, já com ligação à IFD – com ajuda técnica inicial da IFD –, linhas de 100 milhões de euros para a capitalização das PME.

Na sua opinião, as empresas ainda pagam impostos muito elevados?

Sim, daí ser um profundo defensor da continuidade da reforma do IRC. Os países grandes, com mercados internos grandes, podem ter uma taxa de imposto mais elevada, contudo, os países pequenos que dependem da atração de investimento, da capacidade exportadora, têm de ser muito mais competitivos. Portugal tem de ter a ambição de estar na linha da frente dos países mais competitivos.

Quantos processos de licenciamento industrial existem em Portugal por ano?

Mais de um milhar por ano.

É possível fazer um balanço dos fundos Revitalizar?

Sim, ainda não final, porque os fundos vão continuar a executar ainda em 2015, mas estamos com cerca de 70% de execução destes fundos. É uma execução muito uniforme entre as três sociedades gestoras, no norte, no centro e no sul. Acreditamos que iremos fechar em torno de 80 ou 85% do nível de execução do Revitalizar. Estaremos em torno dos 180 milhões de euros.

JCF_3616O Governo anunciou ainda muitas medidas, ao longo dos últimos meses, para ajudar a promover a competitividade das empresas. Que medidas são essas?

Temos várias medidas, desde medidas fiscais até ao novo Quadro de Fundos Estruturais do Portugal 2020, onde o apoio à internacionalização das empresas é algo fulcral. Este quadro vai trazer desde o apoio à inovação produtiva, ao I&D [Investigação e Desenvolvimento], à qualificação de recursos, ao investimento, aspetos muito importantes do ponto de vista da competitividade, para além de medidas como a criação de condições para uma maior competitividade, como o licenciamento industrial, a redução de taxas, as intervenções que se têm feito ao nível da simplificação de processos para as empresas.

Depois desta crise que atravessamos, temos, na sua opinião, um Portugal mais competitivo? Em que aspetos?

Já temos hoje um Portugal mais competitivo. A competitividade é uma corrida que não termina e nós não podemos ter, no país, a perspetiva de que, agora que já fizemos um conjunto de reformas, está tudo feito e agora já podemos parar, porque há outros que estão a trabalhar, a andar e a tornar-se mais competitivos. Isto é um jogo dinâmico com países, regiões, cidades, em que estar parado não é opção. Temos de ter uma perspetiva permanente de melhoria das nossas condições de competitividade relativamente aos outros. Temos de nos afirmar, quer ao nível de investimento, quer ao nível de capacidade de exportação, quer ao nível de criação de riqueza. Portugal tem que se assumir como país que quer estar na linha da frente. É uma questão de o país querer acompanhar os melhores ou não. Europa e Portugal têm de materializar que os mercados de crescimento fortes não são europeus, neste momento são a América Latina, a Ásia, o Médio Oriente, não é a Europa. Temos de reformar mais e de nos tornar mais competitivos.